29 abril, 2024

"O MEU 25 DE ABRIL DE 1974" - II

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De seguida, como o alerta incidia sobre a possível reação da Polícia de Choque foi para lá que me dirigi. Chegado lá, apenas meia dúzia de populares entre eles alguns vizinhos. Um veio ter comigo “Olá Rogério, estamos aqui há mais ou menos duas horas e nem um movimento. Acho que não está lá ninguém lá dentro. Posso entrar?” 

E sem esperar resposta entrou-me no carro e desafiou-me “Queres ir até à sede da Junta de Freguesia? É lá que fica a sede da ANP...” e respondendo com um “bora lá”,  lá fomos. Passámos frente à Câmara onde estava um pequeno ajuntamento. A multidão, essa, concentrara-se na Rua Marquês de Pombal. Estacionei por ali e chegámos no exato momento em que a fechadura fora forçada.

Deu-se então a ocupação. Foi esse o momento histórico do 25 de Abril em Oeiras e eu... Eu vivi-o, participando vivamente. O resto da tarde e depois noite fora já não é novidade...


Rogério Pereira, 29 de Abril de 2024




A ANP - Ação Nacional Popular era a organização política  que foi criada durante o regime Marcelista, cuja sede em Oeiras foi ocupada por muita gente conhecida (e entre a qual eu me encontrava). Logo no dia seguinte, a 26 de Abril, passou a ser a sede do MDP de Oeiras.

A ANP foi dissolvida pelo Decreto-Lei n.º 172/74, de 25 de abril, tendo a sua liquidação sido regulada pelo Decreto n.º 283/74, de 26 de junho


Um mês depois, em 26 de Maio, o MDP de Oeiras organiza e promove manifestação do movimento de munícipes como forma de reivindicar a ratificação da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Oeiras. Na imagem, José Tengarrinha, falando aos manifestantes, 

e eu no meio deles, em frente ao edifício da Câmara. Esta viva manifestação consta nos arquivos da RTP que pode ser visitado no seguinte endereço.


https://arquivos.rtp.pt/conteudos/manifestacao-em-oeiras/

28 abril, 2024

"O MEU 25 DE ABRIL DE 1974" - I

Há muito que não me levantara tão cedo. Tinha combinado deixar o carro à porta da oficina para revisão e a chave na caixa do correio, com a indicação da matricula. Isso feito, fui apanhar o comboio na estação de Oeiras com destino a Alcântara onde tomaria a camioneta da carreira de Lisboa- Setúbal e, a meio desse trajeto, tomaria a que me levaria ao destino final as instalações da Siderurgia Nacional, em Paio Pires. No comboio, entre gente sonolenta, de nada de anormal me apercebera. Mal sabia eu que, poucas semanas depois dessa alegria de se ter aberto a uma carreira profissional que fez de mim o que sou agora, outra alegria estava guardada e esta se estenderia ao povo e que fez dele o que ele é agora. Em Alcântara, depois da passagem subterrânea, no quiosque que por ali havia, parei para beber o meu café da manhã entre um pequeno aglomerado de gente operária que comentava, de modo agitado, que de onde tinham vindo terão visto carros blindados e muitos, muitos soldados. Desvalorizei, associando tal conversa às movimentações da NATO, cuja esquadra ainda há pouco tinha, da janela do comboio, avistado não longe do Bugio. 


Foi no percurso para Paio Pires que desvaneci aquela primeira impressão. Nas camionetas, numa e noutra, eram vários os passageiros que portadores de pequenos rádios portáteis iam seguindo as notícias: “Houve um comunicado a alertar para não sairmos de casa!”; “Essa notícia foi dada por um tal posto de comando das forças armadas; “Algo de importante se está a passar, a rádio só passa marchas militares.”; “Isto é golpe, mas de que lado?”


