30 abril, 2013

O Pingo Doce e o que os comentadores andam a dizer irão fazer esquecer o que o Conselho de Ministros se prepara para dar a conhecer?


São pequenas reflexões em torno de coisas diferentes mas com uma linha comum, fazer com que os efeitos das noticias se anulem e tudo se mantenha dentro do paradigma traçado: o do quadrado:
- Os supermercados Pingo Doce vão lançar uma nova campanha de descontos no 1.º de Maio (...) a empresa "já anunciou às chefias a nova acção de descontos e recrutou um número de funcionários maior do que o normal para trabalhar amanhã". 
- Um pluralismo simulado, para nos manter dentro do quadrado: Share Morais Sarmento: 13,1% Share Sócrates: 11,2% Share Marcelo: 31,8% Share Marques Mendes: 22,5%  
- A reunião extraordinária do Conselho de Ministros de hoje foi convocada expressamente para a aprovação do Documento de Estratégia Orçamental 2013-2017 (...) O Documento de Estratégia Orçamental deverá prever cortes permanentes na despesa, estimados inicialmente em 4 mil milhões de euros (...)
Contudo, vai ser difícil evitar que amanhã as ruas não se encham.

29 abril, 2013

O que o Congresso do PS esquece, o que os comentadores não falam... mas que pode muito bem acontecer...


Há quem ridicularize as minhas vizinhas e julgue a dona Esmeralda uma figura quadrada. Não  é nada. A dona Esmeralda pertence àquela (crescente) classe de gente que, não conseguindo acompanhar a pedalada de um João Ferreira do Amaral, consegue entender o que lhe faço compreender. Expliquei-lhe o que disse o economista, e alertei-a para o facto do Congresso do PS se ter desenvolvido dentro de um paradigma que se pode alterar de um momento para o outro. Expliquei-lhe a parábola do "Cisne Negro" para lhe dizer que podemos ser empurrados para fora do euro... E não é que enquanto lhe explicava tudo isso, o Económico publicava isto?:
 «O presidente do instituo alemão de Assuntos Económicos, Hans-Werner Sinn, defendeu hoje que os países afectados pela crise devem "sair temporariamente" para assim fortalecerem o conjunto da Zona Euro.(...) e os países (afectados) podem recuperar a competitividade e "poderão regressar à Zona Euro sob novas condições"- Noticia de hoje, no Económico

28 abril, 2013

A dona Esmeralda e a vizinha do 4º andar, a conversar - (16)



Vizinha do 4º andar (a suspirar) - Ai que bonito... que sala... só bandeiras portuguesas...
Dona Esmeralda (nada impressionada) - As do partido foram metidas nas gavetas?
Vizinha do 4º andar (sem a escutar) - ... e aquela música tão linda, tão heróica... é o novo hino do partido?
Dona Esmeralda (solta uma gargalhada) - Aquilo não é nada um hino, é a banda sonora da guerra da secessão. Norte e Sul. Até já deu na televisão... acho que foi o que de mais arrojado se ouviu...
Vizinha do 4º andar (sem parar) - ... ouviu as propostas?... as alternativas? Tudo ali, limpinho com as contas todas feitas... tantos mil milhões dali, outros tantos dacolá, mais uns daqui... o rumo está encontrado.
Dona Esmeralda (nada admirada) - Não falaram é rever o mal que andaram a fazer...e, pelo sim, pelo não, não se dê o caso de estar tudo errado Seguro lá vai dizendo "O rigor, os sacrifícios e a contenção orçamental não desaparecerão"... e como não corta com a troika...
Vizinha do 4º andar (com voz de cochichar) - O PS é que nos vai salvar... ele mesmo que tenha a maioria, vai-se coligar...

Rogérito (interrompendo, nesse preciso momento) - A Estrela até já diz que o "Portas é o político mais poderoso do país"

Eu sei, eu sei... mais tarde... agora, deixem-me estar (1)

27 abril, 2013

O Congresso do PS, o post a ver se ele não esquece e a eventualidade (improvável) de aparecer o "Cisne Negro"

imagem editada por "Oeiras Local"
A memória é selectiva e há quem se limite a recordar, do todo, a parte...

Decorre o congresso do PS e não me quero antecipar em comentários apressados. Mas não é precipitado perceber que há uma visão redutora quando se ouve, da data, pouco mais do que festivas, mas justificadas, referências "à restauração das liberdades" como únicos valores de Abril.  Essa visão limitada que se passa não só não é inocente como é ambígua.  Vejamos, no final, quais os valores de Abril que sobrevivem depois de Santa Maria da Feira. Uma coisa já foi adiantada: será Seguro, e não o Congresso, a responder à tal carta. Mas aguardemos. Aguardemos por um Cisne Negro... 
"O meu cisne negro não é um pássaro, mas um evento com três características: 1ª) altamente inesperado; 2ª) tem grande impacto; e 3ª) depois de acontecer, procuramos dar uma explicação para fazê-lo parecer o menos aleatório e o mais previsível.
(...)
Ninguém poderá saber quando um cisne negro irá surgir, mas o fundamental é a pessoa não levar tão a sério o seu planejamento de vida. As coisas podem mudar quando a pessoa menos espera. O ´stress test´, um dos modelos de gerenciamento de risco, avalia o impacto já ocorrido e não o impacto a ocorrer. As variáveis utilizadas são tiradas do passado."
Newton Freitas, in "A Teoria do Cisne Negro"

26 abril, 2013

Lídia, quero que saiba: seu livro faz parte do "meu edifício". É uma peça da minha janela. Vejo o mundo, através dela...


Com muitos livros se constroem edifícios. Eu construí o meu e um dia destes mostrei os meus alicerces... Faço questão em ir, sempre que me ocorre ou quero assumir, mostrar outros livros que me dão paredes, umbrais de portas, telhado, vidraças e outras peças de tantas e tantas que me dão estrutura. 

Quando soube que a poesia da Lídia tinha sido premiada, fui a correr dizer-lhe que seu livro faz parte desse meu edifício, que é uma peça da minha janela e que vejo o mundo através dela. 

Dei-lhe os parabéns. E ei-la, mulher inteira, desvendado-nos o nome e o rosto, disposta a não continuar a esconder-se atrás da sua obra. Parabéns Lídia. 

