31 maio, 2022

"CONTOS PARA SEREM CONTADOS" - ENA TANTOS!


Quando há dias, não muitos, dizia que a lotação estava esgotada... estava! Está tudo preparado... Mais de 100 presenças, entre miúdos e graúdos... Vamos ver como corre!

30 maio, 2022

QUEM TEM DE IR PARA OUTRAS TERRAS? - II

No anterior post falava de sectores que, estando em queda, colocava gente de elevada qualificação a procurar na emigração a via da sua realização profissional e, por vezes mesmo, a sua sobrevivência. Veio, no decurso de troca de ideias no facebook, a talhe de foice, referir que por cada oficial da marinha licenciado pela Escola Náutica, o Estado investir 25 mil euros. Licenciados que na sua grande maioria, após estágio, ingressam de imediato na tripulação de armadores estrangeiros que, na qualificação requerida, não despendem um cêntimo... 

Situação semelhante se passa, no SNS, com os enfermeiros. Segundo dados divulgados pela Ordem dos Enfermeiros, mais de dois mil enfermeiros pediram para sair de Portugal desde o início da pandemia, em março de 2020, especialmente no segundo semestre do ano passado. "Só em 2021, o número total de enfermeiros que manifestaram intenção de emigrar corresponde a cerca de um terço dos novos enfermeiros formados anualmente pelas escolas portuguesas", refere a OE em comunicado.

E quanto custa ao Estado formar um enfermeiro? Veja o vídeo e espante-se com isso! 




 

29 maio, 2022

QUEM TEM DE IR PARA OUTRAS TERRAS?

Ontem, aqui e no facebook, escrevia eu ««Portugal é hoje o país da União Europeia com mais emigrantes em proporção da população residente. O número de emigrantes portugueses supera os dois milhões, o que significa que mais de 20% dos portugueses vive fora do país em que nasceu.»

Ontem, lá no facebook, tinha este comentário «Acontece porque as pessoas procuram melhores condições de vida, em Portugal existem muitos empregos básicos mas poucos são os portugueses que querem, como limpezas, construção civil, restauração, agricultura etc etc alguns até preferem viver de subsídios do que trabalhar e contribuir para a comunidade...»

Depois, de seguida, gerou-se um bate-papo que, a páginas tantas, mereceu a promessa de vir a escrever isto que agora estou escrevendo. 

Sem contrariar o quer que seja do que foi respondido verdade seja que tal resposta deixa esquecido muito ao que este nosso País atormenta. 

Atormenta ter perdido (quase) todo o sector da metálico-mecânica.

Atormenta ter perdido (quase) todo o sector de construção e reparação naval.

E a grande maioria dos dois milhões que tiveram de partir para outra terra serão gente qualificada, operários e técnicos especializados que tinham emprego nessas áreas. 

No sector da metálico-mecânica, foi para o galheiro todo o cluster ligado ao fabrico de material circulante. Veja-se, que agora, a empresa Medway (a antiga CP Carga, antes desta ser privatizada) anunciou a aquisição de 16 locomotivas eléctricas e 113 novos vagões. O material vai ser adquirido à empresa Stadler (as locomotivas) e Tatravagonka (os vagões) por um valor total de 93 milhões de euros, ou seja, o sector ferroviário português continua a alimentar o aparelho produtivo de outros países, em vez de reconstruir o seu.(ver aqui)

No sector da construção e reparação naval, hoje reduzido ao mínimo, a dimensão dos efeitos deve ser avaliada com impactos bem superiores. 

Vejamos: para quê estaleiros, se não temos barcos? A frota pesqueira tem vindo a reduzir-se, 20% dos barcos foram à vida e a que resta vai envelhecendo (a idade média das embarcações ronda os 45,7 anos enquanto a média europeia é de 23,9 anos) e é assim que, apesar de 97% do território português ser mar, o país importa 1.3 milhões de toneladas de peixe por ano (ver aqui)

A frota da marinha mercante não está melhor, antes pelo contrário, como se infere neste testemunho passado em vídeo.

 

28 maio, 2022

PORTUGAL VS. UCRÂNIA - UMA COMPARAÇÃO QUE NÃO LEMBRA AO DIABO... II

«Portugal é hoje o país da União Europeia com mais emigrantes em proporção da população residente. O número de emigrantes portugueses supera os dois milhões, o que significa que mais de 20% dos portugueses vive fora do país em que nasceu. Entre 2010 e 2013, o número de saídas de Portugal cresceu mais de 50%. Entre 2013 e 2014, a emigração estabilizou em torno das 110 mil pessoas por ano.»  

Lendo isto aqui, fui ler o que se passa na Ucrânia e lá, porque há mísseis, bombas e tiros, o êxodo já ultrapassa os 5 milhões... se podemos comparar? Claro que não! Mas dá que pensar... Não é preciso um só tiro para que êxodo semelhante  aconteça... Acontece como se fosse guerra...

27 maio, 2022

PORTUGAL VS. UCRÂNIA - UMA COMPARAÇÃO QUE NÃO LEMBRA AO DIABO...

Soubemos o que Costa disse, ficámos sem saber o que realmente pensa. Não sei até o que lhe passa pela cabeça. Nem me atrevo a adivinhar... terá ficado, como eu ficaria, com o coração desfeito ao ver tal destruição. Ao saber do sangue derramado. Ao saber de tantas e violentas mortes. Mas...

...mas ouso comparar Portugal à Ucrânia.