Já nas instalações da fábrica, no pavilhão central, não me dirigi ao meu gabinete mas sim à sala ao lado onde já se tinha iniciado uma entusiástica e ruidosa conversa. E entre um ambiente de  tertúlia e o estilo de comício, as notícias iam surgindo acompanhadas de compreensível especulação de pronto desmentidas por quem citava as fontes ou pondo o rádio em som bem elevado sempre que havia novo comunicado do Movimento das Forças Armadas fazendo calar os comentários mais pessimistas e os que não escondiam o desejo de que tudo corresse mal.


Era eufórico o clima e era quase generalizada a alegria. Alguém fez o ponto-de-situação: O Terreiro de Paço está dominado; os Ministros em fuga “pela porta do cavalo”; a fragata da armada foi neutralizada; o Quartel do Carmo estava cercado pelo MFA e pelo povo apinhado”... A sala onde  estávamos seria espaçosa se não se tivesse juntado tanta gente. Engenheiros, desenhadores, preparadores de trabalho e um ou outro operário todos falavam, uns com os outros em tom tão alto que só se baixava quando acontecia ser lido mais um comunicado.


Ia a manhã por aí fora, quando na sala entra de rompante o encarregado da Oficina de Moldes que, ainda ofegante pela correria, fez apelo desesperado: “É preciso que alguém vá à CUF do Barreiro, outros à Mundet, no Seixal. Há receio que a GNR e a Policia de Choque façam trapalhada!” 


Fez-se silêncio absoluto, mas de pronto foram-se organizando e saindo. Ficaram poucos e entre eles eu. Senti um toque nas costas e virei-me. Dei com uma cara conhecida que me interroga “Tem carro? Se não tem, dou-lhe boleia pois vou para Cascais e sei que mora lá para Oeiras”.

E lá fomos, conversando sobre o sonho que se estava tornando em realidade. Deixou-me à porta da oficina onde a tempo, praticamente em cima da hora do almoço, levantei o carro não sem deixar de comentar, a quem me atendeu, o que estava acontecendo deixando-lhe o espanto estampado no rosto. 

Continua

Siderurgia Nacional - Nave de vazamento de aço líquido.

27 abril, 2024

"O MEU DIA 25 DE ABRIL" FOI TEXTO COMEÇADO... MAS AINDA NÃO ACABADO

Tinha planeado ser este o dia de deixar escrito "onde estava no 25 de Abril. Mas tal faria depois de assistir, junto ao Memorial da Libertação dos Presos de Caxias, da celebração da libertação que a data de 27 de Abril assinala. O memorial, que se vê na foto, é uma criação estilizada de gosto discutível e, por isso, concentro mais a atenção nos discursos de dirigentes da URAP - União dos Resistentes Anti-fascistas Portugueses e, como não consigo estar quieto, percorri a assistência distribuindo sorrisos, abraços e beijinhos...


Chegado a casa, peguei então no texto e a escrita foi surgindo escorreita e até inspirada. Deu algum trabalho associar à memória tida alguns dados e fotos. Estava eu a investigar quando, o televisor à minha frente, iniciou algo que pelas vozes bem conhecidas, de Jerónimo de Sousa e Manuel Alegre, me fez concentrar a atenção... do visto e ouvido fica um extrato... 


Voltei ao texto, mas não o acabei. O que acabara de ver teve o condão para me remeter para outras memórias, perturbando a minha concentração. E o tempo, que é um recurso escasso, fez com que jantasse à pressa. Tinha que estar às 21h30 no Teatro Lurdes Norberto, pois não podia perder a última exibição da peça "MEMÓRIAS DE UM TEMPO PORTUGUÊS" da autoria do meu amigo e camarada Domingos Lobo (lembram-se dele?). Em palco e na plateia, gente amiga... e que emoção, e que desempenho, e que encenação.

Saí dali com a alma cheia!



24 abril, 2024

ABRIL, CELEBRADO E NÃO FESTEJADO



Abril tem vindo a reunir quem o celebra e não se limita a festejar... isto porque a memória o impõe.  As imagens disso dá conta. 
Se eu cantei? Como não cantar?

