Porque a Teresa ao ouvir o Jerónimo franziu a testa, amanhã lhe darei a ler o texto que passo a transcrever. A ideia não é de a tentar convencer pois também eu "Aprendi a não tentar convencer ninguém. O trabalho de convencer é
uma falta de respeito, é uma tentativa de colonização do outro."
A ideia é que reflicta sobre o que está em discussão, e depois forme opinião.
1 Vinte
meses passados sobre a rejeição de iniciativas em tudo idênticas não
houve factos novos. Nenhum país aprovou legislação semelhante, a
legalização da eutanásia está circunscrita a uma ínfima minoria de
ordens jurídicas.
2 As
razões que levaram o PCP em 2018 a assumir uma posição contrária à
legalização da provocação da morte antecipada permanecem inteiramente
válidas. Subsistem, porém, incompreensões em torno dos fundamentos desta
posição que se baseiam em equívocos que importa desfazer.
O
PCP não despreza as razões individuais de quem, confrontado com um
sofrimento insuportável em situação terminal, queira pôr termo à vida,
nem pretende condenar ninguém ao sofrimento.
Bem
pelo contrário. Só quem não conhece o profundo humanismo dos ideais
comunistas pode pensar tal coisa. O que o PCP considera é que devem ser
mobilizados todos os esforços e todos os meios técnicos e científicos
disponíveis para evitar o sofrimento humano em todas as circunstâncias,
respeitando a vontade do paciente, manifestada designadamente através do
testamento vital, evitando a má prática médica designada por distanásia
(prolongando artificialmente a vida através de obstinação terapêutica) e
promovendo a assistência adequada às circunstâncias até ao momento
inevitável da morte. Havendo a assistência médica devida, a morte é
sempre assistida. Questão diferente é ser antecipadamente provocada.
Perante
os problemas do sofrimento humano, da doença, da deficiência ou da
incapacidade, a solução não é a de desresponsabilizar a sociedade
promovendo a morte antecipada das pessoas nessas circunstâncias mas sim a
do progresso social no sentido de assegurar condições para uma vida
digna, mobilizando todos os meios e capacidades sociais, a ciência, a
tecnologia para debelar o sofrimento e a doença e assegurar a inclusão
social e o apoio familiar.
Para
o PCP, a humanização dos cuidados assistenciais no termo da vida, e a
diminuição ou eliminação do sofrimento, constitui uma parte substantiva
das incumbências dos serviços públicos de saúde, e está contida nas
próprias finalidades deontológicas da medicina. As sérias insuficiências
existentes nesse domínio, em Portugal, só podem ser reparadas pelo
reforço dos meios materiais e humanos no âmbito do Serviço Nacional de
Saúde.
3 Falta
muito para se cumprir o dever do Estado de garantir uma assistência
condigna às pessoas no termo da existência, diminuir ou eliminar o
sofrimento por meios médicos e de cuidados assistenciais gerais, em
condições de igualdade, sem discriminações. A medicina tem hoje recursos
eficazes para tratar a dor e diminuir ou eliminar o sofrimento.
A
existência de uma rede de cuidados paliativos e a garantia de cuidados
médicos adequados para evitar o sofrimento na fase terminal da vida
estão muito longe de ser uma realidade no nosso país. Muitos cidadãos,
particularmente os de menores recursos não têm acesso a esses meios.
Como pode então o mesmo Estado, que não garante condições dignas de
sobrevivência garantir condições legais para antecipar a morte?
No
plano legislativo já existe hoje em Portugal um instrumento (Registo
Nacional de Testamento Vital) que permite, dentro de limites
determinados, a um indivíduo de maior idade e capaz, manifestar
antecipadamente de forma autónoma a sua vontade, livre e esclarecida, no
que concerne aos cuidados de saúde que deseja receber, ou não deseja
receber, no caso de vir a encontrar-se incapaz de expressar
autonomamente a sua vontade pessoal.
Esta
manifestação antecipada de vontade, renovável de cinco em cinco anos,
permite à pessoa alterar ou renovar essa sua vontade. São assim
respeitados os direitos, quer do requerente, quer do médico, e de outros
profissionais de saúde, bem como admitido o erro de prognóstico,
possível apesar dos avanços das ciências biomédicas. Pelo contrário, a
rápida consumação da morte pelo procedimento da eutanásia torna qualquer
rectificação impossível.
O
reconhecimento da autonomia e da vontade da pessoa do doente tem lugar
no consentimento informado, no direito de suspender terapêuticas ou de
não as iniciar e na concretização das directivas antecipadas de vontade.
