19 maio, 2013

Poesia (uma por dia) - 36


CATARINA EUFÉMIA

O primeiro tema da reflexão grega é a justiça
E eu penso nesse instante em que ficaste exposta
Estavas grávida porém não recuaste
Porque a tua lição é esta: fazer frente

Pois não deste homem por ti
E não ficaste em casa a cozinhar intrigas
Segundo o antiquíssimo método obíquo das mulheres
Nem usaste de manobra ou de calúnia
E não serviste apenas para chorar os mortos

Tinha chegado o tempo
Em que era preciso que alguém não recuasse
E a terra bebeu um sangue duas vezes puro
Porque eras a mulher e não somente a fêmea
Eras a inocência frontal que não recua
Antígona poisou a sua mão sobre o teu ombro no instante em que morreste
E a busca da justiça continua

Sophia de Mello Breyner Anderson
NOTA: O assassínio de Catarina ocorreu a 19 de Maio de 1951  

10 comentários:

  1. Obrigada por mo recordar!
    Não podemos perdoar este nem outros crimes!

    ResponderEliminar

  2. "Chamava-se Catarina
    O Alentejo a viu nascer
    Serranas viram-na em vida
    Baleizao a viu morrer
    Ceifeiras na manha fria
    Flores na campa lhe vao pôr
    Ficou vermelha a campina
    Do sangue que entao brotou
    Acalma o furor campina
    Que o teu pranto nao findou
    Quem viu morrer Catarina
    Nao perdoa a quem matou
    Aquela pomba tao branca
    Todos a querem p'ra si
    O Alentejo queimado
    Ninguém se lembra de ti
    Aquela andorinha negra
    Bate as asas p'ra voar
    O Alentejo esquecido
    Inda um dia hás-de cantar


    Zeca Afonso

    ResponderEliminar
  3. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

    ResponderEliminar
  4. Esperemos que os carrajolas deste país que não dão tiros mas matam na mesma, não impeçam mais essa luta pela justiça...justiça social antes de mais.

    Abraço
    (Não sei se o comentário caiu ou não...este é o 2º)

    ResponderEliminar
  5. Também escrevi sobre Catarina nos meus dois blogues e no facebook, porque não podemos deixar que branqueiem a vileza da Ditadura nem permitir que se esqueçam as vítimas!

    Um fraterno abraço, Rogério.

    ResponderEliminar
  6. Antes de mais, deixe-me felicitá-lo pela homenagem a esta corajosa alentejana, Rogério.
    Se me permite, acrescentarei ao belo poema da Sophia, este do Alexandre O’Neill. Nunca é de mais lembrar esta barbaridade que ficou impune.

    “À MEMÓRIA DE CATARINA EUFÉMIA”

    "Podes mudar de nome, carrajola
    pôr umas asas brancas, arvorar
    um ar contrito,
    dizer que não, que não foi contigo,
    disfarçar-te de andorinha, de sobreiro ou de velhinha,
    podes mudar de nome, carrajola,
    de aldeia, de vila ou de cidade
    — és como um percevejo num lençol!

    Quando tivermos Portugal nos braços
    e pudermos amá-lo sem sofrer,
    quando o Alentejo se puser a rir,
    Catarina Eufémia, minha irmã,
    então o teu filho há-de nascer!"

    Ainda não amamos Portugal sem sofrer e os percevejos nos lençóis continuam bem visíveis!

    Um beijo.



    ResponderEliminar

  7. Rogério, lembrar sempre!

    Relativamente ao Zeca, depois desenrolo a meada. :)

    Beijo

    Laura

    ResponderEliminar
  8. Bem bonito. E eu não conhecia...
    Um abraço!

    ResponderEliminar