23 abril, 2024

HOJE, DIA MUNDIAL DO LIVRO ... FICA O MEU EDIFÍCIO

Reeditado

Com muitos livros se constroem edifícios. Eu construí o meu...

 


As minhas primeiras pedras...


... os meus alicerces... 

22 abril, 2024

O´NEILL E EU - DOIS POEMAS SOBRE O MEDO

Primeiro Ele, o O´Neill (sugerido pela Lídia Borges)  


Agora Eu, sugerido pela minha própria memória:
Rir? Sorrir?
Sorrir de um medo?
Desse medo
que resulta
do nosso próprio enredo?
Em criança, nesse tempo
o medo fazia parte do crescimento
Vencíamos o medo, íamos crescendo 
Hoje, ao certo, não sei definir o medo
Só sei que gostaria
que o medo pudesse ser
qualquer coisa de tangível,
de apalpar, de cheirar e de se ver 
E se o fosse, que fosse redondo,
que ao rolar o fizesse com estrondo
E que se tivesse cheiro,
que fosse o do sebo salazarento
E que ao tacto se sentisse a impressão
do fogo vivo das fogueiras da inquisição 
Depois, o medo podia ser apontado
e, sei lá, esmagado ou até cortado
Ver-se-ia que o medo
Não tendo nada dentro
Se libertaria o Mundo
deste medo tão profundo
Rogério Pereira
 


21 abril, 2024

ENTRA-ME A PRIMAVERA PELA JANELA...

Obrigado, Luís

Entra-me a Primavera
Pela janela
E planta-me no coração
As flores que trás na sua boca
E diz-me com emoção
Com voz um tanto rouca

De um canto com sons de Abril 

Faz de mim teu santuário
E faz com em tua casa
Perdure 
Na tua memória, o meu perfume

20 abril, 2024

BALSEMÃO, O DESESPERADO

A cunha presidencial de 4 milhões de euros por causa da gémeas nada é quando comparada com a cunha que Balsemão desesperado anda a pedir a Montenegro que meta ao Macedo da Caixa Geral de Depósitos para a compra da dívida de 141,8 milhões do grupo Impresa que inclui a SIC e o semanário Expresso. O jornal Tal&Qual coloca na edição desta semana o título interior em letras gordas com o Balsemão a dizer Salva-me, Luís. Em Junho o velho patrão do Imperio Impresa tem de pagar 50 milhões e não tem um euro a mais para fazer pagamentos, no início do próximo ano terá de pagar mais de 40 milhões e depois o resto. Todos os bancos foram contactados e ninguém quer sequer escrever uma carta de conforto quanto mais emprestar. O grupo não vai pagar a primeira tranche da sua dívida atual, pelo que entrará logo em falência.

Montenegro disse há tempos que o seu partido necessita de possuir meios de comunicação social próprios como televisão e jornal ou jornais. A Impresa é favorável ao PSD, mas não pode exagerar na propaganda política e a compra por parte da CGD com capital e depósitos dos contribuintes daria um escândalo que levaria logo o atual PM a pedir a demissão.

Balsemão, o Desesperado.

Ri-te! Ri-te! Se acontecer... até choras!


19 abril, 2024

"POR ABRIL, PELA DEMOCRACIA, VENHAM MAIS CINQUENTA (E FORAM QUINHENTOS)


 O jantar, comemorando Abril, ocorreu hoje na Cantina Velha da Cidade Universitária. Tinha prometido contar as mulheres mas limito-me a assinalar que estavam em absoluta maioria. Uma reconheceu-me como tendo feito um trabalho digno na Câmara Municipal de Almada. Outra, reconhecia eu enquanto membro da RIA em 1973. Cruzei-me com o Ricardo e imputei-lhe a responsabilidade de eu estar ali. Se se cantou Abril? Como não cantar? A abrir as intervenções ouvimos atentamente Carmo Afonso (que pena não ter gravado) que disse por palavras suas o que me vai na alma: isto, a continuar assim, adeus regime de Abril...