"Lidos os jornais, embolam-se-me as ideias na boca. Que querem? Não tivesse eu bebido só água e… A chuva lá fora, descarta-se rapidamente da poesia. Não passa de decoração dispensável e o frio, cá dentro, vem da falta de uma porta de saída desta sórdida realidade: o caos travestido de ordem. Tento escrever. Abro o meu caderno e a página que devia ser branca e lisa como sempre é, toma-se de obscuras tonalidades, de rugosas texturas. Um lodaçal autêntico, gente que passa abstracta, sombras, medos, desassossegos, ameaças, algas que se entrelaçam, contorcido desespero e, de repente, um crocodilo aberrante sai, em corrida desenfreada pelo caderno afora. A cauda viril, ameaçadora, da direita para a esquerda, da esquerda para a direita. - Monstro – cogito - quem te deu aqui entrada? Em lágrimas, o malvado, ri de mim, grosseiro, pleno de impenetrabilidade e falsa sensaboria. 
E, para além desta negra página, deste crocodilo, nenhum outro animal, palavra ou frase se adivinha nas folhas do meu caderno, hoje, depois de lidos os jornais. Fecho-o devagar, ainda na esperança de ver sair de dentro dele, um caçador de crocodilos bem equipado. Mas não! 
Música! A música é sempre um lugar seguro. Inacessível, (por enquanto), a crocodilos invasores dos domínios alheios. Ligo o aparelho – Chopin! Entre reflexões despropositadas penso que talvez devesse procurar uma loja de consertar pensamentos ou, até, indo mais longe, comprar um novo mecanismo de pensar, mais actualizado, mais em conformidade com os tempos que correm. Disseram-me que aqueles que já actualizaram o seu software pensante, pensam agora que, para melhor viver, o melhor é não pensar. Incorporaram em si uma espécie de dispositivo anestesiante, indolor e muito confortável. 
Gosto tanto desta música. Nem triste nem alegre. Música apenas com a evidência da vida pelo meio: o caos e um crocodilo enorme a destruir tudo, à sua passagem. Da janela vejo as árvores trémulas, tristes… - Porque estais tristes? - Não sabem a resposta. E, só de não saberem a resposta, parecem-me ainda mais tristes. 
Esta música!.. Vou ouvi-la até que me entre na circulação do sangue e me invada, de rompante, o coração, vivificando-o. É preciso um coração vivo quando, à solta, perto de nós, há um crocodilo cruel para abater. 
Não, caro leitor! Nada disto é ficção. Não lhe disse já que é real a falta de uma porta para fugir à realidade? Impossível continuar a jogar às escondidas com ela. Sonhar, é agora um delírio por demais palpável e, um delírio nestas condições, perde a insubstancialidade que o nomeia. " 
Lídia Borges, "À boca de cena"
Para que saibam, ela é uma Seara de Versos, mesmo quando escreve prosa.  

25 abril, 2013

Em 25 de Abril de 2013, foi assim:


Take one - cena da espera
O sol estava forte. A praça praticamente vazia. Que se passa?  Olhava, olhava, e pouca gente à volta encontrava. Há cansaço? Há desmobilização por descrença? A gente, mesmo que se sinta "água mole em pedra dura" cansa-se dessa  figura? Esperámos. O pano que segurávamos dizia dizeres de vontade. O sol abrasava e nós esperávamos. Após mais de uma hora de espera, avançámos. Meia centena de metros e estávamos com a protecção das acolhedoras sombras. Como pássaros saídos das árvores, ou como gnomos saídos de tudo o que era lado, engrossou-se a avenida: "25 de Abril sempre!"... não sei de onde apareceu, de repente, tanta gente.
Take two - cena do desfile
Ia o desfile desfilando. As mulheres sorrindo. As crianças iam e vinham, correndo. Os homens conversando. De quando em quando uns interrompiam para dar as palavras de ordem. Outros não interrompiam nada, porque só nisso se concentravam: "O governo e o Cavaco, são farinha do mesmo saco". As instalações sonoras eram sonoras. Os sons cruzavam-se e tropeçavam na voz intemporal do Zeca: "...venham mais cinco". Eu desfilava. Vi o João. Não esperava ver o João. Ele certamente não se surpreendeu por me ver. Não sei qual de nós estendeu primeiro a mão, se eu, se o João... Foi um bom aperto de mão!
Take three - cena do regresso
1. “O cantor” - Um pássaro foi atingido com um tiro na asa direita e passou por isso a voar na diagonal. Mais tarde foi atingido na asa esquerda e viu-se obrigado a deixar de voar, utilizando apenas as duas patas para andar no chão. Mais tarde foi atingido por uma bala na pata esquerda e passou por isso a andar na diagonal. Uma outra bala atingiu-o, semanas depois, na pata direita, e o pássaro deixou de poder andar. A partir desse momento dedicouse às canções.” Muitas pessoas estão a transformar-se em cantores — mas não por vontade própria. E isto é a primeira parte de uma tragédia.
2. Em 2013, nada tira mais liberdade do que o desemprego. A História mostrou, infelizmente vezes de mais, como a taxa de desemprego e a democracia estão ligadas. “O desempregado com filhos” “Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a mão. Ele estava desempregado há muito tempo; tinha fi lhos, aceitou. Mais tarde foi despedido e de novo procurou emprego. Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a mão que te resta. Ele estava desempregado há muito tempo; tinha fi lhos, aceitou. Mais tarde foi despedido e de novo procurou emprego. Disseram-lhe: só te oferecemos emprego se te cortarmos a cabeça. Ele estava desempregado há muito tempo; tinha fi lhos, aceitou.” (de “O Senhor Brecht”) - Gonçalo M. Tavares, hoje, no Público
Take four - prelúdio para cena seguinte
O primeiro de Maio será o que queiramos que seja. Que o João apareça...

Em 25 de Abril de 1974, foi assim:



Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo 
 (Sophia de Mello Breyner Andresen)

24 abril, 2013

Frei Bento Domingues, "no 24 de Abril, a gente tinha medo da própria sombra". E agora?


Frei Bento Domingues é homem a que dou atenção. Pelo que disse, ele me dá razão quanto a continuar  a merece-ma. Pena que, falando de medos de sombras, não tenha falado das sombras que sobre nós pairam e do que pensam os católicos sobre a atitude da sua Igreja... hoje.

Dom José Policarpo diz que a sociedade é capaz de suportar tudo, repetindo a ideia central de Ulrich, que afirmou que o povo aguenta o peso das sombras, enquanto Dom Jorge Ortiga recomenda que os crentes se remetam à reflexão e à introspecção, em grupos fechados sobre si mesmos.  Fico na dúvida sobre o que ele, Frei Bento, pensa e se amanhã desfilará ao meu lado. 

É que não me esqueço terem-me dito num comentário: "tem mais católicos ao seu lado, do que aquilo que pensa". Vamos ver... dizia o cego que queria ver.

22 abril, 2013

"A opinião de José Sócrates"



Guerras de alecrim e mangerona?  ou um jogo de futebol a pregar-lhes a partida?

