05 março, 2012

Medo, medos... (3)

Ia com as moedas na mão, pousei um euro no balcão e, enquanto pegava no jornal, ia comentando: "este gajo, um zero?" A empregada da tabacaria sorriu como sempre faz às piadas que lhe deixo tão trocadas quanto as moedas que diariamente lhe entrego. Ela ignora a minha aparente ignorância e esclarece. "hoje o Público é à borla..." Fiquei ali mais uns segundos e leio: "...o filosofo  José Gil, quer dar visibilidade ao que não se sabe sobre Portugal, ao "vazio". Um dos grandes 25 pensadores da actualidade para a revista francesa Nouvel Observateur mostra "o estado da nação e o seu avesso..." - "Um dos 25 pensadores?"... penso e estremeço com a responsabilidade deste o homem e com o facto de o NO me ignorar e haver tão pouca gente a pensar.. Leio atentamente. E acho que filosofando coisas interessantes e ausentes das letras do jornais, acaba por ficar-se e perder-se em reflexão que, embora importante, é superficial e foge ao essencial. Apetecia-me pegar num monte de coisas que são ditas por esta sumidade mas, ainda tendo presentes os comentários que me fizeram ontem, opto pelo tema medo (até porque já tinha reflectido nisso uma e outra vez). Transcrevo:
«Quantos portugueses não têm medo da autoridade? Impossível (sabe-lo). Quantos não têm coragem para emigrar? É a mesma coisa. A razão da impossibilidade de ter respostas credíveis, o vazio que aqui se mostra,vem do próprio medo. Isto é a prova do medo. Zero. Zero de coragem. Ou 0,1. Mas será que não nos aproximamos do zero? A verdade é que nós temos muito pouca coragem. Muito pouca coragem para assumir as nossa palavras, para assumirmos as nossas responsabilidades. Mas o Estados e os responsáveis políticos, os media também não contribuem para a cultura do medo? Para quê ousar afirmar os seus direitos, se todo o sistema entrava a acção?”»
É verdade. Mas esta é a verdade acessível a qualquer não-filosofo-importante. Porque não me falou José Gil de outros medos? Porque não me falou dum medo que cada vez mais se instalou na sociedade portuguesa. Veja o video, para que não esqueça. Mas anote o final. É que tem uma comovente mensagem de esperança (coisa de que o filósofo também não falou e anda tão escondida):


A imagem acima foi retirada da 1ª página do "Público",  

12 comentários:

  1. Já conhecia o vídeo, mas é sempre bom rever.

    Sabe que o ministro Álvaro amaeça demitir-se?

    Boa semana

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  2. Caro Rogério
    Ainda emocionado pela "estória" do meu amigo Manel,leio o seu post e como não apanhei o Publico e só mais logo vou tentar ver online. Vi o vídeo muito comovente que nos deixou e claro mais uma lágrima rolou.
    Há aquela parte do "meninos à volta da fogueira" que fala em "saber o que custou a liberdade".
    Abraço
    Rodrigo Manuel

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  3. Como não havemos de ter medo? Depois de trezentos anos de Inquisição e 48 de ditadura e oitocentos de Santa Madre Igreja?!... Fomos sempre reprimidos. Ainda não nos libertámos. Será que alguma vez o conseguiremos?

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  4. Que os medos nos ensinem a não ter medo de ter esperança.

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  5. sempre achei que o mal e pensar demais e agir pouco

    Bjinbhos
    Paula

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  6. Caro Rogério
    Comovente!
    As minhas palavras não saêm, apenas as lágrimas caêm.

    Beijinho e uma flor

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  7. O medo não é só um. Há muitos!
    O mesmo se passa com a coragem. Tenho dificuldades em ver como cobarde, aquele que, tendo uma família a seu cargo, revela medo de perder o emprego (por exemplo).

    Sobre o vídeo: é maravilhoso!

    L.B.

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  8. que os medos não abafem o futuro...

    abraço

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  9. Como o Público era à borla, não o consegui encontrar, claro. Como dizia uma amiga minha angolana, " desde que seja de borla, o portuga até leva injecção na testa".

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  10. Pois… José Gil. Não é consensual, mas para mim escreveu um grande livro, o tal do medo. Não tenho hoje medo de existir, isto é, não vivo com nenhum medo especial latente, mas confesso que muitas das sopas de que não gostava nos meus tempos de menino, no Alentejo – em pleno Salazarismo - foram comidas com a ameaça de que vinha aí Guarda (GNR). Parece-me ser verdade que os portugueses têm uma questão mal resolvida com a autoridade – visível ainda hoje na forma algo arrogante como muitos agentes da autoridade se permitem falar-nos ou olhar, e esse comportamento terá com certeza uma razão de ser, diria que é um fóssil comportamental, denunciador, mas que vai resistindo neles.

    Uma vez que aqui se escreveu sobre José Gil, aqui ficam outras opiniões:
    http://dotecome.blogspot.com/2005/03/lendo-portugal-hoje-o-medo-de-existir.html

    Lendo o que diz Graça Sampaio mais acima, acrescentaria uma questão que raramente vejo analisada: nós e o secular isolamento geográfico e civilizacional, há bem pouco tempo interrompido, por termos Espanha como tampão à Europa, conjugado com permanente necessidade histórica que tivemos de nos vigiar e demarcar.

    Saudações.

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  11. Caro Graza,

    Fala do medo de existir. É um medo, de entre tantos. Esse ninguém reconhece ter, até porque tem quase todos os outros... nomeadamente o de... perder o controlo da sua própria vida (a real, a afectiva...)

    Quanto ao link para o meu amigo (amigo de juventude, diga-se) trago de lá esta citação:

    "Até ao fim fiquei na expectativa de José Gil ir dar uma pista de saída do “nevoeiro branco”.
    Não a encontrei; ou então talvez não tenha percebido o que quer ele exactamente dizer com “a nossa capacidade de fluir entre dois estratos, entre duas forças que nos prendem” e com “o nosso sentido lúcido do real, do pensamento claro” o que não abona muito um dos pensadores do mundo...

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  12. Subscrevo o seu texto.
    Vou ver o vídeo e talvez inseri-lo
    num dos meus blogues.
    Bj.
    Irene

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