Nos últimos tempos, e ainda agora, o tema da redução dramática da natalidade tem andado pelas páginas dos jornais sem que por lá ande, como devia, a reflexão sobre as causas. Proponho-me a isso, mesmo que não creia que as cegonhas sejam uma espécie em extinção, razão que basta para encontrar outras razões, que não essa.
Aqui vai uma mão cheia de razões:
Primeira: ser jovem casal hoje não é pera doce
«Num país com poucas crianças, um dos debates que importa fazer, entre outros naturalmente, é como vivem hoje as novas famílias.
De
acordo com os últimos Censos (2011), existem 1 572 329 crianças até aos
14 anos, um número reduzido, conforme o que tem sido dito, para uma
população de 10 562 178 de habitantes.
Podemos falar
da situação das crianças sem falar da situação da nova geração de pais?
Os que são agora pais, desejaram ou adiaram sê-lo, não tiveram, ao contrário do que é dito sistematicamente, a vida facilitada. (...) Hoje, os portugueses entre os 25 e os 34 anos, apesar de serem aqueles com maior nível de formação profissional e superior, são mais afectados pela
precariedade e baixos salários. A sua média salarial foi a que mais baixou , dos 794 euros registados em 2008 para os atuais 757 euros, de acordo com os dados do Inquérito ao Emprego.
Foi de resto o único segmento etário cujo salário médio recuou desde o ano passado quando os
outros melhoraram, mesmo que levemente (13 euros), com a reposição de
alguns dos direitos laborais.
Com as
preocupações inerentes à degradação das condições laborais e sociais, que tempo de qualidade é passado por estas famílias com a agravante dos; horários laborais que existem? Como é que o seu desenvolvimento e a sua saúde são tratados? Como é ocupada a infância e quais as consequências destes fatores na sua vida diária, no futuro das crianças e, consequentemente, do país?
Quando entramos novamente nos
indicadores, vemos que Portugal está em 33.º lugar entre os 41 países da
OCDE no que diz respeito às desigualdades e acesso a apoio social para
as crianças, de acordo com o Relatório da UNICEF de 2015.
A
degradação, e mesmo destruição de muitos dos avanços que a Revolução de
Abril trouxe, tem impactos bem concretos na vida diária das crianças.
Os
horários desregulados e a precariedade abriram caminho para cada vez
menos tempo com os filhos, esse é um dos testemunhos mais presentes
quando ouvimos os pais e aqueles que trabalham com as crianças.
A
falta de descanso, de tempo para brincar livremente e de tempo para o
lazer faz-se sentir em todas as esferas. Hoje, entrar nos edifícios
escolares às primeiras horas da manhã, passando lá todo o dia, e sair já
noite cerrada é a realidade que muitas crianças conhecem. A percentagem
de berçários, creches e jardins de infância abertos das 8h às 19h é
superior aos que estão abertos das 9h às 17h.
É no 1.º Ciclo do
Ensino Básico que se implementam, em 2006, com um Governo PS, as AEC
(Áreas de Enriquecimento Curricular) hoje generalizadas nas escolas.
Transformando-se
num negócio, estas trouxeram as empresas privadas de ocupação de tempos
livres na sua forma de contratação precária de licenciados a pouco mais
de 300 euros. Um sugadouro de recursos públicos, que impôs mais tempo
de abertura da escola, reduzindo de forma significativa as
disponibilidades de atendimento às crianças.
Hoje não existem em
muitas escolas funcionários disponíveis para vigiarem as crianças que
não fiquem na sala depois do horário lectivo, obrigando os pais que
precisam de horários prolongados a inscreverem as crianças nestas
atividades.
Não existe Rede Pública de creches, e foram encerradas
mais de 4000 escolas do 1.º Ciclo, contra fortes protestos das
populações, sobretudo em zonas rurais e no interior do país,
desvalorizando o papel da escola de proximidade, afastando-a do meio
familiar e substituindo-a pelos grandes centros escolares distantes do
meio onde as crianças vivem. (...)
