20 abril, 2012

António Lobo Antunes, os nossos intelectuais, a sua missão perante a situação e as expectativas da dona Esmeralda, coitada

É mais que natural que eu, tal como a dona Esmeralda, me inquiete com a actual situação do país. Mais que inquietação, começam a pairar por aqui, no meu prédio, o que paira por (quase) todo o lado: as consequências e as subsistências. Estranho eu, a dona Esmeralda e o Baptista Bastos, pelo silêncio dos intelectuais. Não que se calem, porque de sua escrita lhes vai o ganho. Eles escrevem e... recebem pelo que escrevem. Sobre as minha inquietações e as da dona Esmeralda, podia adiantar mais qualquer coisa, mas não acrescentaria muito ao aqui escrito. Vejamos então o que diz Baptista Bastos, para depois falar do resto. Escreve ele:
Bom, o meu citado escreve nesta crónica sobre a atitude da igreja e os seus tímidos protestos, o que não me vem ao caso, pois eu hoje quero limitar-me à tal ausência de sobressalto cívico por parte dos intelectuais e à deserção sobre um papel que lhe poderia caber e não cabe. Razões? Vão se lá saber, pois não se sabem. Não sabem, mas se adivinham. Vamos lá supor que, por exemplo, António Lobo Antunes se atrevia em discorrer sobre desagregação da democracia, sobre inevitabilidades, sobre os valores que estão em causa, sobre posições politicas conhecidas, sobre ideologia, sobre soluções e outras opiniões alternativas... Era uma chatice. Não que não fale da situação actual. Mal seria. Seria tomado por defunto e o homem escreve, e muito. Claro que escreve e esgrime a palavra como ninguém. Claro que, nesses escritos, dá baile aos governantes e os trata por tratantes. Mas se tivermos em conta o que se espera dos intelectuais (elites, escritores, pensadores, artistas), diria que o que este brilhante (que o é) homem de letras faz é aguentar firme seu público, que é o seu mercado - Ah, sempre os mercados, esses danados, aqui na versão comezinha do comprem-me qualquer coisinha. Não, não me pensem com ódio de estimação ao senhor. Não pensem isso, por favor.

A questão é quase geral, com poucas e honrosas excepções. Os novos escritores viram-se para a escrita intimista e  muitos (quase todos) levam a sério a afirmação de Zita Seabra, que vaticina que com a morte de Saramago morreu o último intelectual marxista (ou com ideologia, ou comprometido, tem esse sentido). Ela fala pelas editoras o que lhe reforça a voz e produz aviso. É como quem diz: não se metam nisso. Nem nisso nem próximo disso, tenham juízo. E os nossos intelectuais não se metem. Resta a dona Esmeralda (sem escrita nem tempo de antena) e mais uns quantos. Felizmente, tantos. Mas ainda poucos.

Hoje, o pensamento único não precisa de qualquer tipo de censura. Os nossos intelectuais conhecem bem os limites por que se devem pautar as obras que ousam criar.

16 comentários:

  1. Vou tornar a ler esta posta com mais atenção, Rogério, mas para já, digo apenas que o Saramago era um intelectual marxista assim como o Baptista Bastos ainda o é hoje; enquanto que o António Lobo Antunes é um intelectual sem ideologias e o meu preferido para o Nobel.

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  2. Li mas tenho de cá voltar.
    Ele há coisas... e querem que eu não entenda...
    Muito me confrange como católico o silêncio e o aceitar de tudo pela Igreja. Parece que lhe faltam homens com actos e palavras...
    Cordeiros submissos e fazendo o jogo do poder.