 "A opinião de José Sócrates" foi ontem o 18.º programa de televisão mais visto no dia. Pior: antes dele, na RTP, o Jornal da Tarde e o Telejornal foram mais vistos. Desde que a RTP decidiu convidar o ex-primeiro-ministro, a audiência de domingo do canal público não tem parado de cair. Nas últimas três semanas tem sido assim: 9,7 - 9,3 - 9,2. Quanto ao próprio programa de Sócrates, começou com 10,1 de "rating", desceu para 7,8 e agora para 5,1. No que se refere ao "share", a queda tem sido igualmente constante: 18,3 - 14,9 - 10,0. (dados via facebook)

 

Sócrates passa ao lado dos reais problemas do país...

Sérgio Ribeiro, disse-me um dia que Cesário Verde lhe ensinou amplas lições de economia...

Edvard Munch, Karl Johan ao Anoitecer
Enquanto animava um debate inadiável, Sérgio Ribeiro citou. E eu fui ver o que ele tinha citado: 
(...)
Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco; Da solidão regouga um cauteleiro rouco; Tornam-se mausoléus as armações fulgentes. 
«Dó da miséria!... Compaixão de mim!...» E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso, Pede-me esmola um homenzinho idoso, Meu velho professor nas aulas de Latim!  
(...)  
Cesário Verde, extracto de "Sentimento de um Ocidental"

21 abril, 2013

"Chão de Claridades", de Eufrázio Filipe (2)

"O amor é revolucionário? Interessante. Importa-se de me explicar mais claramente a sua ideia? - e eu respondi que sim," e Eufrázio explicou, assim
Depois do Manuel Veiga, autor do prefácio, e do João David lhe dedicar um comovido testemunho, calhou a minha vez. E fui aventureiro, ao ponto de lhe caracterizar a obra, após ter descrito o nosso encontro e a nossa amizade, citando Vinicius: «“A gente não faz amigos, reconhece-os.” - Os poetas sabem dizer, com poucas palavras, as coisas profundas e certas.» 

«A obra de Eufrázio é configurada por "um universo de palavras simples onde os quatro elementos da natureza, - tal como acontece na poesia de Sophia – ar, água, terra e fogo, têm uma presença constante. Diria que Eufrázio tem, como Sophia, a magia do artesão que, com recursos naturais, que à partida parecem limitados, fazem obra que nos penetra a alma e a razão.»  

E dei exemplos brincando com títulos de poemas seus, onde o seu alinhado parece um poema:   
OUSAS SER LIVRE (pág. 121)
NOUTROS AMANHÃS (pág. 135)
A HASTEAR PALAVRAS (pág. 170)
NUM HINO ÀS TEMPESTADES (pág. 187)
EM AZUIS QUE SE DESFOLHAM (pág.214)
A SOPRAR O VENTO CONTRA O VENTO (pág. 223)
CAMINHO SEM MARGENS (pág. 224)
POR UMA NESGA DE SOL (pág. 233)
EM PLENO VOO POR UM GRÃO DE AREIA (249)
(todos os títulos se referem a poemas onde entra a palavra escarpa)   
Gostei disto, vou daqui… e faço uma pequena citação de um trabalho sobre a poética de Sophia, em reforço do que deixei dito: Nela, «… a poesia "implica", isto é, compromete-se com o mundo exterior, interiorizando-o e retransmitindo-o. Há uma reconstrução da aliança com a natureza e com as coisas numa procura de harmonia e pureza. Nestes elementos Sophia busca a beleza poética, o fascínio, a meditação, o reencontro e a comunhão com o primitivo, com as origens.» 

Sinto que há aqui um ponto comum, apesar da profunda originalidade de cada um. Voltando ainda aos exemplos, não posso deixar de observar que perpassa deles um sentir militante que é muito marcante em muitos poemas. 

É verdade, Eufrázio é um poeta de Abril (ou não fosse Abril um Chão de Claridades) Mas recordo e sublinho, a esse respeito, o que o nosso comum amigo, o Manuel Veiga, referiu no seu cuidado e bem elaborado prefácio: «Não se iludam (…) aqueles que esperam encontrar nesta obra poesia política em sentido estrito (…)E se alguma conjugação existe entre ambas (…) é pela afirmação da política como poesia e não o contrário». E essa é mais uma característica da poesia original deste meu querido amigo. O facto de, algumas vezes, me fazer lembrar José Gomes Ferreira é porque, neste, também os versos de combate e luta são antes de mais versos, versos belos de poeta militante. 

Deixem-me agora mudar um pouco o rumo a estas minhas palavras para introduzir desassossegos da alma e da razão. 

Costumo, ao falar de mim próprio, identificar-me como um Eu, alguém, que sente e age, sempre como resultado entre o confronto íntimo do sentimento com a razão. Para poder brincar com as palavras, dei-lhes nomes. Eu, sou Eu, Minha Alma e Meu Contrário Eu decido e ajo entre a Minha Alma que sente e o Meu Contrário, que faz contraponto racional a esse sentir. Assumo-me, assim, como sendo eu próprio a dialéctica. Quando digo que gosto da poesia de Eufrázio não estou a dizer que é algo que enche a Minha Alma, é mais que isso. É isso, com o consentimento do Meu Contrário.(...) A sua poesia colocam em paz o sentimento que tenho ao lê-lo com os juízos (ou pensamentos) que ficam a povoar-me a mente. 
E fui tentar descobrir porquê. 
Não sei se consegui. A ideia que me fica é que ele habitando uma escarpa – talvez a palavra mais constante em toda a sua obra – ele a escancara ao "outro". 

É isso. Eufrázio, está lá, esperando que estejamos também. Vê de lá, esperando que vejamos também. Sente e ama de lá, esperando que seja de lá que passemos a sentir e a amar. Sobe para lá, esperando que o acompanhemos na subida. É de lá que fala de esperança, convencido de que juntamos à sua a nossa voz… Não é impositivo nisso, pois para o poeta, o “outro”, não é mero destinatário da metáfora, é desafiado a fazer parte integrante dela.  “A busca do Outro talvez seja o caminho pelo qual cada um de nós consegue chegar a si próprio. Para aproximarmo-nos àquilo que somos temos de passar pelo Outro.” Escreveu Saramago.  Eufrázio, escreve-o de outro modo e alarga-lhe o sentido. Passa do ser ao estar. Na sua obra, a "escarpa" é o País de todos nós, ansiando ser um “Chão de Claridades”»

Terminei, dizendo «AINDA HOJE TE CHAMO ESCARPA»

Foi bonito

19 abril, 2013

"Chão de Claridades", de Eufrázio Filipe


É hoje! Vou lá estar. Estejam também

AINDA HOJE TE CHAMO ESCARPA

Inesperada uma lágrima
na rebentação das águas
fez-me andar eternidades
silêncios de carne e osso
à pergunta dos teus relâmpagos

Inverosímil lá estavas
íntegra
a dedilhar uma pedra
nos passos da areia

num afago de mãos
a colher o perfume silvestre
das maresias

Tinhas um Cristo
cruxificado nos olhos
e eu não sabia
se te chamavas pedra
barco flor ou pássaro

Ainda hoje te chamo escarpa

Eufrázio Filipe, in "Chão de Claridades"

18 abril, 2013

Visitando ruínas antigas e o sentir de almas esquecidas...