18 abril, 2024

COM ABRIL NA ALMA, HOJE FUI AO TEATRO

Ontem, tinha prometido a mim próprio que iria. E fui. Cheguei um pouco atrasado, mas deu para perceber que nas escolas havia um trabalho aturado e isso era visível naquele palco. Fica o testemunho


Enquanto via e me encantava não deixava de pensar o que saberiam aquelas crianças do que fora a revolução de Abril para a escola e para tudo o resto.... e o que lhes teriam contado seus avós de como a vida lhes terá melhorado com a conquista de novos direitos...




17 abril, 2024

COM ABRIL NA ALMA, AMANHÃ VOU AO TEATRO...

Na passada segunda-feira, dia 15, montámos no hall do auditório uma exposição que, de alguns anos a esta parte, tem levado a memória de Abril às escolas de Oeiras, lembram-se?
Este ano optámos por participar na iniciativa OEIRAS EDUCA e, assim, com esforço optimizado fazemos até que muito mais turmas leiam o belo texto do escritor Mário de Carvalho e fiquem a saber, o que nesse mesmo ano de 1974, graças à revolução, os idosos passaram a ser gente... A iniciativa decorre em toda a semana e, amanhã, lá estarei. Escolhi esse dia pois é aquele em que estará um mar de jovens da Escola onde a minha peça irá, em Junho, ser estreada...

Estive uns minutinhos na plateia, só para ter uma ideia.
Amanhã voltarei e por lá ficarei!

16 abril, 2024

LIBERDADE TEM NOME DE MULHER!


 E AGORA... ABRIL

Muitas vezes julguei não poder perdoar
os ultrajes sem fim causados às gentes que somos,
um país como casa abandonada e só,
um modo vil de pisar, doutrinar, perseguir, injustiçar.
Inteligência sem verso nem reverso
e poderes sem limites a governar.

E diz o inteligente que acabaram as canções.

Mas estas vieram e ficaram
e nos campos, nas praças e avenidas
floresceu, primeiro a esperança
e depois os cravos e, nos rostos, os sorrisos.

Nas asas de uma gaivota mil sonhos a voar.
Já não há canções p’ra calar.

Voltaram diferentes, embora iguais?!
Mas não no medo, na treva e no silêncio,
hoje, as gentes desiguais.

E, então - Abril Sempre.
Voltaram iguais, embora
evidentes de mais!

Lídia Borges, in Searas de Versos

14 abril, 2024

TALVEZ DESTA OUTRA MANEIRA ALGUÉM ENTENDA... E SE MEXA


Não façam nada, depois queixem-se:
 "O estado do planeta é realmente terrível, temos hoje amplas provas científicas de que estamos numa emergência planetária, temos uma crise climática global, mas também temos uma crise ecológica global, e a crise ecológica mina a resiliência de todo o planeta, o que significa que quando continuamos a emitir gases com efeito de estufa, a queimar combustíveis fósseis e a degradar ecossistemas, estamos a chegar muito perto de pontos de rutura que levariam a mudanças irreversíveis que comprometeriam todas as gerações futuras num planeta à deriva irreversivelmente em direção a um estado cada vez menos apto para apoiar os meios de subsistência humanos.»

 In "Sustentabilidade é Acção"

"Não está claro, neste momento, o quanto a última mensagem do governo Biden afetará os cálculos dessa posição, mas os meios de comunicação social estão relatando que funcionários da Casa Branca estão preocupados com a possibilidade de Israel estar a preparar-se para fazer algo extremamente imprudente, que pode levar os EUA para uma guerra que preferem evitar."

In "Estátua de Sal" 

 

13 abril, 2024

A VERDADEIRA OCIOSIDADE


Diz-se que a ociosidade se liga a quem nada faz, se liga à preguiça, se liga a quem não trabalha ou, se trabalha, não faz nada de útil. De facto liga-se a tudo isso, mas a verdadeira ociosidade, não contradizendo o atrás dito, é mais que isso. A verdadeira ociosidade não é um momento, é uma opção, uma entrega. Mas é uma entrega provocada. Provocada por uma sociedade que afasta as pessoas da cultura e as empurra para a distração, que afasta as pessoas da solidariedade e as empurra para a caridade, que afasta as pessoas da participação cívica e as empurra para o individualismo.