Comecemos pelo território, onde a Ucrânia tem praticamente perdida a região do Donbass, Portugal já tem efectivamente perdida 70% da vasta região do Alqueva. Isto sem um só tiro. Sem um só grito. Sem sangue derramado. Efectivamente o «latifúndio, que nalguns casos deu lugar ao megalatifúndio, tem vindo a aumentar e é maioritariamente, propriedade de seis grupos económicos ou fundos imobiliários – Elaia, De Prado, Olivomundo, Aggraria, Innooliva e a Bogaris – na sua maioria espanhóis que detêm 65,5% de toda a área de olival. Isto estende-se até Portalegre, onde os grupos Elaia e De Prado possuem muitas herdades próprias e arrendadas». E o testemunho citado abarca outras comparações, designadamente a debandada. Na Ucrânia, são aos milhões. No Alqueva, são à escala.  Por exemplo «em Avis, na década de 60 do século passado, tínhamos cerca de 8 mil habitantes. Em 2019, éramos 4248. Isto significa quase 50% da população» Isto, sem um só tiro...

 Depois do território, passemos às empresas. A Ucrânia deu ontem conta de já terem sido arrasadas cerca de 300. Por cá, à escala, foram quase tantas. Por exemplo, um sector inteiro foi para o galheiro. Qual? O da metalomecânica! E isto, sem um só tiro. Siderurgia Nacional, Mague, Equimetal, Cometna, Sorefame, só para citar as grandes que foram à vida. Isto sem um só tiro! E para não falar da construção e reparação naval, ela toda no estaleiro... Alfeite, Lisnave, Setenave, Viana... Isto, sem um só tiro...

A Ucrânia, invadida, está em chama (e chaga) viva. Nós, por aqui, vamos ficando ardendo em fogo lento.

Se Costa pensa  nisso? Pensar, pensa! Mas como não há mortos nem feridos... alguém há-de escapar!

26 maio, 2022

A COMPANHIA NACIONAL DE BAILADO, A OLGA RORIZ, JOSÉ SARAMAGO E COISAS QUE ME ENCHEM A ALMA...

Hoje, deambulando pela net dou com uma notícia que me enche a alma. É assim:

«Oito anos depois da última criação de Olga Roriz para a CNB, a coreógrafa regressa ao Teatro Camões para apresentar uma nova criação inspirada na obra do Nobel da Literatura português.

«Há muita coisa na obra de Saramago que sinto que se cruza com o meu trabalho. Como os caminhos tortuosos do ser humano, o seu sofrimento, a sua dor, a perplexidade frente ao amor e à morte e a injustiça, a violência, os direitos humanos, a desigualdade», disse a coreógrafa, citada num comunicado da CNB enviado à agência Lusa.

Deste mundo e do outro recupera o título de uma das obras de Saramago (1922-2010), mas «procura transmitir uma visão sobre a herança literária, a visão do homem e escritor, uma forma de sentir Saramago», segundo a CNB, que fez o convite a Olga Roriz para a nova temporada, já desenhada por Carlos Prado, director da companhia.»

Ler tudo aqui 

Aproveito para deixar imagens impressionantes de um bailado coreografado pela Olga... não, não é sobre a invasão da Ucrânia, mas sim sobre uma guerra de que pouco se fala... 

25 maio, 2022

ESTUDO SOCIOLÓGICO DE CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO JOVEM DO CONCELHO DE OEIRAS E SUAS DINÂMICAS

Como já alguém já terá dito neste meu espaço, eu não me dou parado. E vou a todas... desta feita, assisti à apresentação de um estudo. A quem interesse, faculto aqui o acesso. São 138 páginas, onde nada é acessório. Dessas tantas, seleccionei os quadros abaixo. E para deixar dor de cabeça, chega!


 Não posso deixar de saudar o excelente trabalho da equipa da CESIS, na pessoa da sua coordenadora, a Drª Ana Cardoso

24 maio, 2022

"ZERO EM COMPORTAMENTO"


Em vésperas de entrar no mundo escolar, para apresentar uns "Contos para serem contados", faço uma incursão prévia por esse mundo, para melhor entendê-lo. Tropecei neste texto e dou-vos conta que me dá muito que pensar:
«A meio de um dos dias da semana passada, um amigo de doze anos chegou a casa e afirmou convicto que não queria voltar à escola. Eu engoli em seco e quando espreitei, lá estava um nó-cego para me entreter.

Num dia como outros soa o alarme de fim de recreio e um bando de miúdos regressa à sala de aula. Distribuem-se pelas mesas e preparam os cadernos, as mãos e canetas para um sumário ditado, primeiro dito do que feito.

O professor entra pouco depois e o sumário é ele que o traz – vieram essas linhas já de casa, entrelaçadas com os objectivos, as metas, as médias, as benditas tabelas feitas a regra e esquadro, iguais para todas as crianças de determinada idade - bem sabemos que nos movemos todos a um tempo, partilhamos uma sorte.

E traz o professor aqueles planos, arrancados à sua própria sobrecarga, dividem casa com o seu fardo burocrático, papéis e cartas, avaliações e notas, currículos e pautas – é um milagre que consiga ter tino e tempo para pensar nos sumários e seria um milagre maior se tivesse tempo para traçar um dessumário, já lá iremos.

Estes miúdos distribuídos pelas mesas têm entre onze e doze anos. Ainda trazem as brincadeiras interrompidas, a novidade por contar, a vontade de um tempo-sem-rédea que não se perde por decreto no caminho do recreio à sala. Mas o professor apressado, de sumário na ponta da língua, amarrou os olhos ao alvoroço do momento e tomou por desrespeito que uma das crianças não lhe cumprisse uma ordem curta e imediata – conclusão, o meu amigo pequeno viu-se a braços com uma falta disciplinar. Uma falta disciplinar equivale desde logo a uma falta injustificada à aula em causa, fora outras possíveis consequências – mas o facto de ter regressado a casa certo de que não queria voltar à escola é de longe a mais importante.

Este episódio, assim contado, pode pecar por falta de detalhes e aprofundamento, mas deixa a descoberto um lugar ferido para onde vale a pena olhar.