Acabo de chegar. Foi um percurso longo visitando de passagem Évora, Borba, Elvas, Redondo, Monsaraz, Mourão. A estadia foi em Juromenha, a olhar o Guadiana, a visitar ruínas e a ouvir lamentos do sentir de almas esquecidas. Os testemunhos recolhidos no Alandroal confirmam que precisamos de um grande susto. O Alqueva está lá, quase sem estar. Vê-se mas não se sente. 

Voltei, e trago um rio no olhar.

16 abril, 2013

Euro, aí está a discussão... enquanto o "governo anda às aranhas"(4)

Não há certezas, mas há a serenidade das convicções, sem populismo nem alarmismo...


A discussão, o tal "Debate Inadiável", vai-se fazendo. Hoje foi no Prós e Contras (fora de horas). Foi tratado em termos técnicos e em linguagem fechada? Foi. Talvez não possa ser feito de outro modo. Exige-se atenção concentrada para ir acompanhando o que podemos acompanhar. Mas há registos que podemos tomar: o livro agora saído fez todos os interlocutores ficarem em sentido. 
Vou comprar. Não é por nada, é apenas para perceber como Ferreira do Amaral passou a ser olhado (e apontado) com respeito (até) por quem não nos merece respeito nenhum

15 abril, 2013

Mar Arável diz-me: "não és convidado, és cúmplice". Serei cúmplice!


Talvez ler-lhe, de enfiada, todos os títulos da obra fosse uma surpresa surpreendente. Talvez vá colocar Minha Alma a falar do desassossego e a emoção de o ler. Talvez vá dar voz a esse meu outro, o Meu Contrário, e coloca-lo a discorrer sobre o "Chão de Claridades" e o significado da metáfora. Talvez,  por momentos, habitar-lhe a "escarpa" para tentar ver com os olhos dele as tais claridades. Talvez eu encontre a atitude, a palavra certa para corresponder, exactamente, aquilo a que o meu amigo chama "cumplicidades". Talvez tudo isso ou outra coisa, que consiga arrancar da plateia, que se pretende cheia, esperados e cúmplices sorrisos. 
Vai ser bom estar. Esteja também.

14 abril, 2013

Geração sentada, conversando na esplanada - 31 ( o que está na moda é o wrestling e a galhofa )

(ler conversa anterior)
Uma metáfora ou uma alegoria servem lindamente para arrumar as palavras e dá-las para fazer salientar o que a descrição de uma realidade, nua, crua e escrita com as palavras exactas, não consegue dar. Mas também serve para nos por a cabeça entretida a pensar, fora da realidade, em coisas que nos distraem dela. É uma pena que, quem escreve tão bem, se esconda atrás das metáforas para nos embalar o juízo. - Hoje não consigo citar o Gonçalo M. Tavares

A esplanada estava cheia. Se tivesse decidido citar o Gonçalo, diria que era uma passagem de modelos parada. Cada um antecipava a moda de Primavera, não conforme a carteira, mas com a preocupação de  funcionar para os olhares. E eu olhava as vestes e saboreava o sabor das cores. Parei no blaser cinzento do senhor engenheiro e no olhar inteligente do seu cão rafeiro. "Sente-se aqui", disse-me apontando-me o lugar meio exposto ao sol. Tinha a mesa ocupada com todos os jornais do dia, mas sugeriu que falássemos de wrestling. Não se fala de outra coisa
- wrestling?
- Sim, está na moda... é um espectáculo tentador... sabe as regras?
- Sei que as regras são violentas, duras, mas são lutas seguras, ninguém se aleija...
- Isso mesmo. A parte espectacular é a aparente violência, e o suspense que o adversário vai ser trucidado, esmagado, rasgado e quando se pensa que assim é o adversário põem-se pé...
- ...e disferem golpes uns diferentes outros, quase iguais... e assim sucessivamente.
- Exactamente. Mas o que está na moda é... um pouco diferente!
- Diferente?, diferente como?
- Os adversários enfrentam-se em ringues diferentes, um num lado e o outro noutro. Quando um assume o assalto, trepa as cordas que ladeiam o espaço e se lança para cima do outro, o outro não está lá. Quando um deles prepara o salto para esmagar, entre o esmagador e o corpo esperando ser esmagado, há um espaço. Estão um em cada lado. Quando um ataca, é do outro lado que ele reage ao ataque...
- Batem-se frente a frente sem que cada adversário esteja presente?
- Exactamente! E a assistência delira com os golpes. Aliás, quem decide o vencedor são as audiências.
- Mas então, as assistências também estão separadas e nunca assistem aos dois em directo.
- Correcto. Embora haja grande numero que procure acompanhar... fazem zapping. Ou então acompanham em diferido e seguem os detalhes nos dias seguintes. Existe um grande número de especialistas comentadores que passam todos os pormenores, dias a fio. Um que fez assim e o outro respondeu assado. Para além das audiências estes comentadores também decidem os vencedores...
- Curioso!, é uma nova galhofa. E o senhor engenheiro acompanha tudo isso?
- Não. Não ligo sequer o televisor. Nem é preciso. No dia seguinte toda a gente me fala nisso... estamos rodeados de wrestling. E quem não entra não conta. Fica fora da galhofa... fica fora desta moda. Até porque, se entrassem, entrariam a doer...
- Bem entendido que estamos a falar em sentido metafórico...
A Rita, que na mesa ao lado não perdia nem nesga de sol nem pitada da conversa, saiu-se com esta:
- Qual metáfora, qual alegoria, qual quê, do que estão falando é de uma bem ajustada e divertida analogia... e sempre lhes digo: hoje é domingo e lá estarão no horário nobre... e depois temos a semana toda para o resto da galhofa...

13 abril, 2013

Mais sete anos para pagar uma divida que não pára de aumentar...

Vai ser difícil aos nossos filhos olharem, olhos nos olhos, os nossos netos. Nós receberemos deles a condescendência que se dá aos velhos... Diz um amigo a um outro amigo: "o teu neto vai ter memória de ti - e irá insurgir-se..." Não sei se será como ele diz... recordo que um poeta dedicou suas memórias aos netos dos seus netos, não sendo tão esperançoso sobre o que esperar das próximas gerações...

