Nota para não Escrever
Se o conhecimento é uma forma de escrita, mesmo sem palavras, uma respiração calada, a narrativa que o silêncio faz de si mesmo, então não se deve escrever, nem mesmo admitindo que fazê-lo seria o reconhecimento do conhecimento. Pode escrever-se acerca do silêncio, porque é um modo de alcançá-lo, embora impertinente. Pode também escrever-se por asfixia, porque essa não é maneira de morrer. Pode escrever-se ainda por ilusão criminal: às vezes imagina-se que uma palavra conseguirá atingir mortalmente o mundo. A alegria de um assassinato enorme é legítima, se embebeda o espírito, libertando-o da melancolia da fraternidade universal. Mas se apesar de tudo se escrever, escreva-se sempre para estar só. A escrita afasta concretamente o mundo. Não é o melhor método, mas é um. Os outros requerem uma energia espiritual que suspeita do próprio uso da escrita, como a religiosidade suspeita da religião e o demonismo da demonologia. A escrita - inferior na ordem dos actos simbólicos - concilia-se mal com a metamorfose interior - finalidade e símbolo, ela mesma, da energia espiritual. O espírito tende a transformar o espírito, e transforma-o. O resultado é misterioso. O resultado da escrita, não.Herberto Helder, in 'Photomaton & Vox'
uma espuma de sal bateu-me alto na cabeça,
nunca mais fui o mesmo,
passei por todos os mistérios simples, e agora estou tão humano: morro,
às vezes ressuscito para fazer uma grande surpresa a mim mesmo,
eu que nunca mais me surpreendo:
sou mais rápido — (...)
Herberto Helder, extrato de que gosto in "Servidões";
24 março, 2015
SAPOnews, 12h01min, numa mensagem (ignorante e pateta) informava-me da morte do Poeta. Sapo parvo. Os poetas não morrem, a não ser na cabeça e nas mensagens dos não-Homens
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A dança das palavras do H.Helder imprime em mim, a sensação de o conhecer pessoalmente. Continuarei com "passos em volta" no seu universo...
ResponderEliminarCaro Rogério, tem razão. Um poeta não morre.
ResponderEliminarQuem morreu foi o homem... e não o poeta.
Ele que ultimamente tanto falava na morte, chegou a vez dele de ser ceifado.
Um abraço Rogério
A poesia é eterna. Os poetas viverão enquanto houver no mundo quem os leia.
ResponderEliminarUm abraço
O Poeta não morreu...não, meu amigo!
ResponderEliminarBeijo meu
Silêncios em voz alta
ResponderEliminarAbraço
~
ResponderEliminar~ Libertou-se da «Lei da Morte»...
~ ~ Permanecerá... Sempre! ~ ~
~~Bj~~~~~~~~~~~~~~~~~
~
Tem razão o poeta não morre, pois a morte não pode alcançar tanta grandeza.
ResponderEliminarUm beijinho comovido
Fê
Ele continua por aí
ResponderEliminarCom a força toda que merece
O que interessa é o que ousou
Não mate o mensageiro, Rogério, ele não tem culpa!
ResponderEliminar"Onde está o mar? Aves bêbedas e puras que voam
sobre o teu sorriso imenso.
Em cada espasmo eu morrerei contigo."
Os espasmos serão eternos. O Poeta, também!
Abraço!
ele deixou a sua obra, isso é uma continuação do Poeta!
ResponderEliminar:)
Gostei do texto que escolheste do Herberto Hélder.
ResponderEliminarE gostei mais do comentário que deixaste, sobre a passagem do poeta para outro plano, que os "não-homens" designam como morte.
Um abraço.