Se numa primeira investida instintiva tornarmos a atenção para o professor, facilmente tropeçamos na sua sobrecarga. Ao professor que trabalha, tantas vezes, além das 46 horas semanais no cumprimento do imenso trabalho imposto à volta dos papéis, não lhe sobra tempo para estar com as crianças. Estar com as crianças, entenda-se, com tempo para isso, e para daí colher os frutos de partilha e de confiança que assim se constroem. Estar com as crianças de corpo presente e inteiro, disponível para ouvi-las e vê-las, disponível também para aprender a desaparecer-lhes da vista e aconchegar de longe o lugar onde se põem a teste.

Um professor que trabalhe tantas e tão duras horas, exposto ao desafio de olhar a cada um dos seus tantos alunos e de raramente o conseguir, exposto às consequências da falta de vagar para se nutrir, exposto ao barulho, ao espaço da escola onde convivem tantas vidas, tantos desejos e anseios, tanta descoberta e tanto cansaço ao mesmo tempo – não pode ser um professor disponível.

Tornemos então a atenção para as crianças. Elas, que se juntam em bando e lhe ganham a força, elas que também embatem na sua violência potencial. Elas que passam tantas horas do seu dia na escola, elas a quem sentimos não dever explicação alguma sobre isso. Vão para onde as mandamos e mandamo-las para a escola – um lugar de promessa, do sonho feito paredes-meias com os outros, edificando hojes e amanhãs. Mas é mesmo? É isso que lá fazemos? E como é que fazemos?

Se prestarmos atenção, também nelas há o empecilho da falta de tempo. Movem-se, do acordar ao deitar, ao ritmo de acompanhar os adultos nas suas próprias tarefas de existir, o que não é coisa pouca. Quantas vezes se vestem com pressa, se lavam num ápice, correm rua acima e abaixo para não perder o alarme de entrada na sala? Quanto tempo têm para brincar? Porque será que lhes separamos o tempo de brincar do tempo de aprender?

Claro que a escola não se faz apenas de crianças e professores. Sobre os restantes adultos que a compõem, as inquietações e as perguntas não são muito diferentes.

Eu, que trabalho a brincar durante todo o dia, quantas vezes me confronto com os colegas que «a bem da civilidade futura» decidem que as crianças não podem procurar com o corpo inteiro os brinquedos dentro do baú? «Dentro do baú não se entra, não são selvagens», «ali não se brinca», «acolá não se descobre». Tudo nos parece a cada passo uma falta de respeito, pior, uma falta de respeito que nos é dirigida em particular, como se fosse suposto que uma criança com quem não tivemos tempo de construir uma relação de confiança, confiasse em nós, nas nossas decisões e julgamentos, nos limites que desenhamos com os lápis que trazemos.

Quanto nos esquecemos uns dos outros. Usamos o espaço da escola como mais um onde construímos sobrevivência. Num mundo tão assim o tempo inteiro, não digo que não possa ser útil. Mas pergunto-me porque andamos tão preocupados com calendários e formalidades, e tão pouco em perguntar uns aos outros: como correu o teu dia?

E se ousássemos, todos nós, os que compomos as escolas com o nosso tecido humano, fazer perguntas sobre o tempo? E se de cada resposta fizéssemos nova pergunta? E assim sucessivamente? E se assim desfizéssemos sumários, desarrumássemos espaços, sossegássemos alarmes?

De pequenino é que se torce o pepino. Mas, e se não o torcêssemos? O que acontecia à nossa turma, à nossa escola, ao nosso bairro, ao nosso mundo?»


23 maio, 2022

EM TEMPO DE GUERRA, UM LIVRO QUE FALA DE GESTOS DE PAZ...


Se bem se lembram, a imagem mostra o momento em que ofereço o meu primeiro livro à Marta no decurso de um almoço em que celebrávamos o "25 de Abril". 

Na sexta feira passada a Marta ligou-me: "Rogério, vai haver uma aula onde a professora nos vai pedir para falarmos de um livro. Escolhi o teu. Mas ajuda-me. Como posso apresentar-te como autor? Como achas que faça?"

Ontem, mandei-lhe um e-mail, recomendando qualquer coisa, assim:

«O autor deste livro, mora na minha praceta e conta 77 anos.
 
Ofereceu-me o livro e disse-me para vos dizer que, se não tivermos a memória do seu tempo, corremos o risco de voltar a passar por coisas más. Cada povo deve ter a sua memória e o livro dele é um contributo para que essa memória não se perca.

Coisas más, por ele passadas? Ele destaca o ter perdido 4 anos da sua juventude vestindo farda. Ter passado dois, desses quatro, numa guerra. Contudo, afirma, que sua alma nunca se admitiu fardada...

Ao oferecer-me o livro, fez-me uma dedicatória onde se lê "Para a Marta, com quem partilho a memória de afectos, angústias e medos... como enfermeiro militar, na guerra em Angola, e assina"
 
Agora vou ler-vos a página 85, por ele recomendada, que podem seguir pelo livro que podem ler aqui... »

22 maio, 2022

HOJE SENTI-ME CABO-VERDIANO!

 

Se eu estava lá? Claro! Fui convidado! 

E quem pensam que recolheu a imagem, produziu e montou o vídeo?
(em breve voltarei ao tema, falar sobre o "batuco" faz sentido e vale a pena)

21 maio, 2022

O LANÇAMENTO DO MEU LIVRINHO: LOTAÇÃO ESGOTADA!

 
Se é segredo? É! Contudo, como não sou seguido nem por meio mundo, vou deixar uma pista mas não dizendo tudo: 
vão estar, além de quem imaginam que esteja, muitos dos personagens dos meus contos. Boa?

E é verdade, a lotação está esgotada!


