30 junho, 2018

29 junho, 2018

Marcelo e Trump, como num WC - Parte II


Se tivesse que interpretar a linguagem corporal e as expressões, diria que Marcelo reflete que se sente cumpridor da missão que ali levou e que Trump estaria já a clamar que o conduzissem à saída. À sua maneira, claro. Como num WC, depois de defecarem, ficou o cheiro. A cimeira da NATO é daqui a menos de duas semanas... o odor permanecerá até lá.

E qual a missão que ali o levou? Marcelo explicou:
"a Europa tem uma importância crucial para os Estados Unidos da América, porque a NATO compreende uma intervenção fundamental da Europa, sobretudo quando se olha não apenas para leste, mas para sul, e a Europa e os europeus chegaram onde em muitos casos os norte-americanos, por causa da sua história, não chegaram".
"Isso é muito importante. E eu penso que esses pontos passaram bem na conversa"

Marcelo e Trump, como num WC


Não, não é do anedotário! Até é muito sério, o caso!
Não há protocolo, num WC.
Aliás, numa retrete publica, é comum haver escrita, e são frequentes os dizeres, assim:
Aqui, até os cobardes fazem força
e até os valentes se cagam... 
Neste caso, enigmático, nem pense entrar na Sala ex-Oval... estão ambos com prisão de ventre!

25 junho, 2018

Antes manipulava-se a realidade, hoje a realidade é escondida, o que vai dar no mesmo.

As contas públicas portuguesas evoluíram de forma positiva em 2017. O défice orçamental, sem ter em conta o valor da injecção de capital do Estado na Caixa Geral de Depósitos, foi o mais reduzido da histórica democrática portuguesa, ao atingir os 0,92% do PIB.

No que diz respeito à dívida pública, a evolução também foi positiva, já que o valor do peso no PIB baixou para 125,7%, o que compara com recordes acima de 130% do PIB em anos anteriores.



Ultimamente tem acontecido terem sido repetidas, e repetidas, e repetidas, até à exaustão tais estatísticas. Antes manipulava-se a realidade, hoje a realidade é escondida, o que vai dar no mesmo. Em ambas as situações o efeito é o mesmo, passa-se a imagem de que tudo vai bem e até aqueles a que a vida não corre de feição, que vão empobrecendo, ficam com a dúvida de que as coisas estarão muito melhor para os outros todos e só à sua volta é que piora.

Eugénio Rosa desfaz tal ideia:
«Entre 2004 e 2017, o custo hora do trabalho aumentou em Portugal 2,8€ (entre 2015/2 0 17, subiu 40 cêntimos segundo o Eurostat ) , enquanto a média na U.E. foi de 7€ .

Este menor crescimento do custo do trabalho em Portugal determinou que, entre 2004 e 2017, quando se compara o do nosso país com a média da U.E., o custo hora de trabalho em Portugal tenha diminuído de 57,1 % para apenas 52,6 % da média da U.E. Em relação aos países da Zona Euro, diminuiu de 49,1% para 46,5%.

Portanto, a remuneração dos trabalhadores portugueses no lugar de se aproximar da média da U.E. está-se a afastar. Em Portugal a sobre-exploração aumentou. E agravar-se-á ainda mais com o acordo UGT/Patrões/governo , como se provou no nosso estudo anterior .

24 junho, 2018

São João, com martelinhos de importação


Martelinhos, "made in" China*

Tiram-nos tudo, ó São João
Que fazer desta má sina?
Festejos são ilusão
Com martelinhos vindos da China

Com martelinhos vindos da China
Vem ó santo em meu socorro
Inverte esta má sina
Devolve meu alho-porro

Devolve meu alho-porro
Evita tanta importação
Contribui para nosso aforro
Ó meu rico São João

Rogerito
______________
* Em 2011 a fábrica portuguesa (a "Estrela Paraíso), que criou o "martelinho", passou  a produção de meio milhão de unidades para cerca de 200 mil. A concorrência da China condenou a empresa que acabaria por encerrar no ano seguinte, como o vídeo documenta:

23 junho, 2018

Meu Coração Luso, Minha Alma Celta e Meu Sangue Mouro, gostam é do alho-porro



Foi há cerca de 30 anos, finais da década de 70, que passeei Minha Alma Celta pela noite de São João, no Porto. Passados tantos anos não consigo lembrar quantos foram os sorrisos e toques recebidos com aqueles alhos floridos de nome para mim estranho. Não sei quantos, mas foram muitos. De quando em quando, uma ou outra rapariga mais atrevida, esfregava-me o rosto com aquela haste florida e era provocatório o sorriso.