Em larga medida, somos uma sociedade de ociosos...

12 abril, 2024

ASSIM VÃO OS TEMPOS QUE VAMOS VIVENDO


Este orçamento
dá a toada
dos tempos 
que vamos vivendo
e dos principais personagens
que lhe darão andamento!
(não ria, é mesmo para chorar...)

 

10 abril, 2024

ARTE... COM OVO A CAVALO


Quando a arte circense 
se junta à arte gastronómica... 
a cena é extraordinariamente 
brilhante, até na vertente cómica


 

08 abril, 2024

UM CORO COMUNITÁRIO... FUI AO ENSAIO

 


Tive a notícia e não me fiz rogado: fui ao ensaio. Mas não fiquei por lá. Está numa fase inicial e hei-de lá voltar. Ao que ia, resolvi num instante. Saí de lá com um contacto e não tarda irei usá-lo. A que me refiro? Que importa o detalhe? O importante é que estou pronto a usar o canto... 
Depois, conto!

07 abril, 2024

FUI CONVIDADO! E QUANDO CONVIDADO, NUNCA FALTO!


Em sala simpática, cheia de sorrisos, à sua chegada abraço-mo-nos. 
Dissemos coisas um ao outro, mas sem surpresa dela por me ver ali, pois tinha-me convidado e eu tinha aceite o convite. 
Mais que seu admirador, sou cúmplice da sua poesia. 
______________

"50 anos depois, dedico este livro aos Capitães de Abril e a todas as pessoas que amam a liberdade." - 
 
Todos sabiam de cor uma canção.
Todos tinham um poema na memória,
ou lembravam uma prece antiga.
Todos tinham no peito um rio
sem margens a alagar o sonho.
Em cada esquina um amigo, cantara o Zeca.
Verdade irrefutável, premonição,
senha indicada à boca da vertigem,
um ímpeto no espanto há muito pressentido.


Graça Pires

06 abril, 2024

SAQUE CONFIRMADO: PORTUGAL PERDEU 14 HOSPITAIS PÚBLICOS E GANHOU 29 PRIVADOS


"Em 2022 existiam 243 hospitais em Portugal, dos quais 112 públicos e 131 privados. O crescimento dos privados começou após a chegada do PS ao poder."

 Ler tudo em AbrilAbril 


05 abril, 2024

DONA ESMERALDA E A VIZINHA DO 4º ANDAR, A CONVERSAR (ONDE É QUE ESTAVAS NO 25 DE ABRIL?)

 


Vizinha do 4º andar (em tom curioso) - Mas está com medo que nos oiçam? Porquê esse medo? O 25 de Abril fez-se para nos dar a liberdade, para podermos falar à vontade...  
Dona Esmeralda (com voz enraivecida) - Cara vizinha, fie-se na virgem e não corra e vai ver o que lhe acontece!

Rogérito (gritando da janela) - Caras vizinhas, vamos lá a dizer onde estavam as duas no 25 de Abril... perguntem, sem medo, lá no emprego... lá na mercearia do Ti João... lá no autocarro que vai para a estação... eu, este que estão aqui a ver, vou sobre esse meu dia escrever. Bora lá! Se o medo se instala... voltamos ao antigamente! 

04 abril, 2024

DUAS BOAS NOTÍCIAS NUM SO DIA? É OBRA!


A primeira notícia chegou por email que, acrescentando alguns detalhes, assim dizia:
"Após a reunião da semana passada e parecer do Sr. Vereador, o Município irá avançar com a aquisição de sessões do espetáculo “Quando a cabeça não tem Juízo, o futuro é que paga”. Pretendemos disponibilizar o espetáculo no âmbito do Programa Oeiras Educa+"

A segunda, veio pelo telélé através de uma chamada de um militar de Abril, que assim me disse:

"Rogério mande-me o seu livro em formato DOC, ainda não são "favas contadas" mas a aprovação da 2ª edição está quase garantida!" 