20 maio, 2022

"A CHINA ESPIRRA, O MUNDO INTEIRO COSTIPA-SE"

Depois de ontem, em que confirmei que poucos são os que investem o seu tempo em coisas onde invisto o meu, desisto de fazer apelo à leitura de posts longos, embora não feche a porta a quem queira fazê-lo, e fica aqui a prova.

Desse texto, longo, longo, trago um significativo extracto, curto e grosso. Assim:

«O dólar já desapareceu há algum tempo nas transações entre os países asiáticos. China, Rússia e Índia estão desenhando a nova geopolítica do mundo. Até a Arábia Saudita está aceitando rublos e ienes. 

Os ministros de Relações Exteriores dos BRICS estiveram reunidos virtualmente na quinta-feira (19) para preparar a reunião de cúpula que transcorrerá em junho, em Pequim. A China, maior potência, com a maior população do planeta, 1,2 bilhão, logo será superada pela Índia, hoje perto de um bilhão de habitantes. Integradas com a Rússia, são as bases para os BRICS – que a essa aliança somam o Brasil e a África do Sul – e determinam hoje a nova geopolítica do mundo. Um mundo multipolar, sem hegemonias, sem guerra, preocupado em preservar a vida com qualidade.»

18 maio, 2022

"O PÃO NOSSO DE CADA DIA, NOS DAI HOJE"

A imagem é de ontem. Dá conta do que já era grave, se ter agravado. Faz exactamente agora dois anos que a denúncia era aqui feita em tom de alerta. Do então escrito, trago este extracto:

«Um documento (importante) do Ministério da Agricultura fez o balanço das disponibilidades e possíveis problemas com o abastecimento alimentar do país. Pode ler-se na página 18: «Segundo o INE (…) nos cereais de outono/inverno, e pelo sétimo ano consecutivo, a superfície instalada diminuiu, passando para os 106 mil hectares (a menor dos últimos cem anos), com reduções generalizadas: trigo duro (-15%), triticale1 e cevada (-10%) e trigo mole e aveia (-5%) (...)». Do centeio, do praganoso das serranias já nem falam! Cito e sublinho «Grau de Autoaprovisionamento: 4% em 2017/18». Mesmo no milho, onde a situação é melhor, estamos com um grau de autoaprovisionamento de 24,2%.

Dito isto, quem será capaz de dizer que as políticas agrícolas de sucessivos governos PS, PSD e CDS, a Política Agrícola Comum (PAC) e as sucessivas reformas da PAC, guiadas pelos interesses agrícolas da França, Alemanha, Holanda e outros, foram acertadas, adequadas ao país? E outra conclusão se impõe: apesar de todos os avisos, 2008 e 2012, o país não emendou a mão.»

17 maio, 2022

O PONTA-DE-LANÇA ROGEIRO (não confundir com Rogério, eu jogo à defesa pois é tempo de resistir)


«Os tempos que vivemos são os do triunfo, em toda a linha, do jornalismo de merda. Todos os meios de comunicação se disputam, até à abjecção, por servir uma informação acanalhada, truncada, parcial, simplificada, peneirada, paternalista, adocicada e sentimental. Sem escrúpulos nem pudor.»

Ler tudo, aqui, onde merece ser lido


 

16 maio, 2022

JÁ NENHUMA MISÉRIA LHES FALTA

DESAMPARADOS

Levantam-se todos os dias
cedo ou tarde
para trabalhar
para procurar trabalho
para decifrar o latim de promessas vãs
para catar restos em caixotes do lixo
nas traseiras dos hipermercados
para descer os degraus corroídos da loucura
para mirar o horizonte embaciado, sem barcos.

Sofrem sem que uma
só esperança lhes minta.

No fim do dia voltam a casa
para a sopa que lhes afaga o corpo cansado
para os cartões no chão
onde se deitam como reis
sobre a sua pobreza.

Levantam-se,
muitos anos mais velhos, a cada dia
cedo ou tarde
para trabalhar
para procurar trabalho
para decifrar o latim de vãs promessas
para catar restos em caixotes do lixo
nas traseiras dos hipermercados
para descer os degraus corroídos da loucura
para mirar o horizonte embaciado, sem barcos.
E nenhum vento que os perturbe.

Esquecem-se de sofrer. Já nenhuma miséria lhes falta.

Lídia Borges, in "Searas de Versos"

15 maio, 2022

UM ALMOÇO, CELEMBRANDO ABRIL (RODEADO POR QUEM NELE ENTROU)

A imagem à esquerda, Olívia Matos, a Presidente da "Desenhando Sonhos" lendo o poema com que se encerra a celebração. Na imagem da direita, eu, rodeado por gente de Abril. Por detrás de nós, telas conhecidas. Não, não foi por saudosismo que celebrámos. Nem por mera tertúlia em torno de um bom almoço. Das vozes que se foram sucedendo houve o pré-anúncio de iniciativas, de intervenções cívicas, de  actos de cidadania... E, em todos nós, uma determinação... se isto der mesmo para o torto, faremos florir um Abril novo!

Manhã de Abril
Manhã branca, luminosa e límpida
como ar electrizado depois da trovoada
assim me lembro de ti manhã de Abril
carregada de esperança
e cantada até de madrugada.
 
Foste de todos, tu que não és só minha,
Desejo de liberdade dos que por ti esperavam,
e guardam ainda na memória a cor e o perfume dos cravos
floridos em plena rua, nas mãos erguidos
anunciando mil Abris de flores que não murchavam.
 
Amo-te Abril, ainda mais agora
Porque te sujaram, mentiram, maltrataram
Despiram-te da esperança que envergavas
Na manhã em que interrompeste a noite fascia
Em que o medo e repressão é que mandavam. 
 
Vem manhã de Abril, não temas as ciladas
não temas o vento e a geada que reprime o povo
que rói a esperança em cada dia que te não canto,
Que não te elevo, que te não cumpro
com a revolta que se impõe de novo
 
Canto-te Abril, hoje como então.
Elevo-te no cântico da terra onde floresce ainda
o verde e rubro dos cravos da amizade,
que entoo com som e cor redobrados na esperança
de que se cumpra a prometida liberdade. 
 
