13 junho, 2016

Fazer como Santo António: mudar de púlpito e de auditório, mas não a doutrina. Boa?


«Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande.»
"Sermão de Santo António aos Peixes", Padre António Vieira, 
pregado na cidade de São Luís do Maranhão em 13 de Junho 1654(*)

«Pregava Santo António em Itália na cidade de Arimino, contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificultosos de arrancar, não só não fazia fruto o santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António com os pés descalços não podia fazer esta protestação; e uns pés a que se não pegou nada da terra não tinham que sacudir. Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência ou a covardia humana; mas o zelo da glória divina, que ardia naquele peito, não se rendeu a semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o auditório, mas não desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas vozes: Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes. Oh maravilhas do Altíssimo! Oh poderes do que criou o mar e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos, e postos todos por sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava e eles ouviam.»

Excerto do Sermão de Santo António aos Peixes, ler tudo aqui
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DEDICATÓRIA: Dedico este post à memória das minhas referências morais e intelectuais ligando-as a próximidade das datas de acontecimentos, uns felizes outros a lamentar: O nascimento de Fernando Pessoa; as mortes de Vasco Gonçalves, de Álvaro Cunhal, de Eugénio de Andrade. Coincidências que nos marcam. O destaque ao "Sermão" nem precisa de explicação... no dia de Santo António, dado a folguedos.

6 comentários:

  1. E, ainda hoje, os grandes vivem de pequenos. Tanto assim que até a sardinha nos querem tirar.

    Abraço.

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  2. pode não precisar de explicação, mas que este post é oportuno e ficou bem isso não restam dúvidas.
    boa semana.
    beijo
    :)

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  3. Não ando dada a folguedos,
    Nem a copos, ou folia,
    Mas também, sem quaisquer medos,
    Pr`ós gatos discursaria;

    Falaria de degredos
    - através da poesia... -
    Se os homens ficassem quedos,
    Sem ligar ao que eu dizia...

    Não seria novidade
    Porque muita vez o fiz
    E houve reciprocidade;

    Nunca um gato me desdiz
    Quando um poema me invade
    Desde os ramos à raiz...


    Maria João




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  4. ~~~
    Tão atual que impressiona! Bj.
    ~~~~~~~~~~~~~~~~~~

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  5. O mau dos textos que se mantêm actuais é a constatação de que a humanidade comete sempre os mesmos erros.
    Abraço

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  6. Olá, Rogério.
    O auditório muda e a história se repete. kkkkkkkk
    Como disse a Elvira (aqui atrás ou acima): a humanidade segue a fazer o mesmo - a lição é antiga, não se precisa estudar muito.

    abço amg

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