Não me recordo de levar com um único martelinho, mas por certo já os por lá havia...

Aprofundando as origens dessa tradição, dei-me a várias  leituras e escolhi esta:
«A história do alho porro é anterior à era cristã e as fogueiras de São João cruzam fronteiras. Ao contrário do que muitos julgam, há festas populares e fogueiras de São João de Florença ao Brasil. A tradição repete-se um pouco por todo o mundo cristão, que nalgum momento da sua história se cruzou ou herdou o legado da presença celta.
Os celtas, essas gentes que fundaram o primeiro burgo que haveria de dar origem à povoação romana de Portus Cale [o berço do Condado Portucalense], eram politeístas e correram boa parte da Europa antes de Cristo ter nascido na Galileia. Por isso, não queriam saber da festa de São João para nada. Mas celebravam com pompa e circunstância o Solstício de Verão, que quase coincide no calendário com o dia do santo.
Nessa grande festa de homenagem à Deusa-Mãe Natureza, os celtas faziam fogueiras e ofereciam ervas aromáticas à divindade. Os festejos de S. João [como os de muitos outros santos cristãos] recuperaram este ritual pagão.
As ervas aromáticas que são queimadas variam consoante a latitude do globo - o alho porro pode ser substituído pela alcachofra -, mas a origem do ritual tem um fim comum: espantar o mau olhado, garantir proteção para o ano inteiro e homenagear a fecundidade dos seres humanos e culturas. Tudo em honra da grande Deusa-Mãe: a Natureza que tudo nos dá e garante a sobrevivência das espécies.»
A "tradição" do martelinho de plástico é mais recente, coloco as devidas aspas pois a um hábito de 50 anos, importado de uma criativa festa da Queima das Fitas da Universidade do Porto, tenho relutância em considera-la tradição. Embora a população do Porto a tenha adoptado como tal, o martelinho não tem o mesmo significado que o alho, nem o mesmo odor. Não vou ao ponto de considerar que é uma ruptura com a memória celta, com os seu valores, com essa herança, mas alimento a esperança do regresso ao alho.
Alinho com o abandono do plástico. O ambiente, esse, agradece.


20 junho, 2018

A identidade dos bairros e, ainda, o encerramento da "minha" Caixa


Hoje, de manhã, um vizinho do "bairro velho" lembrava que aquela agência da CGD foi uma resposta tardia às reivindicações da "comissão de moradores do Bairro da Medrosa". A partir daí, e durante a recolha de assinaturas contra o encerramento da Caixa, foi um desfilar de memórias. À memória dele, juntava eu a minha, somando o que foram as exigências para o arranjo dos logradouros, para que fossem de aterros passados a espaços ajardinados. Para que ali passasse a haver uma farmácia, um campo de futebol, uma escola. 

Depois de muita luta, de deslocações ao Fundo de Fomento de Habitação e à Câmara (que considerava o bairro clandestino) e depois dos moradores plantarem, com as sua próprias mãos, algumas árvores, lá cedeu a Câmara em ordenar e empedrar passeios, a ajardinar espaços e a colocar aparelhos para recreio da pequenada. 

Depois veio a escola, primeiro em barracões e depois no que é hoje a EB Beça Múrias (patrono que fora morador, e insigne jornalista). E veio a farmácia, primeiro num sítio e hoje noutro. E no que eram os barracões, hoje Centro Paroquial, por lá ensaiava a banda do Nélito (cujos acordes eléctricos, despertavam reclamações dos vizinhos do Bairro Velho) e se meia a tensão aos idosos, com a voluntária prestação de jovens médicos.

Tudo isto veio à conversa, numa jornada de recolha de assinaturas... 
Agora que reporto essa empenhada tarefa de hoje vieram à baila os rostos. A imagem acima (de 1973 ou por aí) é a única que tenho comigo, e está longe de retratar todos aqueles que contribuíram para dar identidade ao nosso bairro.

(memória, saudosa, dos que já partiram)

19 junho, 2018

Contra o encerramento da Agência da Caixa, cá no meu bairro...


O meu bairro, conhecido pelo "bairro novo das caixas", faz parte de um agregado urbanístico que integra "o bairro velho".  Estes bairros são originários do antigo sistema de previdência, um e outro construídos pela "Caixa de Previdência" e pela "Caixa Nacional de Pensões" respectivamente.

Junta-se a esses, um bairro de iniciativa municipal, mais recente. Estes três bairros alojam famílias da classe média baixa e neles residem cerca de 3800 eleitores, na sua grande maioria gente idosa e como já referi aqui, gente de magras reformas ou pensões.