Olívia Matos
25 Abril, 2014

12 maio, 2022

«Câmara de Setúbal: moções de censura chumbadas e imigrantes reconhecem apoio»

 

Este depoimento tem por legenda o seguinte texto:

«Era necessário vender uma notícia má, que se vende melhor»

Valentina nasceu na Moldávia, mas vive em Setúbal há 22 anos. Tem dupla nacionalidade, é membro da Associação de Imigrantes dos Países de Leste Edinstvo (que significa «união», em russo), apresentada pela imprensa como sendo «pró-Putin», e foi uma das intervenientes na reunião de ontem. Desta associação, contou Valentina, fazem parte imigrantes moldavos, russos «contados pelos dedos», georgianos, bielorussos, «mas a maior parte dos associados são ucranianos».

Ler este e outros depoimentos aqui, no AbrilAbril

 

10 maio, 2022

A ILUSTRADORA DO MEU LIVRINHO


Eu e a Sílvia Mota Lopes ( ilustradora dos meus contos) falámos um pouco ao telefone, numa breve troca de ideias e também para aferir do volume de livros a imprimir... daí a visitá-la na sua página do Facebook foi um passo... e não me contive em trazer para o meu espaço o que lá vi... essa imagem acima, tão terna, e este poema, tão belo:

As Palavras de Amor 
 
Esqueçamos as palavras, as palavras:
As ternas, caprichosas, violentas,
As suaves de mel, as obscenas,
As de febre, as famintas e sedentas.
 
Deixemos que o silêncio dê sentido
Ao pulsar do meu sangue no teu ventre:
Que palavra ou discurso poderia
 
Dizer amar na língua da semente?
 
José Saramago, Provavelmente alegria

09 maio, 2022

A VERDADEIRA GENEROSIDADE


 
O acto generoso está normalmente associado à necessidade de reconhecimento por parte de quem o pratica. Frequentemente resulta da compreensão da necessidade do outro. Contudo, a verdadeira generosidade deve ter por impulso a ternura e o amor, nunca a pena...

08 maio, 2022

DE HÁ MUITO ME SINTO... FRANCISCO...


«O Papa Francisco sugeriu que a NATO poderá ter motivado a invasão da Rússia à Ucrânia, numa ocasião onde voltou a reforçar a sua vontade de se encontrar com o presidente russo.

Francisco disse que a NATO “ladrou” à porta da Rússia e que isto pode ter provocado a invasão da Ucrânia.

Numa entrevista ao jornal italiano “Corriere della Sera”, o Papa refletiu sobre a agressão letal da Rússia ao seu vizinho e disse que, embora não se possa chegar ao ponto de dizer que a presença da NATO em países próximos “provocou” Moscovo, e “talvez facilitou” a invasão.

Relativamente ao uso de armas, o pontífice está dividido quanto ao fornecimento de armas aos ucranianos.

“Estou muito longe de poder responder à questão sobre se é certo fornecer armamento aos ucranianos. O que está claro é que as armas estão a ser testadas naquela terra. Os russos sabem agora que os tanques são de pouca utilidade e estão a pensar noutras alternativas. As guerras são travadas para isso: para testar as armas que produzimos”, garantiu.

Quanto à visita aos países em guerra, o Papa explicou que primeiro quer ir a Moscovo e referiu que sente que não tem de ir à Ucrânia.

“Não vou a Kiev agora. Enviei o Cardeal Michael Czerny e o Cardeal Konrad Krajewski, que lá foram pela quarta vez. Sinto que não preciso ir. Primeiro tenho que ir a Moscovo, primeiro tenho que conhecer Putin”, destacou.

O Papa tem demonstrado, em diversas ocasiões, a sua vontade de se encontrar com e presidente russo e três semanas depois de ter começado a guerra, a 24 de fevereiro, Francisco formalizou um pedido e ainda aguarda resposta.»

07 maio, 2022

PUTINISTAS HÁ MUITOS, SEUS PALERMAS

Tenho andado a percorrer espaços não alinhados, hoje transcrevo do "aventar", por um montão de razões e porque encontrei por lá a Teresa Palmira Hoffbauer . Então cá vai:

«Apesar de não ser comunista e de não me rever nas tomadas de posição do PCP, não no conteúdo, mas na forma, assumo que vai-me dando um gozo especial ouvir aqueles que nunca perdem a oportunidade para vaticinar a morte do Partido Comunista, um partido “moribundo”, dizem, mas que sempre ocupa o imaginário de vingança PRECquiana de tais neurónios. O imaginário de vingança e os sonhos molhados, acredito, porque isto é gente com patologias.

Digo isto porque não deixa de ser estranho que os que acusam o PCP de “totalitarismo”, sejam os mesmos que agora querem afastar um executivo democraticamente eleito, com base em “alegadamente”s. É Putin na Ucrânia, os EUA em qualquer sul-americanismo que mexa, o PSD em Setúbal, centenas nas redes sociais e dois ou três no Aventar. Tudo ganha ainda mais cinismo quando situações como a de Setúbal aconteceram em Albufeira, Gondomar ou Aveiro, em Câmaras governadas por PS ou PSD, mas aí está, aparentemente, tudo bem. Ou isso, ou os jornalistas ainda não descobriram tal. Confesso que teria a sua piada, e é bem possível que aconteça, que em Setúbal se realizassem eleições para a Câmara Municipal e a CDU ganhasse outra vez. E junto mais um motivo: quando Zelenskyy veio à Assembleia da República, o PCP não compareceu – fez mal, mas não compareceu; ora, segundo notícias da altura, mais de um terço das pessoas questionadas também não seriam a favor da presença do presidente ucraniano no Parlamento. Mérito ou demérito, uma coisa é certa: o PCP continua a ter representação porque continua a representar partes da população. É tão simples como 1+1 ser igual a 2. Mas, como de costume, os decisores não escutam o povo. Não o auscultam. Não o tentam favorecer. Ao invés, imbuem-se de uma sede de poder a qualquer custo e até uma guerra a Leste serve as pretensões da direita em Portugal. Na arte do aproveitamento político, nunca ninguém será melhor do que a direita. Especialmente, esta nova direita: mais reactiva, mais capaz de baralhar e confundir, mais populista e artificialmente erecta.