11 abril, 2013

Maria do Céu Guerra e a amargura dela... que é também a nossa

“um país onde se cortam as árvores para que não façam sombra aos arbustos”
"Não sei se este é o meu último espectáculo.
A amargura com que vou estrear este belo texto de Nascimento Rosa – nonagésima produção da Barraca no seu trigésimo sétimo ano de trabalho ininterrupto – não é suportável nem admissível. Nenhum governo tem o direito de ser tão desproporcionado nas suas medidas e tão arbitrário nos seus fundamentos.
Depois do nosso trabalho ter viajado no País, na Europa e fora dela recolhendo distinções especiais e um carinho que estes funcionários de quem depende a sobrevivência de companhias como esta estão longe de saber o que é
Vemos que os Comissários de Cultura que gastam na administração dos seus sumptuários gabinetes ,nas consultas jurídicas que lhes respaldem os embustes e nas embaixadas milionárias em que transportam coisa nenhuma, a grande parte do orçamento que têm para administrar e fomentar a Criação Artística, aguardam ansiosos que A Barraca dê o seu último suspiro.
Estamos num país de Inveja e Histórica Mediocridade. Por que razão seria agora diferente? Desviam-se os olhos do vizinho que jáz no passeio , na pressa com que estamos de chegar ao conforto do lar.
Como disse Sttau Monteiro “um país onde se cortam as árvores para que não façam sombra aos arbustos”. - Maria do Céu Guerra
Trouxe foto e texto do post editado por Carlos Fonseca, da sua página do facebook, também como forma de me penitenciar do facto de ter publicado, há dias, um poema declamado por Maria do Céu Guerra, sem me dignar a citar o nome dela. Não sei se tenho perdão... 

09 abril, 2013

Na era dos comentadores, o "euísmo" substituí o "achismo"...

Se antes a televisão manipulava pelas imagens, hoje distorce a realidade pela narrativa...
Antes, a realidade estava lá, mas era mostrada de forma manipulada. Viveu-se com a produção de uma opinião que desenvolveu o chamado "achismo". Todos nós (sim, até eu) nos manifestávamos através do que achávamos. Com o desenrolar dos tempos, o "eu acho que" ocupou o discurso baseado na "mensagem" televisiva, depois secundada na imprensa escrita. Mas "achar" ainda significava pensar, ter algum espírito critico, desmontar e tentar perceber...

"Euísmo" é uma palavra que acaba de ser inventada, com a chegada de uma enxurrada de comentadores. O "euísmo" é um "eu acho" sem se achar nada, por tudo ser achado por quem está (supostamente) bem preparado por achar por nós. É uma palavra avinagrada, mordaz. Parece colocar ênfase no "eu", mas que dizer exactamente o contrário. Significa a implosão do nosso individualismo que foi levado a um extremo mal conhecido: a negação do nosso eu.  Quando dissermos "eu acho" estar-se-a  a afirmar o que o comentador acaba de achar, senão esse, um outro qualquer, da enxurrada chegada...

Ao qu´isto chegou, já nem há rebanhos como havia dantes... 

08 abril, 2013

Euro, aí está a discussão... enquanto o "governo anda às aranhas"(3)

Vítor Bento não é favorável à saída, mas admite discuti-la. Que o faça, na praça.

Depois do acórdão do TC que reacção espera da troika?

A minha previsão é a de um endurecimento face a Portugal, que tenderá a ser separado da Irlanda e aproximado da Grécia. 
Com o chumbo pelo TC dos cortes da despesa do Estado, onde é que o Governo vai buscar 1,3 mil milhões de euros que previa arrecadar?

A decisão do TC só deixa três portas abertas: impostos, fecho de serviços e despedimentos. Não vejo outra via. 
Mais impostos parece impraticável...

Porquê? É indesejável, mas não é impraticável. Por isso digo que os decisores e as sociedades são livres de tomar as suas decisões, têm é de tomar a responsabilidade e pagar o preço. Se se chumbam certas medidas, está-se a empurrar para outras medidas. O TC também faz implicitamente a escolha de um caminho orçamental. 
(...)
Admite uma maior clivagem dentro da moeda única?
É um cenário possível. Se durante vários anos esse desiderato fundamental não consegue ser atingido e as populações se convencerem de que não têm condições de satisfazer as suas aspirações razoáveis dentro da moeda única, então vão pôr em cima da mesa o cenário da saída. Isto independentemente do custo imediato que possa ter. O que defendo é que deve ser feito um esforço para ter sucesso dentro do euro, pois o que está em jogo não é só economia; é política e é geoestratégia. Para a Europa ter relevância global tem de estar integrada e, hoje em dia, não há nenhum país europeu que, por si só e por maior que seja, tenha dimensão para ter relevância no contexto do mundo globalizado e mais integrado. Mesmo a Alemanha tem a cadeia de valor repartida pelos países à sua volta. E tem interesse numa certa estabilidade e capacidade de interacção dentro da Europa. Esse é o desafio da Europa. 
Já percebeu em que moldes é que a Alemanha quer manter o protagonismo?

É preciso saber se a Europa precisa dela toda ou se pode prescindir de alguns dos membros. Esse é o grande risco, nomeadamente saber se os países em posição mais periférica - geográfica, económica e política - são "prescindíveis". Portugal, infelizmente, acumula vários indicadores de perificidade. Como mostro no meu livro, Portugal foi o país que depois do alargamento a leste mais ficou afastado do centro da UE. O que significa que esta adversidade tem de ser compensada com esforço adicional da nossa parte para não perder relevância. 
Perante o novo cenário que se abriu, deve-se discutir a nossa continuidade no euro?
Estes temas devem ser discutidos. A pior coisa é criar tabus. Mas as discussões devem ser racionais. Hoje, o nosso espaço público está demasiado cheio de algazarra e com poucas ideias concretas. Há pouca densidade na discussão. Quase tudo tem por base emoções, preconceitos e reacções do tipo Benfica-Sporting. 
Na sociedade portuguesa existem duas correntes estratégicas: a atlantista e a europeísta. Auto-excluem-se ou podem conviver?

Podem conviver, o que é uma vantagem. Um dos grandes desafios que qualquer pessoa, individual ou colectiva, tem é o de transformar as eventuais fraquezas em forças. Somos periféricos face à Europa, mas somos centrais em relação ao espaço atlântico e podemos usar essa centralidade para nos dar poder dentro da Europa e usar a Europa para nos dar poder dentro dessa centralidade. Barack Obama lançou há pouco a ideia de uma união económica entre a Europa e os EUA. Nessa união, Portugal fica automaticamente recentrado, e deve aproveitar, e alavancar, a vantagem desse posicionamento. 
Defende a necessidade de uma Europa unida face ao contexto global, mas é fundamental que tenha uma moeda única?

Não. No livro interrogo se os grandes desígnios da integração europeia são mais bem servidos com uma moeda única ou com diversidade monetária que salvaguarde a flexibilidade para chegar melhor aos objectivos principais. Não tenho resposta para isso. Mas uma coisa é não alargar o espaço da moeda única, outra é desfazer o que já existe e que tem custos consideráveis.