Amanhã, a partir das 10h da manhã, vou estar à porta da CGD a recolher assinaturas, de um abaixo assinado, com o seguinte texto:

A Administração da Caixa Geral de Depósitos tenciona encerrar dezenas de balcões em todo o país. Entre esses balcões está o balcão da Medrosa, cujo encerramento está previsto para o final do mês de Junho.
BASTA! Toda a população local, e em especial os idosos, precisam dos Serviços Públicos! E a Caixa (CGD) é o banco público do Estado!
Não podemos permitir que se continue a financiar a banca privada e os seus desmandos com dinheiros públicos (que são o enriquecimento de alguns, com o fruto do trabalho de todos), e que depois se encerrem os serviços públicos, fundamentais às populações, alegando falta de recursos!
É pois hora de defender as populações e os interesses do Estado e exigir que o Governo através da Administração que nomeou para a CGD mantenha em funcionamento os balcões, fundamentais à população, como é o caso da Agência do Alto da Barra, na Medrosa!
Face ao exposto, os abaixo-assinados:
1. Exigem da Administração da Caixa Geral de Depósitos o recuo na decisão de encerramento da agência; 

2. Exigem da Junta de Freguesia da União de Freguesias de Oeiras e S. Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias, da Câmara e da Assembleia Municipal de Oeiras toda a solidariedade e diligências necessárias junto das entidades competentes para garantir a continuidade do funcionamento da agência;
3. Exigem ao Governo que actue junto da Administração da Caixa Geral de Depósitos para garantir a continuidade do funcionamento da agência.

17 junho, 2018

Uns desenham sonhos, outros constroem pesadelos


O rectângulo, a vermelho, assinala a localização da"Caixa", cá perto do meu bairro. O Macedo vai fecha-la e o Governo, que tem confiança no Macedo, deixa. Macedo, presidente da Caixa, redesenhou a nova rede de balcões e agências da "Caixa" segundo os cânones de Bruxelas. São cerca de menos 70, incluindo a "minha", que vai na leva. Bruxelas impõe à "Caixa" critérios de rentabilidade, os mesmos que se aplicam à banca privada.

Bruxelas está-se nas tintas para o que seja serviço público. O Governo, também assim, está-se nas tintas para o que seja lá isso de serviço público.

Macedo, que é um cumpridor zeloso das ordens de Bruxelas e do Governo, desenhou o pesadelo de dezenas de milhar de idosos, detentores de pequenas contas que movimentam magras pensões e reformas ou, quanto muito num caso ou outro, do seu pequeno pé-de-meia, amealhado durante uma vida inteira. Eles, os reformados, pensionistas e idosos, que paguem a gestão danosa!
«Empréstimos de dezenas de milhões de euros, ou por vezes mesmo de centenas de milhões de euros, concedidos com garantias frágeis, investimentos em aquisições de participações sociais e uma elevada exposição, através de crédito, a empresas espanholas que se relevou ruinosa, foram algumas das decisões que estão ainda hoje a pesar nas contas da Caixa. Acresce a este cenário uma investida no mercado brasileiro — um banco e uma corretora —, onde a Caixa acumulou prejuízos nos últimos anos. E uma operação em Espanha que se tornou desastrosa, obrigando inclusive à criação de uma espécie de ‘banco mau’, para separar os créditos tóxicos da atividade bancária e embelezar o banco. Espanha teve prejuízos de €488,4 milhões em 2011, devido a provisões e imparidades no valor de €1,6 mil milhões. Foram anos de euforia.»
Se há tantos a construir pesadelos, temos de continuar pela rua a combate-los e a desenhar sonhos (por gestos), para que se não lhe acabe o sorriso...

15 junho, 2018

Redacções do Rogerito (40) - [Campeonato do Mundo de Futebol]


Diz um senhor que por acaso é meu tutor que o futebol é a coisa mais importante de entre aquelas que não têm importância nenhuma e diz outro que até é cantor que a vida é feita de pequenos nadas pelo que ligando tudo talvez o primeiro jogo no campeonato tenha sido de encantar pois se a vida é feita de pequenos nadas e se um empatar  sendo o mesmo que nada mais vale isso que coisa nenhuma.

Eu desejo muito que Portugal seja campeão Mundial mas ao mesmo tempo receio que venha a acontecer aquilo que já acontece e que vai contra o que diz o meu tutor passando a ser o futebol a coisa mais importante e as que são verdadeiramente importantes passem a não ter importância nenhuma.