Gostaria de escutar os argumentos, de assistir às novas tentativas de ascender a todo o custo ao poder, de ver a fabulação daqueles que, antes, eram pró-oligarcas e agora são anti-matrioscas e de me rir com a falta de vergonha que o PSD (e outros mal paridos) tem na cara. Oxalá se concretize.

Vivemos dias em que se atira um “putinista” para lá, um “putinista” para cá… e até os mais ávidos putinistas deixaram de o ser, com a direita portuguesa a travestir-se ao máximo neste particular. É caso para dizer: putinistas há muitos, seus palermas!»

João L. Maio, no AVENTAR

06 maio, 2022

O "BOOMERANG" ANTICOMUNISTA (ou se o tiro não sairá pela culatra de quem tanto ataca)


Ela, com este meio sorriso, testemunha ter siso.  Siso,  bom senso e sinal de tudo em que reflecte fazer sentido. Segue extracto, em que escreve assim: 

«A verdade é que ao ideal comunista – altruísta e igualitário, com abolição de classes e eventualmente do próprio Estado – não foi feita justiça com as tentativas conhecidas de o concretizar. Há quem diga que nunca seria possível, que são ideais utópicos. Não é preciso fazer essa avaliação. É que indo ao programa do PCP e à sua história, encontramos a defesa da democracia, o combate às desigualdades sociais, a defesa das lutas tradicionais e, mais recentemente, das progressistas. Não há revolução, não há estado totalitário ou ditadura do proletariado.»

Ou ainda, indo ao final do seu texto:

«... o resultado desta convergência em torno da crítica ao PCP pode trazer resultados inesperados: é que as pessoas, quando sentem um aperto, inclinam-se para onde o seu lado sentimental, chamemos-lhe assim, pende. Ninguém de esquerda pode sentir prazer em assistir ao linchamento de um partido como o PCP. Estão a esticar uma corda que pode partir numa parte em que não se esperaria.

O PCP, contrariamente ao que seria previsível, pode sair daqui com vigor. Entre os que atrai ao puro engano – um bom exemplo são os putinistas – e os que sentem o instinto de proteger o partido, que diariamente está nas trends como alvo a abater, o fim do partido pode estar mais longe do que se tem afirmado.

Faz sentido perguntar: o que querem os anticomunistas? Acabar com o PCP. O que vão conseguir? Talvez dar-lhe um novo alento.»

 Carmo Afonso, in Público (ler tudo aqui)

05 maio, 2022

O MEU LIVRO? ESTÁ PRONTINHO E... JÁ TEM HINO

 

Viram? Ouviram? Gostam? 

Quanto ao livro, está prontinho (apenas falta o IBSN). Tudo aponta para que a apresentação pública seja na Biblioteca Municipal de Oeiras. 

E já há cerca de uma centena de pré-inscrições para assistir ao momento do lançamento. Boa?

04 maio, 2022

ANA DRAGO SOB FOGO CERRADO...


Ontem dei uma espreitadela a´O Outro Lado e encontrei o que vou encontrando por tudo o que é lado. Não, não recomendo que (re)vejam o programa de fio a pavio. Entrem neste link e ponham o cursor do tempo no quinto minuto.
Ah! outra sugestão, nem precisam ligar o som. As expressões faciais, os gestos, dão ideia do massacre sofrido por quem não alinha na "russiofobia"...

03 maio, 2022

«OLHA QUE NÃO DANIEL, OLHA QUE NÃO!»

«Meu caro Daniel Oliveira,
Desde muito jovens que somos militantes de muitas causas e que nos cruzamos nesta vida. Encontramo-nos acidentalmente com alguma frequência, trocamos impressões com enorme cordialidade sobre os mais variados assuntos, fundamentalmente sobre a vida política, que acompanhamos apaixonadamente. Sabemos do que cada um de nós vai escrevendo e dizendo em público. Temos imensos amigos comuns e creio poder dizer que somos amigos. Concordamos muitas vezes e discordamos outras tantas, mas temos em comum o facto de, como escreveu José Fanha, trazermos o mês de abril “a voar dentro do peito”.

Na passada semana ouvi uma crónica na TSF onde atacas duramente o PCP a propósito do que consideras ser a sua posição sobre a Ucrânia. É certo que atacas a hipocrisia de outros partidos (designadamente o PSD e o CDS) por criticarem o PCP, quando fizeram o que fizeram sobre o Iraque, mas a centralidade da crónica é sobre o PCP e é isso que me merece reparo e, mais que isso, discordância.

Passo por cima da adjetivação: posição “inaceitável, esdrúxula, insuportável, revoltante”, nas tuas palavras. Entendo a violência destas qualificações como uma espécie de tributo a pagar ao macartismo reinante. Qualquer referência ao PCP sem ser nesses termos seria porventura entendida como contrária ao esforço de guerra do Ocidente e sujeita a todos os vitupérios nas redes sociais e fora delas.