E a ser desfeita, seria para todos em simultâneo?
Esse cenário não existe. Mesmo concebendo teoricamente uma desintegração do euro, os países a que chamo do euro forte permanecerão sempre unidos porque já têm uma tradição de partilha de funções de preferência de regime monetário muito anterior ao euro, e vão querer manter a unidade monetária, ainda que com outro nome. O que acontecerá, em caso de desintegração, é que a sua "centralidade" será reforçada dentro da União.
(...)
Está a ver um caminho para Portugal diferente daquele que não leve a uma maior recessão?

Há muitos constrangimentos. Um deles é a contradição política em que vivemos, na medida em que as políticas relevantes são decididas em termos europeus, mas os decisores são julgados em termos nacionais. E os decisores, agindo com preocupação europeia, têm acima de tudo de responder aos seus eleitores, que é donde lhes emana o poder. 
Dos países "resgatados" qual corre maior risco de sair do euro?

O que apresenta o maior risco é Chipre. Mas esse cutelo está sempre pendente quando o nível de sofrimento da permanência é percebido como maior do que a alternativa de saída, podendo levar a que se procure esta alternativa. O que não quer dizer que seja a melhor. Tento olhar para estes problemas numa perspectiva distanciada da poeira dos acontecimentos. Aquilo que vejo em relação ao nosso país, e que me preocupa bastante, é que durante muitos anos, e com sucesso, vivemos num regime monetário inflacionista e de moeda fraca, de cuja mentalidade não nos conseguimos libertar.
(...)
Concorda com quem diz que o Governo funciona com modelos matemáticos errados e não testados?

Não testados, seguramente. Mas esse é o ponto. Estamos numa situação de turbulência que altera os parâmetros económicos dos modelos. Os instrumentos têm a falibilidade que têm, mas se não há outros melhores... 
Olhamos para a taxa de desemprego e vemos as sucessivas revisões em alta...

Esse é outro problema e muito preocupante. E significa que, do ponto de vista da concepção do modelo de ajustamento, terá havido erros. Já é uma enorme diferença. Agora não me surpreende em excesso. Entrámos no processo de ajustamento sem ter todos os instrumentos ao nosso dispor e falta-nos um essencial, que é o equivalente à desvalorização. O problema é que tínhamos um nível de despesa superior à capacidade de geração de rendimento. E a forma de lidar com isto é reduzir a procura interna, alinhando-a com a capacidade de geração de rendimento. Mas esse movimento, só por si, alimenta-se e arrasta o PIB para baixo. É preciso actuar também noutro lado e criar um choque positivo da procura externa que alivie a retracção do PIB, compensando o choque negativo da procura interna. Em Portugal só tivemos um lado do ajustamento, a parte da austeridade. Faltou-nos a desvalorização [da moeda] - ou um seu equivalente - para provocar um choque de procura externa. 
Que não é possível?

É claro que as exportações têm aumentado, mas não ao ritmo necessário para compensar o choque negativo da procura interna. Pelo que a economia é forçada a cair mais. Evitar isso seria a grande vantagem da desvalorização como instrumento de ajustamento. Como não temos moeda para desvalorizar, a sociedade deveria estar hoje à procura de um sucedâneo que provocasse um efeito parecido. 
Por isso defendeu a descida da taxa social única (TSU)?

Foi um erro enorme não se ter discutido a TSU como instrumento sucedâneo. Não tenho a certeza se funcionaria mas deveria ter sido discutido racionalmente. A rejeição foi demasiado à flor da pele. Porque é que o FMI pôs sempre a TSU em cima da mesa? Porque percebeu que no processo de ajustamento faltava o braço do choque da procura externa e andaram à procura de soluções. E houve países onde a TSU funcionou. Mas também digo que, para que pudesse produzir os seus efeitos, era preciso haver uma redução dos preços dos bens não transaccionáveis, nem que fosse por via administrativa. E aqui o Governo foi demasiado tímido. 
Que outras medidas podem reverter os impactos da austeridade?

O Governo não pode tomar decisões que a sociedade não aceite ou para as quais não esteja preparada. Mas esta, se se voltar para soluções fantasistas, vai rejeitar todas as soluções realistas. A única alternativa concreta e realizável é a da extrema-esquerda política: não se deve pagar aos credores e devemos sair do euro. Boa ou má, cada um terá as suas opiniões sobre ela, mas é uma proposta concreta e realizável.
Qual é a sua opinião?
Acho que teria mais e mais demorados custos sociais. Devemos cumprir as nossas obrigações e manter-nos no euro. Mas as outras alternativas de que se fala não têm conteúdo. Quando se diz que é preciso mais crescimento... isso é um desejo, não é uma solução. Mas como é que se cresce mais? Respondem: temos de aumentar a procura interna. Mas como? É que para aumentar a procura interna é preciso financiamento. E é a falta dele que nos obrigou ao resgate. Aumenta-se a procura interna ou com receitas das exportações, que financiem as importações arrastadas pela procura interna; ou com atracção de investimento estrangeiro que traga os recursos necessários; ou se alguém nos der dinheiro. Os grandes objectivos da economia nacional deveriam, por isso, ser: promover as exportações e atrair investimento estrangeiro.
(...)
Extractos da entrevista dada por Vítor Bento, hoje no Público (ler tudo aqui)

Tribunal Constitucional, o pequeno (e insuficiente) susto e a guerra das audiências....

Segundo as respectivas "rogériografias", os cérebros não são iguais. Apenas apresentam algumas simetrias

Reedição, na integra, de um post editado em Janeiro passado:
Em estudos por mim realizados, em Agosto de 2010, eram já maioritários os cérebros anormais, cuja anormalidade ia condicionando a marcha da "coisa pública". Se antes, a lobotomia era a técnica usada para neutralizar o hemisfério pensante, recentemente recorrem-se a métodos menos evasivos e dolorosos com resultados mais proveitosos para os poderes instituídos.  Se fosse o caso deste post pretender o detalhe de tais métodos, iria por certo descreve-los minuciosamente e pôr a claro como se domina a mente.  Para já, basta referenciar que o método resulta:
(...) na noite da passagem do ano com a transmissão da final do reality show Casa dos Segredos 3. O programa foi visto por mais de 1,8 milhões de espectadores.(...) O pico de audiência registou-se pelas 00h17, atingindo os 2,383 milhões de espectadores.
Considerando que a regeneração da parte pensante só acontecerá com um enorme susto, não é espectável que tal aconteça por decisões do Tribunal Constitucional... Enquanto isso uma minoria de cérebros normais resistem! Espera-se o susto...

07 abril, 2013

Passos avança de excel em riste e promete arrasar com o estado social. Seguro, cede a palavra a Sócrates... Deixa no ar a dúvida de não se saber a quem irá responder...

Reedição:
Acabado de ver: Sócrates consegue dizer tudo, sem dizer nada. 
Cabe a Seguro dizer nada, pensando que dirá tudo.  