Uma referência especial ao Ronaldo para desmentir o cantor que canta que a vida é feita de pequenos nadas é que quem nada tem na vida se tivesse a massa que o herói desviou ao fisco seria muito rico.

Hoje no hat trick Ronaldo foi magnifico e por este caminho quero a selecção no Panteão!

Me assino
Rogerito 

13 junho, 2018

"A quadra é um vaso de flores que o Povo põe à janela da sua alma..."

Fernando Pessoa 

 
Desgarrada, datada *
Procurei desgarradas
Cantares de encantar
Só encontrei cantigas maradas
O povo perdeu seu cantar

O povo perdeu seu cantar
O povo perdeu o piu
Fartei-me de procurar
Cantigas ao desafio

Cantigas ao desafio
Com a alma posta à janela
Desgarrada, alguém a viu?
Alma do povo, que é dela?

Vale quem aqui deixou
Quadras bem rimadas
Quem os versos bem rimou
Sabe o peso das palavras

Sabe o peso das palavras
Sabe bem o sabor delas
Quadras bem rimadas
Postas nas nossas janelas

Postas nas nossas janelas
Como um regado manjerico
Boa noite meus senhores
Está na hora do namorico

Rogério Pereira
*12 de Junho de 2012 - pode encontrar este meu improviso, na área de comentários de uma tertúlia escrita que reúne mais de 60 quadras. É o meu post mais visitado de sempre, sinal que o povo não perdeu seu cantar... 

12 junho, 2018

Será que a comunidade internacional acredita no Pai de Natal?

Uma pesquisa google, em 24 de Abril, deu isto
 Outra pesquisa, na mesma data, isto dava

As datas, porque são simultâneas, parecem induzir o juízo que Kim foi a correr fazer o que achava que tinha que fazer para evitar a concretização da ameaça. A imprensa, chegou a passar essa mensagem subliminar. Trump chegou a afirmar isso. Fica uma pergunta. E depois outra.

A pergunta: o que leva mais tempo, destruir uma base nuclear ou fazer uma conferência de imprensa?
A outra: A comunidade internacional acredita no Pai de Natal? 

De qualquer forma, um encontro histórico 

11 junho, 2018

Eugénio de Andrade. Há 13 anos que partiu? Quem disse?


3 de maio de 1921 – 13 de junho de 2005
_______________
Éramos jovens: falávamos do âmbar
ou dos minúsculos veios de sol espesso
onde começa o vero; e sabíamos
como a música sobe às torres do trigo.

Sem vocação para a morte, víamos passar os barcos,
desatando um a um os nós do silêncio.
Pegavas num fruto: eis o espaço ardente
de ventre, espaço denso, redondo maduro,

dizias; espaço diurno onde o rumor
do sangue é um rumor de ave –
repara como voa, e poisa nos ombros
da Catarina que não cessam de matar.

Sem vocação para a morte, dizíamos. Também
ela, também ela a não tinha. Na planície
branca era uma fonte: em si trazia
um coração inclinado para a semente do fogo.

Morre-se de ter uns olhos de cristal,
morre-se de ter um corpo, quando subitamente
uma bala descobre a juventude
da nossa carne acesa até aos lábios.

Catarina, ou José – o que é um nome?
Que nome nos impede de morrer,
quando se beija a terra devagar
ou uma criança trazida pela brisa?
Eugénio de Andrade
DISCURSO TARDIO À MEMÓRIA DE JOSÉ DIAS COELHO
NOTA/ERRATA: A primeira data por mim referida para assinalar a morte de Eugénio de Andrade estava errada e foi entretanto corrigida.
Assim, aproveito a errata para dedicar este post à memória das minhas referências morais e intelectuais ligando-as a proximidade das datas de acontecimentos, uns felizes outros a lamentar: O nascimento de Fernando Pessoa; as mortes de Vasco Gonçalves, de Álvaro Cunhal, de Eugénio de Andrade. Coincidências que nos marcam e que nos passam rasteiras à memória.