A posição do PCP, em teu entender, merece essa qualificação, porque o PCP teria “posto em causa que houve uma invasão”, logo, isso equivale a uma não condenação. Ora, caro Daniel, nada legitima essa conclusão. Desde logo porque, se nem todos os dirigentes do PCP qualificaram a guerra da Ucrânia usando o termo invasão, houve outros, não pouco responsáveis (e nem me refiro a mim próprio), que o usaram. Mas mais importante que o termo usado, seja invasão, guerra, conflito, ou seja o que for, o facto é que não houve um único dirigente do PCP que se tenha pronunciado que não a tenha condenado.

É curioso que os comunistas, que sempre foram acusados pela comunicação social mainstream de dizerem todos o mesmo (a cassette) agora são acusados de dizer coisas diferentes, e como não usaram todos o substantivo comum “invasão”, foram condenados a não ter condenado aquilo que inequivocamente condenaram.

Adiante na tua crónica consideras que o PCP terá baseado a sua posição em três argumentos, a saber: a) a Ucrânia não é democrática; b) a questão da segurança da Rússia; c) a discordância com o armamento da Ucrânia.

São de facto três questões que o PCP tem vindo a referir e que são questões relevantes. O problema é que o PCP não apoia a invasão. Condena-a. E portanto, é totalmente abusivo dizer que o facto de alguém (neste caso, um partido) pretender contextualizar um assunto aduzindo factos que são deliberadamente ignorados pelo maniqueísmo reinante, significa apoiar uma invasão.

Mas vejamos cada um deles: que a Ucrânia não é democrática, que quase todos os partidos estão ilegalizados (o Partido Comunista desde 2014) e que forças político-militares assumidamente nazis foram integradas formalmente nas Forças Armadas ucranianas não é questão de opinião. É factual. Mas não ignorar isso, não significa apoiar uma invasão. Afirmas e bem, que o PCP não apoiou a invasão do Iraque apesar de Saddam ser quem era. Tens razão. O PCP nunca apoiou invasões externas para mudar regimes políticos, e no caso da Ucrânia também não apoia. Haverá em Portugal quem, depois de durante muitos anos ter colocado Putin num pedestal, o derrube agora para colocar Zelenski no seu lugar. Mas o PCP, que nunca colocou Putin em nenhum pedestal, também não se sente obrigado a erguer estátuas a Zelenski para expiar pecados que nunca teve.

A segunda questão diz respeito à segurança da Rússia. Escrevia Mário Soares em 2008, perante o alargamento da NATO para leste, que isso não poderia deixar de ser sentido pela Rússia como uma ameaça. Escreveu Kissinger também já há alguns anos que a Rússia nunca poderia consentir a entrada da Ucrânia na NATO. Não ignorar este facto é apoiar uma invasão? Não é. O vendaval de críticas ao PCP e a muitas personalidades que referem o alargamento da NATO para leste como uma das causas desta guerra não tem nada a ver com qualquer apoio à invasão da Ucrânia. Deve-se ao facto de os poderes dominantes, incluindo a comunicação social mainstream, não suportarem qualquer crítica ao papel da NATO, dos EUA e da UE enquanto potências agressivas e ameaças à paz mundial.

A terceira questão é o armamento da Ucrânia. A comparação que fazes com Israel e a Palestina tem toda a razão de ser, e só dá razão ao PCP. De facto, o PCP não podia ser mais solidário com o povo palestiniano, sujeito à mais ilegal ocupação, à mais brutal repressão e a um regime de apartheid que conta, como bem sabemos, com o apoio ativo dos EUA e com a complacência da UE, mas nunca passou pela cabeça de ninguém do PCP pensar que a resposta é armar a Palestina até aos dentes para que, perante a desproporção de forças existente, resista até ao último palestiniano.

Referes o apoio ao Vietname, mas aí a comparação é deslocada. A participação dos EUA na guerra do Vietname, em nome da luta contra o comunismo, resulta da decisão de envolvimento militar norte-americano destinado a impedir que o regime corrupto instalado no sul desse país fosse derrubado pelo seu próprio povo, o que acabou por acontecer à custa de muitos milhares de mortos.

Podemos continuar esta conversa, caro Daniel, um dia destes em que nos encontremos por aí, com a cordialidade de sempre, na concordância e na discordância, mas para já o mais importante é fazer o que se puder para que esta guerra termine tão brevemente quanto possível e para que não se instale entre nós, portugueses, um clima de intolerância que pode conduzir a resultados funestos.

Na tua crónica, Daniel, dizes muitas coisas acertadas, mas no que se refere aos fundamentos da crítica ao PCP, atrevo-me a recorrer a um clássico: olha que não, olha que não!»

António Filipe, em "Opinião"/Jornal Expresso"

02 maio, 2022

ONTEM... NÃO FOI O DIA DO COLABORADOR!


 «Ontem foi o dia do trabalhador. Um pouco por todo o mundo celebram-se as conquistas dos trabalhadores, reflete-se sobre o que ainda falta fazer e renovam-se as vontades de continuar a luta.

Em Portugal a data começou a ser comemorada publicamente só após o 25 de Abril, mas já antes trabalhadores e ativistas a assinalavam sob a atenção repressiva da polícia. Quem esteve nas comemorações do 1 de maio de 1974 fala dele com emoção.

Muita coisa tem mudado para os trabalhadores portugueses e a maioria das mudanças tem sido positiva. Devem essas mudanças à sua própria luta e a quem a apoia e incentiva. A importância dos sindicatos e das representações parlamentares de esquerda não deve ser esquecida. Não se trata de reconhecimento e de gratidão. É que são precisos. Os trabalhadores correm riscos, se estas estruturas enfraquecerem.

A luta dos trabalhadores não está concluída. Nunca estará. Direitos laborais consolidados são muitas vezes postos em causa; é recordar a regressão dos tempos da troika e da governação de Passos Coelho e como algumas dessas alterações ainda se mantêm em vigor. Até 2011 os trabalhadores que fossem despedidos sem justa causa — no âmbito de um procedimento de despedimento coletivo ou de extinção de posto de trabalho — tinham direito a uma compensação equivalente a 30 dias por cada ano de trabalho prestado. Nunca mais lá se voltou. Ea troika já saiu há muito tempo.