Eu que já me sentia orgulhoso de ter merecido a atenção a quem me escreveu um excelente novo prefácio, fiquei como possam imaginar que tivesse ficado...
 

03 abril, 2024

QUEM TEM VERGONHA DA SUA HISTÓRIA? (QUEM ALDRABA PARA PEGAR DE ESTACA?)

Pedro Tadeu

"Estive a ler um documento partidário que muito me impressionou, um programa político para a governação de Portugal que tem esta máxima: “Não há verdadeira democracia sem socialismo, nem socialismo autêntico sem democracia.”

Concordo.

O texto critica o capitalismo, embora assinale a sua capacidade de “expandir a produção a um ritmo extraordinário” e de ir “criando as condições de satisfação das necessidades humanas numa escala nunca atingida”. Porém, o mesmo texto não se esquece de que “o capitalismo multiplicou por toda a parte as desigualdades, a dependência económica e política, a alienação e a desagregação sociais. E ameaça o futuro da Humanidade através do rápido esgotamento dos recursos naturais, da destruição da natureza e da poluição do ambiente”. 

Concordo.

Sobre a distribuição da riqueza do país, esse documento historia: “Mentiu-se ao povo, dizendo que a economia nacional não comportava salários mais altos. Mas, de facto, manteve-se uma distribuição funcional do rendimento que atribuía ao trabalho menos de metade do valor do produto e, em alguns ramos de atividade, menos de um terço. Este estado de coisas traduziu-se numa escandalosa desigualdade económica.” 

Concordo.

Afirmando-se a favor da paz, este documento “admite a adesão à NATO apenas enquanto não estiver institucionalizado um novo sistema internacional e multilateral de segurança. Entretanto, a contribuição portuguesa financeira e humana deve diminuir progressivamente”. 

Concordo.

Este partido defende que “os trabalhadores passem a participar concretamente, desde já, na gestão das empresas e no capital criado. Essa cogestão implica que os representantes dos trabalhadores tenham assento e voto deliberativo nos órgãos de gestão das empresas, por forma progressiva, com vista à aproximação do ideal da autogestão, próprio da realização integral do socialismo; e implica também que a propriedade de uma parte dos reinvestimentos da empresa advenha aos trabalhadores, sendo-lhes distribuídos os títulos representativos desses aumentos de capital”. 

À falta de melhor, concordo.

Este partido defende que “o princípio da propriedade privada, sem limitações substanciais, gera situações criadoras de profundas injustiças e de dominação do homem pelo homem, e tende a usurpar poderes que devem pertencer ao Estado”. 

Concordo.

Está também contra “a passagem dos meios de produção para a propriedade exclusiva do Estado” porque “o poder monopolístico e o poder da burocracia centralizadora constituem entraves à liberdade e à iniciativa dos cidadãos”. 

Como princípio geral, concordo.

Em várias áreas estratégias da economia, como na energia, este partido defende que o setor, “deverá ser fortemente integrado, vertical e horizontalmente, em grandes empresas nacionalizadas ou com forte predomínio do Estado”. 

Concordo.

Eis, portanto, um partido que defende a construção do socialismo para Portugal, que é contra o capitalismo desregulado explorador da Humanidade e ameaçador para a vida no planeta, que exige uma distribuição justa da riqueza criada, que quer, a prazo, sair da NATO, que defende a participação dos trabalhadores na gestão das empresas, que combate monopólios privados e burocracias estatais e que exige que o Estado seja dono de vários setores estratégicos da economia. 

Concordo com tudo - afinal, não há partes que são quase comunismo?... 

Acontece, porém, que este programa partidário está disponível no site do PSD, o partido dominante no novo Governo que tomou ontem posse, liderado por Luís Montenegro. 