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  3. Caro Rogério
    Nem sempre é fácil comentar os seus sempre interessantes e bem documentados posts.
    Atrevo-me mo entanto a dizer que por razões diversas os intelectuais (e não só)salvo algumas honrosas excepções, foram-se afastando da militância partidária. Claro que vão dizendo e escrevendo umas coisas, mas por muito bem que alguns ainda o façam isoladamente, é pouco. Como dar a volta a isso?
    Abraço
    Rodrigo

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  4. Mas, ainda há pouco se falou ou falei, no blogue do Carlos Barbosa de Oliveira... o povo português nunca fez nenhuma Revolução... foram os militares e agora estamos bem pior... vão de tanque até Bruxelas?
    O povo anda sobressaltado, aflito,... e, realmente, não tem quem o guie, nem ajude a desatar esta teia em que foram apanhados... e como diz muito bem, nem há qualquer sobressalto cívico dos intelectuais... por isso esta pasmaceira está para durar, quase um estado comatoso antes do último suspiro.

    Bjos

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  5. A Zita funâmbula disse isso porque sabe que ficaram os "marchistas" e como St. António está porta...

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  6. Saudades, muitas saudades estava de ler o que escreves. Sempre que venho enriqueço-me com teu português tão bem escrito, assim como com os temas que abordas como poucos.
    O que esperar para um povo cuja elite intelectual se apequena diante dos interesses pessoais? Temo por esse Portugal que amo, mas temo mais por este meu país, o Brasil, de cuja elite mal se ouve uma expressão, que dirá um "sobressalto cívico"... São tempos de "pobreza" e uma pobreza que deixa sequelas perigosas.
    Tua presença no meu Chocolate é daquelas que me encanta e me honra. Sempre.
    Beijokas.

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  7. Encontrar um intelectual, neste País, com força para falar é como encontrar agulha em palheiro.

    Tem razão, há um acobardamento dos que podem, poderiam e deviam ser facho ou rastilho. Cada um trata da sua horta. O clientelismo instalou-se-lhes até no cérebro.Salvam-se alguns, mas tão poucos...

    Faz-nos falta Saramago.Era a voz da Razão a atiçar, a sobressaltar.

    Beijo

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  8. Meu amigo uma só palavra.

    Falta-nos tudo!

    Beijinhos e bom fim de semana

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  9. Nem todos os intelectuais, no passado, defendiam ideologias de esquerda, é preciso notar. Sempre houve quem as contrariasse com maior ou nemor vigor.
    O que há hoje é uma grande descrença nos políticos e nos ideiais que defendem (prontamente abandonados após cada eleição).
    Parece-me poder dizer que vivemos um tempo vazio de confiança, de crenças e paixões ao qual a literatura não fica imune, pois ela é sempre, de uma ou de outra forma, o reflexo do seu tempo.

    L.B.

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  10. Desculpe Rogério, mas não concordo totalmente consigo quando escolhe Lobo Antunes como exemplo para este seu tema, :))) Faz-me mesmo sorrir esta sua ideia…
    Não acho que seja suspeita porque adoro o Baptista Bastos, acho que já foi aqui que disse ou talvez noutro sítio que o primeiro livro que li dele foi "A Colina de Cristal", onde efectivamente me marcou o realismo com que descreve a vida dura dos homens que faziam estradas. Li a crónica que aqui nos traz e acho até que ele terá alguma razão e também li a de Lobo Antunes, que como diz bate bem nos nossos governantes. Não concebo a ideia de que um criador por excelência alguma vez o faça premeditadamente a pensar no seu público ou no seu mercado. Não distingo nem comparo as diferentes formas de intervir dos intelectuais, nem tão pouco tenho algum interesse em saber se são da linha marxista ou de outra espécie de corrente filosófica. Será que Marx alguma vez foi devidamente posto em prática? Talvez ainda exista o sonho dessa pureza...
    Ao artista tem que ser dada a liberdade de ser ele próprio, introspectivo e porventura interventivo na escrita, na pintura, escultura ou noutro sítio qualquer. Não nos podemos arrogar como detentores de um estatuto cívico, por termos mais capacidade de saltar para a praça pública, não somos por isso mais senhores da verdade, pelo contrário são eles, os que lemos, que muitas vezes nos abrem os olhos para a não alienação, que também se encontra em alguns cantos da praça onde levantamos as nossas bandeiras.
    É que talvez o caminho seja bem diferentes de todos os que já se experimentaram e este desnorte pode ter a ver com o facto de ainda não o termos descoberto.