Convoco-os a ambos (embora saiba ser falsa a esperança de irem estar)



Euro, aí está a discussão... enquanto o "governo anda às aranhas"(2)


Este post será editado com o inicio da comunicação de Passos Coelho. Depois de grande redopio. Redopio e alarido. O Tribunal Constitucional fez esquecer tudo o que havia sido dito, o governo reuniu e foi recebido pelo presidente... entretanto, eu dei atenção a um personagem importante, representante daqueles que tiveram papel determinante na imposição  do resgate. Tal personagem veio dizer, talvez o que os banqueiros todos pensam que deve ser feito. O sector financeiro anda numa azáfama, não pára. Entre outras preocupações, alarmam-se com o desenvolvimento do tema que já entrou na agenda... Daqui a um minuto o Passos fala...

Enquanto isso (e até depois) sobrevivem os cérebros aterrados, o medo instalou-se-lhes nos neurónios e a saída do euro é algo de impensável. Mas será melhor irem pensando nisso. O governo manterá o excel em riste...

06 abril, 2013

A sobrevivência aceite ...

Imagem da Fê Blue-bird
Na sala, que (ainda) não é oval,
o "coiso" recebeu o primeiro
Disse este
ao presidente:
o Excel está operacional
e ter a força anímica necessária!

(Diz-se haver um Seguro
contra todos os riscos
tendo a Pátria como beneficiária)

Diz o urso:
Amanhã há discurso

Euro, aí está a discussão... enquanto o "governo anda às aranhas"(1)


Pronto, acho que é mesmo irreversível: a discussão veio para ficar. Muitos chegarão tarde ao debate ou tomarão posições de rejeição liminar, mandando para cima da questão os fantasmas que tiverem mais à mão. Outros, entrarão (irão ter de entrar) na discussão com o ónus de ter de analisar o corte com a Europa, sentindo isso como o corte com o seu próprio projecto. «“A Europa connosco”, as ilusões sobre a construção europeia como uma zona de solidariedade e prosperidade sem par fazem parte da (sua) matriz genética». Nem digo de quem estou a falar...

Há gente que virá trazer para cima das agendas o "DEBATE NECESSÁRIO". Sérgio Ribeiro dizia mais ou menos isso e citava, entre outros, Nicolau Santos, que hoje escreve um artigo que deve ser lido e do qual reescrevo, por não estar disponível on-line, a sua parte final:
«Precisamos de ser o bom aluno que confronta o professor, que o questiona, que lhe diz que não concorda com ele. E ou fazemos isso isso para que a nossa permanência no euro não seja um calvário sem esperança nem futuro ou então o melhor mesmo é arriscar a saída da moeda única.»
Mas há quem, argumente, que o inevitável é sair mesmo. Entre outras coisas, fomos o "mau aluno" tempo demais...



continua

Falhou o quizz, não falhou o Tribunal Constitucional... é o que vale...


A tentativa de jogar um "quizz" enquanto não chegava a noticia, era apenas para lembrar que não bastar correr com o (des)governo. Era para situar politicas iguais, que só diferem na intensidade e na fúria... O povo continuará nas ruas, para o lembrar... e para exigir que mudem.  Quanto ao (des)governo, dois cartões amarelos, dá expulsão.

E quanto à resposta certa, no jogo do post anterior, ela está lá, de onde tirei o texto.

05 abril, 2013

Quizz sobre a crise

Leia, atentamente, o texto abaixo. De seguida, responda (na caixa de comentários) aquilo que lhe parece. O texto refere medidas inscritas:

- No "memorandum da troika"?
- No que foi negociado após a 2ª avaliação da sua aplicação?
- No PEC 4?
- Sei lá, eu pago e não bufo!

A resposta será dada logo após o Tribunal Constitucional se pronunciar
TEXTO
Medidas adicionais para o ano em curso:
- Corte total de 1360 milhões; saúde – 85 milhões; SEE -170 milhões; AP, incluindo FSA -170 milhões; segurança social -170 milhões; despesa de capital (investimento público) 595 milhões.
- Saúde – redução de custos com medicamentos, sendo que o balanço do ano de 2011 se traduziu de facto numa redução da despesa do Estado em 19,2% mas em paralelo num aumento de 9,3%, isto é mais 66 milhões de euros, de despesa para os utentes.
- Corte despesa SEE em 15%. Traduziu-se por exemplo em aumentos médios que segundo o Governo eram de 15%, mas que em muitos casos de passes e outros títulos de transportes muito utilizados chegou aos 20 ou 25%.
- Corte nos serviços públicos (administração direta e SFA – exceto SNS, CGA e ensino superior).
- Corte no investimento público, designadamente escolas, equipamentos coletivos e infra estruturas de transportes em 400 milhões de euros.
- Aumento de receitas com concessões do jogo, comunicações e energia e também venda de património.
Para 2012 e 2013 em concreto quadro II.2, página 15 e seguintes 
Despesa:
- Redução da despesa em pensões 425 milhões de euros em 2012.
- Redução de custos com medicamentos e subsistemas públicos de saúde 510 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013, dos quais: acordo com a Apifarma de redução de 140 milhões em 2012 de que não se sabe exatamente o resultado, sabendo-se contudo do já referido aumento dos custos com medicamentos para os utentes em 66 milhões de euros; corte nos hospitais públicos de 5% em 2012 e 4% em 2013; corte na saúde dos trabalhadores da administração pública (ADSE e outros) de 170 milhões; agregação em centros hospitalares e agrupamentos de centros de saúde, corte de 10 milhões em 2012 e 20 milhões de 2013.
- Encerramento de escolas e outros cortes na educação, incluindo mega agrupamentos – redução de 340 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013.
- Outros cortes na administração pública (“consumos intermédios”) 340 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013, incluindo por exemplo “racionalização da rede de tribunais”, isto é, encerramento de tribunais equivalente ao corte de 60 milhões em 2012 e 2013.
- “Controlo da atribuição das prestações sociais”, isto é, agravamento da aplicação da condição de recursos nas prestações sociais, restrições ao acesso ao subsídio de desemprego e de doença, congelamento até 2013 do IAS com consequência em todas as prestações que lhe estão indexadas e em paralelo aumento de cobrança de contribuições aos trabalhadores no valor de 340 milhões em 2013.
- Reduções no SEE, designadamente indemnizações compensatórias (por exemplo no serviço público de rádio e televisão), planos de investimentos e custos operacionais (por exemplo investimentos em escolas, outros equipamentos e infraestruturas de transportes) 595 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013.
- Corte regiões autónomas e autarquias 170 milhões em 2012.
Receitas:
- Redução das deduções e benefícios em IRS, isto é, aumento deste imposto, com aumento de receita (em conjunto com alterações ao IRC) de mais 680 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013.
- Aumento do IRS para reformados e pensionistas (nivelamento por baixo da dedução específica) em 255 milhões de euros a partir de 2012.
- Alteração de taxas do IVA (“progressiva simplificação”) com um aumento de cobrança de receitas de 170 milhões em 2012 e 510 milhões em 2013.
- Aumento de outros impostos sobre o consumo em mais 255 milhões em 2012. 
Facto significativo também é o compromisso com a “antecipação do programa de privatização”, prevendo-se um valor de 2184, 2255 e 1145 milhões respectivamente em 2011, 2012 e 2013.
Vá, responda lá!
(as questões estão há entrada) 

A Mafalda tem uma vaga esperança...

