02 fevereiro, 2015

Poesia (uma por dia) - 73

Biografia

Sonho, mas não parece.
Nem quero que pareça.
É por dentro que eu gosto que aconteça
A minha vida.
Íntima, funda, como um sentimento
De que se tem pudor.
Vulcão de exterior
Tão apagado,
Que um pastor
Possa sobre ele apascentar o gado.
Mas os versos, depois,
Frutos do sonho e dessa mesma vida,
É quase à queima-roupa que os atiro
Contra a serenidade de quem passa.
Então, já não sou eu que testemunho
A graça
Da poesia:
É ela, prisioneira,
Que, vendo a porta da prisão aberta,
Como chispa que salta da fogueira,
Numa agressiva fúria se liberta.


Miguel Torga, in "Antologia Poética", D.Quixote

8 comentários:

  1. A poesia parece-me agora um grito lançado debaixo de água, um rasto de azul gélido entre as mãos e a surdez sombria dos espaços vazios em redor.


    Um bom domingo!


    Lídia

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  2. .
    ~ Lavas ardentes
    ~ que aspiram liberdade
    ~ em sãs palavras
    ~ que servirão de adubo.

    ~ ~ ~ Excelente seleção. ~ ~ ~
    .

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  3. Torga, um homem igual a nós e paradoxalmente maior - grande!
    Um abraço entre versos

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  4. grande foi e ficou maior, o indignado Torga.

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  5. Um poeta/escritor que nunca me canso de reler.
    Morreu faz 20 anos, mas as suas palavras e alertas permanecem cada vez mais actuais.
    Bonita homenagem.

    beijinho

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  6. Grande o Poeta e o homem que não o esquece...

    Beijo

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  7. Boa memória, Rogério, a do Torga.
    ...
    espírito livre
    tronco vertical
    raízes profundas
    fixas na firmeza
    a terra gerou-o inteiro
    homem verdeiro ...

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  8. O Torga é assim. Coloca as palavras no seu outro sentido certo e, com isso, ajuda-nos a recentrarmo-nos a nós próprios, mormente aqueles que se deixam perder do sentido das palavras. Um poema do poema. Bela malha, caro Rogério!

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