Com a distância que têm de percorrer
até à escola em vastas zonas do país, com o horário das AEC, que são
realizadas nas instalações escolares (grande parte das vezes dentro da
mesma sala de aula) e o funcionamento de atividades de tempos livres na
«componente de apoio à família», uma grande parte dos alunos do 1.º
Ciclo pode permanecer, e permanece (!), nos espaços escolares desde as
8h até às 19h, não contando com o tempo usado em transportes.
Permanecer
nos espaços escolares não significa ter acesso a pavilhões desportivos,
a projectos de desporto escolar ou outros, a espaços amplos, vigiados e
seguros, cobertos quando está tempo de chuva, a edifícios adaptados às
necessidades das crianças... Significa, como sabemos, e é preciso
dizê-lo em toda a parte, manter crianças dos 6 aos 10 anos, dentro de
salas de aulas, horas e horas…
A «Escola a tempo inteiro», ou o
tempo inteiro na escola, não é para as famílias que podem pagar as aulas
de dança, a piscina ou a empregada doméstica que os leva simplesmente a
correr nos parques e jardins. São as crianças provenientes de famílias
monoparentais (que ainda têm uma prevalência de mães em relação a pais,
53 363 constituídas por pai e filho/a para 370 945 constituídas por mãe
e filho/a), com menores rendimentos e piores condições laborais as mais
submetidas a este tipo de horários.
São várias as vozes e os
especialistas que se pronunciam sobre o tempo excessivo de escolarização
de crianças e adolescentes, relacionando-o com o sedentarismo, o
isolamento social dos mais jovens, a indisciplina e a aversão à escola.
Carlos Neto, especialista da Faculdade de Motricidade Humana de Lisboa,
diz-nos:
«A
ciência demonstra que, no ciclo da vida humana, o pico maior, onde há
mais dispêndio de energia, é entre os cinco e os oito anos. Temos de ter
muito respeito por isso. Não podemos confundir tudo e achar que essas
energias são anormais. São naturais e por isso temos de olhar para elas
como naturais e não patológicas e medicá-las. (…) É inaceitável que 220
mil crianças estejam medicadas em Portugal. (…) Na verdade, existe muito
pouca harmonização do tempo de família. E é preciso perceber que as
crianças não devem brincar apenas entre elas; precisam de tempo para
experimentar e brincar com os pais também.» (Entrevista à revista online
D’Elas, de Fevereiro de 2018 )
(Há muito mais para dizer, vá lá ler)
Segunda: Com um Mundo assim, que futuro se reserva às crianças
Em Portugal, soam agora os sinos da velha Roma. Um desespero lancinante percorre a comunicação social. O desatino é total. Nada era como imaginaram. «Tempestade perfeita em Itália» (J. Brandão de Brito, JNegócios, 12MAI18). «Uma Itália à moda de Putin e Trump» (J Almeida Fernandes, 19MAI18). «Finalmente um tiro no porta-aviões» (T.de Sousa, Público 20MAI18). «Não vale a pena ter ilusões» (T.de Sousa 22MAI18).
«Mercados e UE em modo pânico», titula o Público (30MAI18). «Itália é a
maior ameaça ao Euro desde a sua criação» (Seixas da Costa, J Económico,
29MAI18). «Pobre Europa! (…) E agora para acabar, a Itália entregue a um
louco fascista e a um partido “anti-sistema” e ambos anti-Europa. Mas qual sistema? E anti-Europa? Mas qual Europa? Restará pedra sobre pedra do que outrora chamámos sistema democrático e União Europeia?
(Há muito mais para dizer, vá lá ler)
Terceira: O risco do PSD voltar ao poder é uma ameaça a temer
Rui Rio deu o mote e competiu a Negrão destacar três medidas para incentivar a cegonha: um subsídio de 428 euros por grávida, um
outro de 10 722,50 euros por criança até aos 18 anos e a extensão da
licença parental até 26 semanas.
Visto bem o filme, é assim:
A proposta de dar 10 mil euros por criança vai acabar por resultar numa
redução de 6700 euros pelo primeiro filho para os agregados mais pobres; quanto ao subsídio para as grávidas, o valor proposto corresponde a metade do primeiro escalão do abono de família pré-natal, actualmente em 878,52 euros; quanto ao caso da extensão da licença parental até 26 semanas, vá lá, a medida proposta dará um bónus de... 2 dias
(há muito mais para dizer, vá lá ler)
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