A palavra “trabalhador” tem um peso que a muitos desagrada. Preferem dizer “colaborador”. Um colaborador é aquele que não está em luta com a sua entidade empregadora e que esquece o mantra do Código do Trabalho e das convenções coletivas de trabalho. Não pretende ser um grão de areia na engrenagem para a qual presta trabalho, digo: colabora.

Um colaborador é eficiente, é disponível e ambicioso. Não está sindicalizado. Gosta de desafios e de surpreender as hierarquias com as suas ideias inovadoras e fora da caixa. Um colaborador é aquele que dá tudo. Concilia a sua vida pessoal com a profissional de forma a não prejudicar a última. Abdica da primeira, se preciso for. É bom de ver que as empresas apreciam colaboradores.

Este fim-de-semana soube das conclusões de um estudo do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, do Instituto de Saúde Ambiental da Universidade de Lisboa e da Sociedade

Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental. Concluíram que cerca de um quarto dos trabalhadores portugueses apresentava sintomas de burnout. A pandemia não ajudou. Soube também que Portugal, num universo de 24 países analisados pela OCDE, é o terceiro pior no que diz respeito à conciliação entre vida pessoal e vida profissional.

Más notícias.

Estar sempre disponível é muito bom para as empresas, mas não tanto para os trabalhadores. Já agora: em Portugal a compensação por tanto esforço é assinalável, mas não pela positiva. Na avaliação da OCDE é o quarto país com o salário médio anual mais baixo.

Escravos por conta de outrem, escravos por conta própria, dizia o Luiz Pacheco. Agora talvez se acumulem as duas escravaturas. Somos explorados sobretudo por nós mesmos. O sonho liberal do sucesso, de uma carreira, exige a autoexploração; o esforço mental até ao limite, até arder. Luiz Pacheco não aprovaria. Exaustos ficamos reduzidos a nós mesmos, mas ao mínimo que temos e somos.

Ontem assinalou-se o dia de todos os trabalhadores, mesmo daqueles que não se reveem na luta. Há quem reivindique a semana das 35 horas de trabalho semanais e quem sonhe com a semana dos 4 dias. Ainda bem que estão na estrada, que sobem a Avenida Almirante Reis e que vão para a Alameda. O que eles conseguirem beneficiará todos.

O desejo de sucesso, a ambição de triunfar no mercado de trabalho ou no mercado em geral não são de demonizar. Faz parte da natureza humana querer vencer e esta sociedade não é meiga para os que não triunfam. Mas essa luta, que é individual e individualista, não dispensa a outra.

O dia do trabalhador não é sobre profissionais de sucesso, é sobre luta coletiva; sobre trabalhadores que se unem e que exigem melhores condições para si e para os restantes. Todos procuram ter uma vida satisfatória. Mas a satisfação é mais difícil de obter em circuito fechado. Sobretudo, alguém deveria avisar estes colaboradores que sozinhos, e por muitos que sejam estão sempre sozinhos, não têm força.

Mas deixem-nos descansar primeiro. Estudos dizem que estão exaustos.

O dia do trabalhador não é sobre profissionais de sucesso, é sobre luta coletiva; sobre trabalhadores que se unem e que exigem melhores condições para si e para os restantes»

Carmo Afonso, hoje, no "PÚBLICO"

01 maio, 2022

SE FOSSEMOS UMA DEMOCRACIA QUE SE DÁ AO RESPEITO...

 

O senhor da imagem, dirigente da Associação dos Ucranianos em Portugal, pergunta "Como é que Portugal continua a ter o PCP?". 

A resposta à pergunta do senhor é simples: porque somos uma democracia com direitos de liberdade política constitucionalmente consagrados. O PCP existe porque centenas de milhares de portugueses militam nesse partido e outras centenas de milhares votam nele. Ao contrário do que sucedia na "democracia" ucraniana, em Portugal não há partidos políticos proibidos. Muito menos aquele que deu um contributo fundamental para a existência de democracia em Portugal. 

Se fossemos uma democracia que se dá ao respeito, afirmações como a deste senhor e semelhantes, como a da embaixadora ucraniana, deveriam merecer repúdio público dos órgãos democráticos nacionais, nomeadamente do Primeiro-Ministro e do Presidente da República. Os titulares desses órgãos deveriam declarar em público ser inaceitável que associações de cidadãos estrangeiros ou representes diplomáticos procurem limitar as liberdades democráticas portuguesas. Como não o fazem, deixam claro que Portugal é uma democracia que se dá pouco ao respeito. 

Este é o milésimo alerta que a existência de uma atitude condenável de uma das partes não transforma a outra numa representante virtuosa de bons valores. Sobre a Ucrânia, basta-nos condenar a invasão russa (tal como fizemos com o Iraque) sem no entanto criar heróis que não o devem ser. Isto é, podemos ser solidários com o povo ucraniano contra a invasão sem nos colocarmos ao lado das autoridades ucranianas e dos seus representantes. Tal como foi possível colocarmo-nos ao lado do povo iraquiano invadido sem estar ao lado de Saddam. O amarelo e o azul não são símbolos de liberdade, assim como a bandeira do Iraque não o era. 

Os tempos são perigosos. E é neles que se definem os verdadeiros democratas. De um lado, estão os que consideram intolerável a campanha que está a ser movida contra um partido central da democracia portuguesa e se colocam ao seu lado, mesmo que nele não militem ou não sejam seus votantes. Do outro, os que participam ativamente dessa campanha ou se refugiam num silêncio conivente com o objetivo de colher ganhos políticos. Os últimos não respeitam o património democrático que lhes foi legado.

In "Ladrões de Bicicletas"