10 junho, 2018

10 de Junho (Camões, hoje, não aceitaria o discurso de Marcelo)


«(...) Haverá ainda quem diga que esse homem cantou a expansão imperial, apesar de tudo, as conquistas imperiais do Oriente, e está portanto fora do nosso tempo e do nosso espaço históricos, e a sua epopeia ofende a consciência das Ásias e das Áfricas. Mas ele cantou a expansão portuguesa, na medida em que considerava que esta expansão era ou deveria ser a civilização ocidental levada a toda a parte, no que tinha de moralmente digno e de socialmente responsável. Ao escolher para assunto central da sua epopeia a viagem de Vasco da Gama, ele sabia perfeitamente que escolhia um momento decisivo da história universal; o encontro, para todo o sempre, para bem e para mal, da Europa com a Ásia, passando-se pela África. Momento decisivo dessa história do mundo, como eminentes historiadores insuspeitos de simpatias portuguesas ou imperialistas o têm proclamado e reconhecido. E, na verdade, esse encontro (e esse Império que, no tempo de Camões, com todos os erros e crimes, não era os impérios coloniais inventados pela Europa do século XIX, nem socio-moralmente inferior à desordem política existente então, como hoje, em toda a parte) simboliza aquilo mesmo que, mais tarde, nos nossos dias, veio a verificar-se. Porque as ideias de independência política e de justiça social pelas quais lutaram e ainda lutam os povos da Ásia e da África, e às quais se renderam os povos das Américas ao separar-se da velha Europa, não são as tradições tribais originárias por respeitáveis que sejam: são aquelas mesmas ideias que, geradas na Europa, da Europa se difundiram, tal como as naus do Gama partiram de Lisboa para uma das mais gloriosas viagens de todos os tempos. Isso Camões cantou: e vendo-o no seu tempo, e na visão do mundo que ele teve, sabemos que devemos relê-lo atentamente para saber, que ele, tão orgulhosamente português, entenderia todas as independências, se fosse em vida nosso contemporâneo como ele o é na obra que nos legou, para glória máxima de uma língua falada e escrita ou recordada em todos os continentes. O orgulho de ser-se alguma coisa, o inabalável sentimento de independência e de liberdade, disso ele falou, e sentiu como ninguém. É disso um mestre.» 
Discurso de Jorge de Sena, 10 de junho de 1977
 — o primeiro depois da “Revolução de Abril”.
Jorge de Sena fez, então, um discurso memorável. Por isso eu, como se fosse romagem, o revisito anualmente. Fiz isso há pouco e encontrei a explicação do porquê de nos discursos do Presidente  o nome de Camões ter estado praticamente ausente. Falar de Camões, seria inevitável falar do que Jorge de Sena falou. E isso, poderia ser mal entendido por Bruxelas... Sim Bruxelas não iria gostar que Marcelo viesse falar daquilo em que Camões era mestre.
Mas, fica-me uma certeza, Camões, hoje, não aceitaria o discurso de Marcelo. E ele sabe-o.

08 junho, 2018

A dramática redução da natalidade e uma mão cheia de razões para explicar porque anda arredada a cegonha de tantos jovens casais



Nos últimos tempos, e ainda agora, o tema da redução dramática da natalidade tem andado pelas páginas dos jornais sem que por lá ande, como devia, a reflexão sobre as causas. Proponho-me a isso, mesmo que não creia que as cegonhas sejam uma espécie em extinção, razão que basta para encontrar outras razões, que não essa.

Aqui vai uma mão cheia de razões:

07 junho, 2018

Diz o bom povo que a esperança é a última coisa a morrer, mas de que me serve a esperança viva se entretanto o teatro foi assassinado?


O destaque dado pela imagem não significa deixar de lado todos os outros casos. O meu Partido, como lhe era devido, lançou o alerta: "Sem orçamento e com as atuais regras e o atual modelo de financiamento às artes, o caminho que está a ser seguido levará à liquidação, em alguns casos, de estruturas com dezenas de anos de trabalho artístico". 

E enumerou muitos casos: o Teatro Experimental de Cascais; o Teatrão e a Escola da Noite, ambos de Coimbra; o Centro Dramático de Évora (Cendrev); o Teatro das Beiras, da Covilhã; o Teatro Experimental do Porto; a Seiva Trupe; o Festival Internacional de Marionetas e o Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI), também do Porto; o Teatro de Animação de Setúbal...

A lista é longa? 
Não é tudo, entre as 39 estruturas e projetos que ficam sem financiamento, ainda temos o Teatro Municipal de Almada. Na página do Teatro de Joaquim Benite pode continuar a ler:
«A Companhia de Teatro de Almada foi surpreendida com os resultados provisórios do concurso de financiamento às Artes, anunciado pela Direcção-Geral das Artes, que prevê um corte anual de cerca de 110 000€ ao financiamento anteriormente atribuído. Este corte, a ser levado a cabo ainda este ano, torna inviável a realização do Festival de Almada, que deveria decorrer entre 4 e 18 de Julho.
O Festival de Almada é considerado unanimemente o principal evento teatral do País e um dos mais importantes da Europa.»
Diz o bom povo que a esperança é a última coisa a morrer, mas de que me serve a esperança viva se entretanto o teatro foi assassinado?

