14 abril, 2013

Geração sentada, conversando na esplanada - 31 ( o que está na moda é o wrestling e a galhofa )

(ler conversa anterior)
Uma metáfora ou uma alegoria servem lindamente para arrumar as palavras e dá-las para fazer salientar o que a descrição de uma realidade, nua, crua e escrita com as palavras exactas, não consegue dar. Mas também serve para nos por a cabeça entretida a pensar, fora da realidade, em coisas que nos distraem dela. É uma pena que, quem escreve tão bem, se esconda atrás das metáforas para nos embalar o juízo. - Hoje não consigo citar o Gonçalo M. Tavares

A esplanada estava cheia. Se tivesse decidido citar o Gonçalo, diria que era uma passagem de modelos parada. Cada um antecipava a moda de Primavera, não conforme a carteira, mas com a preocupação de  funcionar para os olhares. E eu olhava as vestes e saboreava o sabor das cores. Parei no blaser cinzento do senhor engenheiro e no olhar inteligente do seu cão rafeiro. "Sente-se aqui", disse-me apontando-me o lugar meio exposto ao sol. Tinha a mesa ocupada com todos os jornais do dia, mas sugeriu que falássemos de wrestling. Não se fala de outra coisa
- wrestling?
- Sim, está na moda... é um espectáculo tentador... sabe as regras?
- Sei que as regras são violentas, duras, mas são lutas seguras, ninguém se aleija...
- Isso mesmo. A parte espectacular é a aparente violência, e o suspense que o adversário vai ser trucidado, esmagado, rasgado e quando se pensa que assim é o adversário põem-se pé...
- ...e disferem golpes uns diferentes outros, quase iguais... e assim sucessivamente.
- Exactamente. Mas o que está na moda é... um pouco diferente!
- Diferente?, diferente como?
- Os adversários enfrentam-se em ringues diferentes, um num lado e o outro noutro. Quando um assume o assalto, trepa as cordas que ladeiam o espaço e se lança para cima do outro, o outro não está lá. Quando um deles prepara o salto para esmagar, entre o esmagador e o corpo esperando ser esmagado, há um espaço. Estão um em cada lado. Quando um ataca, é do outro lado que ele reage ao ataque...
- Batem-se frente a frente sem que cada adversário esteja presente?
- Exactamente! E a assistência delira com os golpes. Aliás, quem decide o vencedor são as audiências.
- Mas então, as assistências também estão separadas e nunca assistem aos dois em directo.
- Correcto. Embora haja grande numero que procure acompanhar... fazem zapping. Ou então acompanham em diferido e seguem os detalhes nos dias seguintes. Existe um grande número de especialistas comentadores que passam todos os pormenores, dias a fio. Um que fez assim e o outro respondeu assado. Para além das audiências estes comentadores também decidem os vencedores...
- Curioso!, é uma nova galhofa. E o senhor engenheiro acompanha tudo isso?
- Não. Não ligo sequer o televisor. Nem é preciso. No dia seguinte toda a gente me fala nisso... estamos rodeados de wrestling. E quem não entra não conta. Fica fora da galhofa... fica fora desta moda. Até porque, se entrassem, entrariam a doer...
- Bem entendido que estamos a falar em sentido metafórico...
A Rita, que na mesa ao lado não perdia nem nesga de sol nem pitada da conversa, saiu-se com esta:
- Qual metáfora, qual alegoria, qual quê, do que estão falando é de uma bem ajustada e divertida analogia... e sempre lhes digo: hoje é domingo e lá estarão no horário nobre... e depois temos a semana toda para o resto da galhofa...

9 comentários:

  1. Não me digas que, logo à noite, vamos ter um qualquer Tarzan Taborda a comentar na Tv?
    É bem capaz de passar a mensagem...

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  2. eu não posso comentar estas galhofas pois não percebo nada desses combates em ringues diferentes, muito menos da guerra de audiências que provocam...só sei que são estes senhores e os seus fãs que minam a cena dos combates e por vezes têm a cara de pau de vir dizer que a política necessita de sangue novo. Pergunto com? se eles não largam o osso...

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  3. Rogério,

    Isto hoje saiu inspirado. Tens razão a luta de galos é para enganar o pagode. Eles não se aleijam e encenam bem. Está instalada a guerra de audiências com o pagode, no meio, a discutir detalhes.

    Abraço

    José Luís

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  4. Temos um país de comentadores!
    Sem mais comentários! :-))

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  5. Uma excelente analogia.
    Lutas que não aleijam e fazem as delícias dos espectadores.


    G.M.T. está comprometido com o texto literário. Este obedece a uma linguagem estética que não é, propriamente, a que usamos no quotidiano.
    Não obstante, o texto deve procurar a adesão do leitor e não tornar-se impenetrável.

    Mas há sempre "erudições" para leitores de elite.

    Um beijo

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  6. Admito que um dia
    se façam apostas
    e ofereçam frigoríficos e frigideiras aos concorrentes

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  7. A arena onde esses pavões se movem é a da vaidade...E a da presunção e água benta! A nós, resta-nos o riso, ora pois.
    Um abraço

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  8. Pois é... e assim vamos vivendo.

    Bom ler-te.
    beijinho
    cecilia

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  9. A próxima moda vai ser contratar comentadores,para comentarem outros comentadores.

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