O PSD de 2024 propõe-se combater qualquer ideia socialista para Portugal, pretende dar mais liberdade ao capitalismo, acredita na falácia de que a um maior crescimento da economia corresponderá uma maior distribuição de riqueza, quer reforçar o orçamento militar para a NATO e quer tirar o Estado da economia.

O partido de Luís Montenegro é o mesmo partido deste programa político que Sá Carneiro, Francisco Balsemão e Magalhães Mota subscreveram em 1974, no então recém-fundado PPD, o antecessor do PSD. 

Como lidam os, nominalmente, sociais-democratas com tamanha contradição com o passado? Será que alguém deste Governo leu esse programa do PPD? Será que alguém, no passado, andou a enganar alguém? Será que alguém, no presente, anda a enganar alguém? Será a História ou é o presente que os envergonha?"









01 abril, 2024

EM DIA DAS MENTIRAS, MÁRIO DE CARVALHO BATE O RECORD, NUM MENTIREDO QUE ATÉ METE MEDO

BIOGRAFIA Do MENTIROSO

Mário de Carvalho nasceu em Lisboa em 1944. Licenciou-se em Direito e viu o serviço militar interrompido pela prisão. Desde muito cedo ligado aos meios da resistência contra o salazarismo, foi condenado a dois anos de cadeia, tendo de se exilar após cumprir a maior parte da pena. Depois da Revolução dos Cravos, em que se envolveu intensamente, exerceu advocacia em Lisboa. O seu primeiro livro, Contos da Sétima Esfera, causou surpresa pelo inesperado da abordagem ficcional e pela peculiar atmosfera, entre o maravilhoso e o fantástico. (ler tudo aqui)

"Eu nunca fui obrigado a fazer a saudação fascista aos «meus superiores». Eu nunca andei fardado com um uniforme verde e amarelo de S de Salazar à cintura. Eu nunca marchei, em ordem unida, aos sábados, com outros miúdos, no meio de cânticos e brados militares. Eu nunca vi os colegas mais velhos serem levados para a «mílícia», para fazerem manejo de arma com a Mauser. Eu nunca fui arregimentado, dias e dias, para gigantescos festivais de ginástica no Estádio do Jamor. Eu nunca assisti ao histerismo generalizado em torno do «Senhor Presidente do Conselho», nem ao servilismo sabujo para com o «venerando Chefe do Estado». Eu nunca fui sujeito ao culto do «Chefe», «chefe de turma», «chefe de quina», «chefe dos contínuos», «chefe da esquadra», «chefe do Estado». Eu nunca fui obrigado a ouvir discursos sobre «Deus, Pátria e Família». 

Eu nunca ouvi gritar: «quem manda? Salazar, Salazar, Salazar». Eu nunca tive manuais escolares que ironizassem com «os pretos» e com «as raças inferiores». Eu nunca me apercebi do «dia da Raça». Eu nunca ouvi louvar a acção dos «Viriatos» na Guerra de Espanha. Eu nunca fui obrigado a ler textos escolares que convidassem à resignação, à pobreza e ao conformismo; Eu nunca fui pressionado para me converter ao catolicismo e me «baptizar». 

Eu nunca fui em grupos levar géneros a pobres, politicamente seleccionados, porque era mesmo assim. Eu nunca assisti á miséria fétida dos hospitais dos indigentes. Eu nunca vi os meus pais inquietados e em susto. Eu nunca tive que esconder livros e papéis em casa de vizinhos ou amigos. Eu nunca assisti à apreensão dos livros do meu pai. Eu nunca soube de uma cadeia escura chamada o Aljube em que os presos eram sepultados vivos em «curros». Eu nunca convivi com alguém que tivesse penado no Tarrafal. Eu nunca soube de gente pobre espancada, vilipendiada e perseguida e nunca vi gente simples do campo a ser humilhada e insultada. 