06 junho, 2018

A póstuma vitória do PREC e o venerado defunto (para memória futura)

«O PREC acaba de obter uma vitória, ainda que póstuma, e na secretaria. O Sr. Carlucci já está a fazer tijolo.
É verdade, o ex-embaixador norte-americano em Lisboa (um dos pais da nossa democracia – um dos outros foi, como todos sabem, Mário Soares) deslocou-se em definitivo, e de forma natural, para a terra dos seus antepassados, onde certamente continuará a dedicar-se aos negócios, a jogar tennis enquanto espera pelo seu parceiro Otelo (outro especialista de terra batida) e claro, a conspirar pla democracia.
Já antes, em 1960 - e sempre, naturalmente, pla democracia - tinha conspirado com o sr. Mobutu Sese Seko, no Kongo, contra o governo de Patrice Lumumba. E, em 1964, também tinha supervisionado o estabelecimento da democracia no Brasil (municiando os esquadrões da morte e providenciando a eliminação física de dirigentes da oposição), depois do derrube do presidente João Goulart.»
 _____________________________

Ontem, dia 5, PSD, CDS e PS apresentaram na AR votos de pesar, todos eles aprovados pelos votos de uns e de outros, com pequenas diferenças. Segue-se o texto do voto apresentado pelo CDS
«Morreu no passado dia 3 de Junho, o Embaixador norte-americano Frank Charles Carlucci III.

Nascido em 1930, serviu por mais de duas décadas nos mais altos escalões da Administração norte-americana e trabalhou sob a égide de quatro presidências distintas, tendo chegado a ocupar o cargo de Secretário da Defesa, entre 1987 e 1989.

Diplomata de carreira, representou sucessivamente os EUA, ao longo de 12 anos, entre 1956 e 1968, em Pretória, Leopoldville (atual Quinxassa), Zanzibar e Brasília. Só em 1975 é que o diplomata norte-americano seria nomeado para liderar a missão diplomática em Lisboa, o seu último posto, cujo mandato ficaria marcado inexoravelmente pela sua intervenção política em favor das forças democrática contra o PREC durante o Verão Quente desse ano e na aproximação política e estratégica entre os dois Estados.

De todos os momentos da carreira de Frank Carlucci é à frente do posto em Lisboa que viria a revelar-se politicamente mais determinante. Firme na ideia de que o processo de transição e consolidação democrática não estava perdido, contrariamente à opinião de membros da própria Administração norte-americana, Carlucci bateu-se pela restauração da normalidade do processo democrático em Portugal, ao lado dos principais protagonistas políticos da resistência, Mário Soares, de quem era amigo pessoal, Francisco Sá Carneiro e Diogo Freitas do Amaral.

A persistência com que Carlucci se bateu, ao lado das forças democráticas, valeu-lhe, em 2004, a condecoração pelo Estado português com a grã-cruz da Ordem do Infante D. Henrique e a medalha da Defesa Nacional.

Assim, a Assembleia da República expressa o seu profundo pesar pela morte do Embaixador Frank C. Carlucci, apresenta as suas condolências às família e amigos, recorda a sua intervenção política na consolidação democrática do regime.

Palácio de S. Bento, 5 de junho de 2018,
O Grupo Parlamentar do CDS-PP»
Votação
Favor – PSD, PS e CDS - PP
Contra – BE, PCP e PEV 
Abstenção – PAN e 8 Deputados do PS 

05 junho, 2018

Há muitas Marias... mas quantas mais poderia haver?

Agora tenho um trabalho a que me vou dedicar: 
  1. Saber, investigar sobre o estado da arte no desporto escolar e no associativismo. 
  2. Perceber porque nenhum clube ou associação de Oeiras não esteve presente, se por lá anda e vive tanta (miúda) gente. 
  3. Saber e investigar se algo de semelhante foi feito no meu concelho que, sendo um concelho de muitos velhos, é uma terra de muitas Marias...

04 junho, 2018

Voltando à questão da eutanásia, quero que saibam que mudei de opinião!


Hoje, pela manhã, tropecei no facebook com um post de alguém com quem com alguma frequência troco comentários que escrevia que o meu partido se tinha coligado com o CDS. Respondi-lhe e ele voltou à carga, deste modo:
«...reitero que a posição do PCP é ignóbil, oportunista e contrária à opinião de muitos militantes comunistas, especialmente jovens, que discordam abertamente da posição esclerosada de um grupo de velhos acéfalos que continua a enganar os trabalhadores com amanhãs que cantam mas eles próprios sabem que nunca se concretizam. Estamos em pleno século XXI, mas o PCP continua com o discurso do século passado em relação ao mundo laboral. Era altura de algumas mentes anquilosadas acordarem para o tempo presente.»
Deixei-lhe lá um meu "ó" de espanto e fui rever argumentos, situando-me neste século. E mudei de opinião. Isto é, passei de uma posição moderadamente contra a eutanásia, para uma outra, radicalmente contra.

