12 agosto, 2011

A Praia da Minha Vida

Há temas que nos são propostos que nos parecem inócuos, vazios de outro sentido que não seja o porem-nos a falar de coisas boas que tenhamos vivido e que, esquecendo outras, não forçosamente más, acabam por não mais oferecer do que a oportunidade de escrever sobre meras reminiscências pejadas de saudosismo. Foi o caso de me ser sugerido escrever sobre "A praia da minha vida". Confesso que inicialmente pensei em não pegar na sugestão do Carlos (Crónicas do Rochedo). Mas ontem ao serão, numa tertúlia de verão, um amigo me convenceu que os lugares guardam a imagem do que somos e fazemos, guardam os vestígios da nossa vida. Enquanto ele ia falando sobre coisas fora deste tema eu ia pensando nele. Com espírito de contradição: Não escreva eu sobre os lugares por onde passei e eles não falarão de mim. As pedras só falam se falarmos delas. Hoje resolvi falar sobre isso, sobre uma praia. A praia da Areia Branca. Até a conhecer, a minha vida tinha sido vivida sem grandes estadias de mar e sol. As idas eram furtivas. Em pequeno, frequentei Caxias por mão de minha mãe. Eram idas de obrigação médica, não por doença mas para a prevenir. Contenho a custo a vontade de falar desse tempo, desse período que, de tão pequeno, parecer ser um breve momento, que ainda lembro. Areia Branca? Ah pois, Areia Branca. A praia onde a minha Teresa perdeu a aliança de noivado que Minha Alma lhe tinha dado. A praia onde prolongámos a Lua de Mel. A praia onde minha primeira filha disse a primeira palavra, a segunda teve a primeira doença e a terceira fez como a primeira. A praia onde os meus quatro netos, com diferenças de quinze anos, foram por lá passando. Ano a ano, fazendo crescer os talheres na mesa, diferentemente posta num qualquer quintal, debaixo de tantas árvores conhecidas, mas sempre diferentes...

Mas não foi só a família que foi marcando nas ondas, nas rochas, coisas que elas não contam. Por lá fica a memória dos livros que li - da obra de Jorge Amado, os romances mais emocionantes. Por lá ficam (parte) dos meus actos clandestinos, de conspiração e subversão. Por lá ficam os registos da minha mudança de vida, num recrutamento entre o vento e o banho de mar, conhecimentos de verão para entrada numa outra empresa onde viria a trabalhar cerca de dezoito anos.


Este ano, por lá andei (como já contei)... lendo poemas escritos para mim... Quando nos despedimos da dona da casa alugada, demos conta de vários incidentes: Um prato e dois copos partidos e uma lâmpada fundida. Tudo substituído com excepção da lâmpada, por não haver igual. Diz a senhora: "não faz mal, vamos substituir todas pelas económicas. A electricidade vai aumentar e temos que poupar..." Mal sabia ela qual viria a ser a nova tabela...

19 comentários:

  1. Lindo, este post, Rogério!
    Como se conta uma história em torno de uma praia.
    E uma história é tão mais bela quanto nela há emoções, e esta está cheia delas.
    Beijinhos.

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  2. Amigo Rogério, gostei de saber destas suas memórias que pelos vistos, estão intimamente ligadas a esta praia. :)

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  3. Está a ver que afinal não custa nada? Gostei!.

    :)))

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  4. Caro Rogério
    Acredite que parei provavelmente umas dezenas de vezes na Praia de Areia Branca. Mas desde que há uns anos me foi diagnosticada uma "Ciática" e depois disso só voltei ao mar uma vez e saí de lá com ajuda braçal, passei a olhar o mar de cá de cima nestas e noutras Praias,embora não consiga passar mais do que uma semana sem respirar aquele ar com gosto a salgado e cheiro a iodo
    Gostei.

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  5. Boas recordações e emoções a volta de uma praia e no fim, um espirito critico...

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  6. Uma autêntica roubalheira este II (Imposto Indirecto).

    Areia Branca é a minha Praia preferida desde que me reformei. Está cada vez mais linda. Pena que seja tão ventosa a maior parte do ano.

    Abraços

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  7. Rogério, lindo texto!
    Gosto de praia, mas não vou a praia, rs
    Gosto de ir lá no fim da tarde e olhar o mar... para banhos só em outras paragens, aqui o litoral é grande e passamos a vida a querer conhece-lo por inteiro.
    bjs e bom fim de semana
    Jussara

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  8. abraço, meu caro amigo.
    todas as tuas razões são boas para gostares da Areia Branca.

    alias um lugar de que gosto muito.

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  9. Abençoado seja o seu amigo, Rogério. Não fora ele e não teríamos o privilégio de ler este belo post.
    Obrigado por ter aceite o desafio e diga ao seu amigo que nós agradecemos.
    respeitando a ordem de entrada dos textos, farei link para o seu no dia 17.
    Uma vez masi obrigado e bom fds.
    O meus será no Porto, onde parece estramais fresquinho

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  10. Depois de ler o seu post fiquei aqui a dar voltas à carola... Não tenho uma praia da minha vida. è verdade que a Costa da Caparica sempre foi a praia que mais frequentei, fundamentalmente por eu ser um almadense, mas é tão vasta a Costa.... Quanto ao seu post, sempre cativante! A praia da areia branca conheci-a num passeio quando frequentava a colónia da CUF em Almoçageme, portanto por ali perto e mais tarde onde o meu filhote levou um valente susto porque uma onda o enrolou, mas nada de mais a minha amiga Anabela deitou-lhe a mão e agarrou-o. Para si é muito mais querida. Aqui ou nas almas é sempre um prazer lê-lo.

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  11. Lugares que guardam um pouco das pessoas e pessoas que guardam um pouco dos lugares.
    Muitos bjs querido amigo e tudo segue em ordem.

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  12. Outro texto que nos desperta a atenção! Muito bem, Rogério. Tantas experiências vividas numa praia só ! : )

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  13. Sim, os lugares por onde passamos fazem parte de nós e nós parte deles. Se assim não fosse porque nos haveria de doer tanto ver esta terra "à beira mar plantada" a ser devastada e saqueada ao ponto de não poder acolher os próprios filhos no seu seio.Falo dos jovens, daqueles cheios de diplomas mas sem experiência para serem aceites no mundo do trabalho (culpa deles que não nascem com ela) e dos outros prontos para trabalhar, mas sem habilitações que o permitam. "Preso por ter cão e preso por não o ter".
    O seu texto é envolvente. O que um lugar pode dizer de nós!!!

    Um beijo

    L.B.

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  14. Hoje foste alma gêmea. Sem, é claro, deixar de "avinagrar" ao final. Tempero certeiro. trouxe-me tantas outras recordações.

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  15. "Areia Branca" na ampulheta com que medes o teu tempo e partilhas...
    Abraço

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  16. Há sempre uma praia com areias brancas docemente abraçadas pela maré da memória.

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  17. Esta praia é um encanto a tua narrativa cheia de passado e de presente também!

    Abraço

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  18. Uma crônica muito bem escrita, memórias contadas que gostei de ler, parte de nossas vidas que sempre estão presentes. Vim guiada pela postagem atual.
    Uma boa semana, Rogério,
    até mais.

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