Eu nunca vi o meu pai preso e nunca fui impedido de o visitar durante dias a fio enquanto ele estava «no sono». Eu nunca fui interpelado e ameaçado por guardas quando olhava, de fora, para as grades da cadeia. Eu nunca fui capturado no castelo de S. Jorge por um legionário, por estar a falar inglês sem ser «intréprete oficial». Eu nunca fui conduzido à força a uma cave, no mesmo castelo, em que havia fardas verdes e cães pastores alemães. Eu nunca vi homens e mulheres a sofrer na cadeia da vila por não quererem trabalhar de sol a sol. Eu nunca soube de alentejanos presos, às ranchadas, por se encontrarem a cantar na rua. Eu nunca assisti a umas eleições falsificadas, nunca vi uma manifestação espontânea ser reprimida por cavalaria à sabrada; eu nunca senti os tiros a chicotearem pelas paredes de Lisboa, em Alfama, durante o Primeiro de Maio. 

Eu nunca assisti a um comício interrompido, um colóquio desconvocado, uma sessão de cinema proibida. Eu nunca presenciei a invasão dum cineclube de jovens com roubo de ficheiros, gente ameaçada, cartazes arrancados. Eu nunca soube do assalto à Sociedade Portuguesa de Escritores, da prisão dos seus dirigentes. Eu nunca soube da lei do silêncio e da damnatio memoriae que impendia sobre os mais prestigiados intelectuais do meu país. Eu nunca fui confrontado quotidianamente com propaganda do estado corporativo e nunca tive de sofrer as campanhas de mentalização de locutores, escribas e comentadores da Rádio e da Televisão. Eu nunca me dei conta de que houvesse censura à imprensa e livros proibidos. Eu nunca ouvi dizer que tinha havido gente assassinada nas ruas, nos caminhos e nas cadeias. 

Eu nunca baixei a voz num café, para falar com o companheiro do lado. Eu nunca tive de me preocupar com aquele homem encostado ali à esquina. Eu nunca sofri nenhuma carga policial por reclamar «autonomia» universitária. Eu nunca vi amigos e colegas de cabeça aberta pelas coronhas policiais. Eu nunca fui levado pela polícia, num autocarro, para o Governo Civil de Lisboa por indicação de um reitor celerado. Eu nunca vi o meu pai ser julgado por um tribunal de três juízes carrascos por fazer parte do «organismo das cooperativas», do PCP, com alguns comerciantes da Baixa, contabilistas, vendedores e outros tenebrosos subversivos. Eu nunca fui sistematicamente seguido por brigadas que utilizavam um certo Volkswagen verde. Eu nunca tive o meu telefone vigiado. Eu nunca fui impedido de ler o que me apetecia, falar quando me ocorria, ver os filmes e as peças de teatro que queria. Eu nunca fui proibido de viajar para o estrangeiro. Eu nunca fui expressamente bloqueado em concursos de acesso à função pública. 

Eu nunca vi a minha vida devassada, nem a minha correspondência apreendida. Eu nunca fui precedido pela informação de que não «oferecia garantias de colaborar na realização dos fins superiores do Estado». Eu nunca fui objecto de comunicações «a bem da nação». Eu nunca fui preso. Eu nunca tive o serviço militar ilegalmente interrompido por uma polícia civil. Eu nunca fui julgado e condenado a dois anos de cadeia por actividades que seriam perfeitamente quotidianas e normais noutro país qualquer; Eu nunca estive onze dias e onze noites, alternados, impedido de dormir, e a ser quotidianamente insultado e ameaçado. Eu nunca tive alucinações, nunca tombei de cansaço. Eu nunca conheci as prisões de Caxias e de Peniche. Eu nunca me dei conta, aí, de alguém que tivesse sido perseguido, espancado e privado do sono. Eu nunca estive destinado à Companhia Disciplinar de Penamacor. Eu nunca tive de fugir clandestinamente do país. Eu nunca vivi num regime de partido único. 

Eu nunca tive a infelicidade de conhecer o fascismo."

 Denegação por Anáfora Merencória., titulo do texto de Mário de Carvalho