Eu era moderadamente contra num meu escrito, pois aceitava o princípio mas via como condição prévia o desenvolvimento da rede de cuidados paliativos para depois, então sim, se despenalizar o acto.
Passei a ser radicalmente contra depois de ter lido os testemunhos de Theo Boer, regulador da lei que enquadra o procedimento, em vigor na Holanda, primeiro país a legalizar a eutanásia. Supondo eu que Theo Boer não seja velho acéfalo, comunista e nem tenha mente anquilosada dou importância ao que ele diz, e diz assim:
  • "No geral, as mortes por eutanásia, que respondem oficialmente por 3% de todas as mortes na Holanda, aumentaram 151% em apenas sete anos." 
  • "A eutanásia na Holanda está fora de controle". 
  • "O que estamos vendo na Holanda é a" extensão incremental ", o constante aumento intencional de números com uma ampliação gradual das categorias de pacientes a serem incluídos."
Lêr tudo aqui


Aproveito para lembrar que o sistema de saúde holandês é frequentemente apontado como um dos melhores da União Europeia e é citado pela Organização Mundial de Saúde como exemplo em vários relatórios.

03 junho, 2018

Um conto ao Domingo - XVI ("O BILHETE" - Em duas partes)



Parte I (Escrito pelo AC)
Júlio olhava pela janela. Em frente, na pastelaria, algumas pessoas tomavam a bica ao balcão a olhar para o relógio. Na esplanada, indiferente à pressa geral, um casalinho gozava os raios de sol de um Verão tardio, enquanto deitava uns grãos de trigo a meia dúzia de pombos. Mais à direita, no jardim, viam-se alguns velhos, de sorriso apagado, a olhar para nenhures, como se as pessoas que por ali passavam, qual enxame de abelhas apressadas, nada lhes dissesse. Andavam quase todos na casa dos setenta e muitos, oitenta, e já pouco mais faziam que olhar para o escoar do tempo.
Às vezes Júlio abeirava-se deles e, com a sua presença, o pulsar do grupo alterava-se. Contava uma história engraçada de outros tempos, dizia duas ou três larachas, e o efeito era garantido: os sorrisos voltavam, por momentos, a introduzir-se naquela solidão mortiça. Joana, a filha, fora visitá-lo um dia destes à hora do almoço, cinco minutos roubados ao seu correrio diário, antes de ir aquecer a comida, feita na véspera, que ela e o marido iriam engolir num ápice. Perguntou-lhe como é que se sentia, se tinha tomado os medicamentos, se precisava de alguma coisa. Depois, a propósito de nada, começou a falar do Sousa, amigo de sempre do pai, que estava há uns tempos no lar.
- Sabe com quem estive? Com a Dora, a filha do seu amigo Sousa. Está a viver no lar, e parece que o tratam lá muito bem.
Nem ele sabia outra coisa! Há dias, em conversa de banco de jardim, o João Pires falara-lhe do destino do Sousa. A notícia tocara-o e, sem dizer nada a ninguém, fora visitar o seu velho amigo ao lar. Quando o viu, arrependeu-se logo de lá ter ido. Estava sentado na varanda, sozinho, alheado de tudo o que o rodeava. Ainda lhe puxou pelo sorriso com uma ou outra graçola, mas o Sousa, que noutros tempos distribuía entusiasmo a rodos, mostrava-se indiferente a tudo. Parecia que apenas aguardava que chegasse a sua hora.
Joana estava, nitidamente, pouco à vontade a aflorar o assunto, e tentou dissimulá-lo com a intenção de lavar a pouca loiça do pequeno-almoço. Nem reparara que o pai já a tinha lavado, deixando-a apenas a escorrer no lava-loiças. Disse-lhe, então, que estava preocupada com ele, que não gostava de o ver sozinho. E se lhe acontecesse alguma coisa, quem o socorria? Gostaria muito de o levar para o andar onde vivia, mas as três assoalhadas já eram acanhadas para ela, o marido e os filhos. Na semana passada fora tirar umas informações da Casa de Repouso do Pinheiro, e gostara do que tinha apurado. Era um lugar onde tratavam as pessoas com toda a dignidade, o sítio ideal para ele. Júlio não disse nada, apenas balbuciou um "está bem" quando a filha, à saída, o lembrou do almoço de domingo em casa dela. A conversa de Joana, no fundo, não o surpreendia, pois sabia que ela