A Mafalda é uma ingénua...

04 abril, 2013

Euro, o "DEBATE INADIÁVEL" : Sair ou ficar?

A mesa que presidiu à sessão, com Sérgio Ribeiro no uso da palavra
A sala no inicio na sessão, viria a quase lotar-se depois, com gente atenta
A 10 minutos do inicio da sessão estava convencido que não se iria confirmar o que tinha "prometido" ao Sérgio: Vais ter a casa cheia, 10 minutos depois de ter tido esse receio deixei de tê-lo, pois a sessão iniciou-se com a sala bem composta vindo a quase lotar-se depois, com uma plateia imensa e atenta. Os que esperavam uma sessão onde o Sérgio Ribeiro, com a sua larga vivência (como ex-eurodeputado e ex-membro do Comité Central, autor de tantos livros sobre a matéria) a utilizasse para discorrer sobre o sair ou ficar, ficou surpreendida com a orientação seguida na exposição. Mais do que divulgar a posição do Partido, Sérgio Ribeiro deu "uma lição" visando dotar a assistência dos "instrumentos" (processos e conceitos) para a habilitar a reflectir e a entrar na discussão. Sérgio Ribeiro historiou todo o processo mesmo antes de se pensar na adesão, citando um livrinho, de Abel Salazar, "A Crise Europeia", para referir que as coisas que agora estamos sofrendo são dores de feridas antigas.
Sobre o tema "Euro, Sair ou Ficar", diria que a questão é complexa e teria sido preferível nem se colocar, pois o grande problema foi ter entrado. Afirmaria, de seguida, que a situação é muitíssimo mais complicada porque se concretizou tudo o que o que o Partido tinha previsto, e apresentou à assistência a declaração de voto que ele mesmo leu, no Parlamento Europeu, quando em Maio de 1998, os eurodeputados do Partido votaram contra a entrada na Moeda Única (ver texto abaixo). 

Passou depois a discorrer sobre o que está em causa, referindo que a questão já não é sair ou não sair. A questão é como sair. Sair já é discussão admitida por quem há pouco tempo se escusava a falar disso, e deu exemplos referindo Vitor Bento, Nicolau Santos e outros, designadamente os que figuram num excelente oportuno artigo publicado há pouco no jornal "i". O Sérgio salientou que o problema que se coloca actualmente é o da negociação e, nesta, a quantificação da indemnização devida por nos terem tirado meios de produção arrasando-nos a economia. A discussão necessária deve poder avaliar como funcionarão os instrumentos de que o pais passará a dispor com a saída, designadamente a desvalorização da moeda, mas deve sobretudo incidir sobre as formas em como Portugal deve ser indemnizado por todos estes anos em que o país desconvergiu, quando havia intenção afirmada, mas não concretizada, de que iria convergir económica e socialmente. A divida deve ser paga, no que for justo e devido pagar. Sobre o poder negocial Sérgio Ribeiro foi certeiro: "A força negocial está num Terreiro de Paço cheio".

Claro que uma sessão assim, foi animada até ao fim, não faltando milhentas perguntas para outra tantas respostas...
________________________________
Actas do Parlamento Europeu:
«SESSÃO DE SÁBADO, 2 DE MAIO DE 1998
4. Moeda única
Declarações de voto
Ribeiro (GUE/NGL). – Senhora Presidente, os deputados do Partido Comunista Português, com a solenidade que a ocasião exigiria, mas que a euforia para impressionar a opinião pública não permite, declaram que:
- o seu voto é a expressão coerente de uma posição contra este projecto, o modo como foi conduzido e os interesses que serve. Não é um voto contra a estabilidade de preços, o equilíbrio orçamental, ou o controlo de dívidas, mecanismos e instrumentos. É, sim, um voto contra a sua utilização para impor estratégias que concentram riqueza, agravam desemprego, agudizam assimetrias e desigualdades, criam maior e nova pobreza e exclusão social, diminuem a soberania nacional e aumentam défices democráticos;
- é também um voto contra a formação do núcleo duro para a Comissão Executiva do BCE, privilegiando zonas geográfico-monetárias e partilhando influência entre grandes famílias partidárias, numa evidente polarização do poder na instituição que condicionará todas as políticas dos Estados-Membros;
- após este passo, continuarão a combater os já reais e os previsíveis malefícios do projecto que integram os mecanismos e instrumentos criados. Procurarão, do mesmo modo, contribuir para que sejam potenciadas as suas virtualidades;
- lamentam, por último, que o Parlamento tenha perdido a oportunidade para se credibilizar como instituição democrática, por ter cedido à pompa e circunstância de um ritual de homologação ou de confirmação do que lhe foi apresentado.»*
 * Sérgio Ribeiro, no seu blogue, transcreve também a declaração de voto do Partido Socialista, que deve ser lida...

03 abril, 2013

Nem pensar, nem ouvir, nem ver, nem questionar... mas todos os dias há acções contra o pensamento único!

Sem perder os sentidos importa-lhes que os não use. A imposição de um pensamento único o recomenda. Na impossibilidade de seguir a recomendação, descobrem e utilizam práticas com elevada eficácia. Mostram o que querem mostrar, o que não se mostra não existe. Calam o que não pretendem que se oiça, do que não se fala não existe. Não se questione, as perguntas que não se colocam não existem. Nem existem as possíveis respostas.  
Vivemos tempos em que o pensamento difundido, vestindo vestes diferentes, aparenta a pluralidade das vestes ostentadas...  dentro, o mesmo corpo, parecendo outro. Assim, perante a aparência, se constrói a alternância...
Como romper o ciclo? Como fazer pensar, fazer ouvir, fazer ver, fazer falar? Como fazer para romper com o pensamento único? É mais importante encontrar esta resposta que o resultado do impacto da moção de censura, ou o que o Tribunal Constitucional tiver para dizer. Um e outro procurarão fazer diluir nos decibéis agressivos de quem detém o poder de impor o pensamento único, com diferentes, mas expressivas "narrativas"...  
Vai ser difícil sair disto. Mas o povo soube sempre encontrar saídas!

...e todos os dias há acções contra o pensamento único!