    Beijinhos

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  11. Anestesiados vivem muitos de nós...
    Concordo com o Rogério. Conheço o suficiente a obra de Lobo Antunes para dizer que aprecio o modo como burila a linguagem, mas não o aprecio como indivíduo.

    bjs

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  12. LObo Antunes é execrável! Nem sequer como escritor o aprecio!
    Preferia não ter o Nobel a t~e-lo através dele. No entanto, gostei da sua recente crónica na "Visão".

    Quanto ao resto, anda tudo de rabinho entre as pernas. Aliás, teremos esmo intelectuais?

    Bom fim de semana

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  13. Apesar de quase toda a sua literatura ser quase atordoante e ele usar o seu poder de oratória para esgrimir a palavra como poucos, considero Lobo Antunes muito individualista.
    Aquela sua célebre frase ficou-me na memória:
    "Os leitores são umas putas."
    Mas gosto de o ler.

    Sobre Batista Bastos não me pronuncio. Não gosto dele!
    Quanto a Saramago, quem melhor do que o Rogério pode saber o quanto os seus ideais, cada vez estão menos vivos nas mentes colectivas
    actuais?

    Beijinhos.

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  14. Também li a crónica referida, gosto da escrita de Batista Bastos, penso que consegue transmitir com muita fluidez o seu pensamento, abordar questões candentes da sociedade portuguesa.

    O tema da presumível prostituição dos jornalistas toca num ponto exececionalmente importante. A comunicação social, os media, deviam, por força da própria lei fundamental do país, ser independentes do poder económico, mas também do poder político e do religioso. Assim, como as coisas estão, não temos forma de acreditar piamente nas intenções dos artigos e das crónicas que lemos ou ouvimos. O que é confrangedor, muito.

    A questão da igreja católica e da oportunidade da intervenção cívica/política dos seus dirigentes é outra questão que nos leva à lamentável conclusão de que jogar nos dois tabuleiros lhe é muito conveniente.
    Mas cada vez menos convincente!

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  15. Desculpe Rogério, mas não concordo totalmente consigo quando escolhe Lobo Antunes como exemplo para este seu tema, :))) Faz-me mesmo sorrir esta sua ideia…
    Não acho que seja suspeita porque adoro o Baptista Bastos, acho que já foi aqui que disse ou talvez noutro sítio que o primeiro livro que li dele foi "A Colina de Cristal", onde efectivamente me marcou o realismo com que descreve a vida dura dos homens que faziam estradas. Li a crónica que aqui nos traz e acho até que ele terá alguma razão e também li a de Lobo Antunes, que como diz bate bem nos nossos governantes. Não concebo a ideia de que um criador por excelência alguma vez o faça premeditadamente a pensar no seu público ou no seu mercado. Não distingo nem comparo as diferentes formas de intervir dos intelectuais, nem tão pouco tenho algum interesse em saber se são da linha marxista ou de outra espécie de corrente filosófica. Será que Marx alguma vez foi devidamente posto em prática? Talvez ainda exista o sonho dessa pureza...
    Ao artista tem que ser dada a liberdade de ser ele próprio, introspectivo e porventura interventivo na escrita, na pintura, escultura ou noutro sítio qualquer. Não nos podemos arrogar como detentores de um estatuto cívico, por termos mais capacidade de saltar para a praça pública, não somos por isso mais senhores da verdade, pelo contrário são eles, os que lemos, que muitas vezes nos abrem os olhos para a não alienação, que também se encontra em alguns cantos da praça onde levantamos as nossas bandeiras.
    É que talvez o caminho seja bem diferentes de todos os que já se experimentaram e este desnorte pode ter a ver com o facto de ainda não o termos descoberto.

    Beijinhos

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  16. Desculpa Rogério, mas continuo a não perceber estas repetições dos meus comentários, depois de um fim de semana fora após o último e de ter chegado a casa muito depois da hora deste aqui sem qualquer nome.

    Beijos
    Branca

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