não tinha condições para o receber. Ela e o marido matavam-se a trabalhar, com um horário cada vez mais exigente, e o que recebiam mal dava para pagarem a prestação da casa. Houve uma altura em que pensou que talvez lhe arranjassem um cantito na sala para dormir, mas era ele a iludir-se com a possibilidade de acompanhar o crescimento dos netos, de os sentar nos joelhos enquanto os maravilhava com as aventuras do João Pequeno, história que o seu avô lhe contara vezes sem conta na sua meninice. Mas os tempos tinham mudado. Ao que sabia, os pequenos passavam o dia fechados no infantário, no meio de dezenas de outros reclusos, e só lhes concediam uma precária quando os pais os iam buscar no fim do trabalho. Mas pouco aproveitavam do seu quinhão de liberdade. Quando chegavam a casa, os pais colocavam-nos em frente da televisão enquanto faziam o jantar. Depois comiam e, passado pouco tempo, toca a deitar, que amanhã é preciso levantar cedo. E, no dia seguinte, num imutável ritual, lá iam todos para o mesmo ramerrame. Tinha pena deles, mas que poderia fazer? Raio de tempos, estes!
Depois da filha sair, Júlio ficou mergulhado num turbilhão de pensamentos inconsequentes. As suas palavras, embora não o apanhassem desprevenido, tocaram-no como nunca pensara. Começou a dar voltas à casa, tentando ordenar ideias, mas a sensação de aperto não saía do seu peito.
Foi então que tomou uma decisão. Ainda pegou numas roupas para colocar na mala que guardava no roupeiro, mas abandonou a ideia. Dirigiu-se para a cómoda e, com todo o cuidado, retirou um estojo do fundo de uma das gavetas. Abriu-o, delicadamente, e olhou para o colar que em tempos tinha comprado para Maria, a sua mulher, pequeno luxo a que se permitira para presentear a companheira de muitas vicissitudes e alegrias. Mas ela morrera, em penoso sofrimento, uns dias antes do aniversário, vítima de um cancro de mama tardiamente diagnosticado, e o colar para ali ficara guardado como uma relíquia.
Tomou banho, perfumou-se e vestiu o seu melhor fato. Depois, delicadamente, pegou no estojo, guardou-o no bolso interior do casaco e saiu de casa.
Desceu a avenida muito direito e compenetrado, como se estivesse a escolher os movimentos certos para não engelhar o fato. Mas, ao chegar junto da estação ferroviária, algo o fez vacilar. Parou, por instantes, e ensaiou um olhar para trás. Mas foi coisa de poucos segundos. Recompôs-se rapidamente e, de forma resoluta, abeirou-se da bilheteira:
- Um bilhete para longe, para muito longe!
Quando entrou na carruagem e descortinou o seu lugar, tirou o casaco e, com movimentos tranquilos, de quem sabe o que faz, sentou-se. Enquanto o ajeitava, cuidadosamente, sobre as pernas, a sua mão, num gesto quase inconsciente, procurou o contacto do estojo, como se da mais preciosa coisa se tratasse. Maria aguardava-o, não queria fazê-la esperar mais. 
Parte II (Escrito aqui, por mim, em forma de epílogo)
Contrariamente ao que esperava, a marcha da viagem durava. Comboio lento, pensava. Júlio olhou em volta procurando olhares de cumplicidade à sua muda reclamação, pois gostaria de a sua decisão ser assegurada com outra marcha.
Nenhum rosto, e eram muitos, partilhava a sua inquietação. No banco da frente um idoso macilento dizia a outro, um pouco mais novo:
- Leste isto? Não sei se decidimos bem! 
E estendeu-lhe um papel que o outro leu atentamente e como resposta, o mais novo, encolheu os ombros, exclamando:
- Deixei de acreditar nos políticos!
Dobrou o papel em quatro e preparava-se para o devolver...
- Posso ver?
Interpelou Júlio, num impulso. O idoso mais novo entregou-lhe o papel que Júlio, pousando o estojo, recebeu para, depois de o desdobrar, também o ler atentamente.
Quando acabou, Júlio pegou no estojo, levantou-se e percorreu a curta distância que o separava da porta da carruagem. E no momento em que a marcha ainda mais abrandava saltou da composição, e rumou ainda indeciso se iria direito a casa ou se antes passaria pelo infantário para beijar os netos...