4 A legalização da eutanásia é normalmente apresentada como o reconhecimento de um direito.
O
direito a dispor da própria vida incluindo o direito a decidir da
própria morte. Não é assim. O direito à vida é um direito fundamental,
inalienável e irrenunciável. A morte é uma inevitabilidade que decorre
da própria vida, não é um direito fundamental. Se assim fosse, não se
justificaria o dever do Estado de proteger os cidadãos através de
medidas preventivas e proibitivas de comportamentos que ponham em perigo
as suas vidas. A autonomia individual é algo que deve ser respeitado,
mas uma sociedade organizada não é uma mera soma de autonomias
individuais.
Inscrever
na Lei a provocação da morte antecipada não é um sinal de progresso mas
um passo no sentido do retrocesso civilizacional, com profundas
implicações sociais, comportamentais e éticas que questionam elementos
centrais de uma sociedade que se guie por valores humanistas e
solidários.
A
aprovação de legislação que permita a provocação da morte antecipada,
não é uma necessidade social ou assistencial. A discussão suscitada
publicamente não resulta da reivindicação de direitos e necessidades
para as pessoas gravemente doentes, no termo da vida e com intenso
sofrimento, mas tem como principal sustentáculo um movimento de opinião
com forte apoio mediático, visando consagrar o direito à morte na forma
de eutanásia como se esta fosse mais digna.
5 O
recurso à eutanásia é por vezes apresentado como uma garantia de
dignidade. Para o PCP, a dignidade da vida humana não se expressa na
decisão de morrer. O que está em causa na legalização da eutanásia não é
a dignidade individual da opção de cada um sobre o destino da sua vida.
É a dignidade de um Estado que pretende oferecer condições supostamente
dignas para morrer a pessoas a quem nega condições dignas para viver.
As
iniciativas legislativas apresentadas pretendem basear-se na decisão
individual de alguém que, confrontado com uma situação de sofrimento
insuportável, pretenda pôr termo à vida. Mas essa pretensão é, em todas
as iniciativas, um mero pressuposto de uma decisão que não é tomada pelo
próprio, a não ser no momento inicial. A partir dele, toda a tramitação
e decisões são transferidas para um processo administrativo complexo,
onde são chamadas a intervir múltiplas entidades.
Em
boa verdade, a decisão da morte antecipada de um doente terminal em
sofrimento insuportável não resulta afinal da decisão do próprio, mas de
um acto administrativo que, como tal, não pode deixar de ser
recorrível.
Está-se
assim perante uma contradição insanável. O regime proposto não poderia
prescindir de cautelas extremas, mas tais cautelas relegam para um plano
secundário, quando não condenam à irrelevância, o sofrimento extremo em
que o pedido se baseou.
6 A
legalização da eutanásia é por vezes apresentada em analogia com a da
Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) que o PCP foi o primeiro
partido a defender. Falso argumento. O PCP sempre considerou a
despenalização da IVG como a resposta necessária a um flagelo social e
um gravíssimo problema de saúde pública. O PCP não defendeu a
legalização da IVG baseado em considerações individualistas ou como
método de planeamento familiar. O PCP considerou sempre, em primeira
linha, o perigo para a saúde e a vida das mulheres que constituía o
recurso ao aborto clandestino, e manifestou-se junto dos tribunais
quando as mulheres eram sujeitas a processos crime por interrupção da
gravidez, mesmo quando outros faziam depender a despenalização dos
resultados incertos de um referendo. O PCP defendeu a despenalização da
IVG em nome da saúde e da vida. Não há nenhuma comparação com a defesa
da antecipação da morte.
Também
não é justo associar a posição do PCP sobre a eutanásia a concepções
religiosas, pelo facto de as principais religiões a condenarem. As
razões do PCP são diversas. As religiões baseiam a condenação da
eutanásia na origem divina da vida. O PCP respeita quem assim pensa, mas
baseia a sua posição em razões de ordem social: no respeito pela
dignidade da vida e por considerar que é o dever do Estado tudo fazer
para garantir condições dignas de existência até ao fim da vida.
Ao
contrário do que se pretende fazer crer, não há nenhuma tendência
internacional no sentido da legalização da eutanásia. Os países que
adoptaram legislação nesse sentido continuam a ser casos isolados
(apenas quatro em toda a Europa), e os efeitos dessa legislação têm
vindo a causar sérias apreensões, tendo em conta que o número de «mortes
assistidas» cresceu muito para além do que era suposto e previsível.
A
Holanda é o país que mais a pratica, sendo uma percentagem
significativa das causas de morte (cerca de 4,0%). A legalização da
eutanásia levou a frequentes abusos e práticas para lá das disposições
da lei cujo cumprimento se tem revelado difícil controlar.
Na
Suíça, está instituída uma verdadeira indústria do suicídio assistido.
Aí prolifera um «turismo da morte», baseado em empresas que oferecem os
seus serviços recorrendo a um marketing agressivo destinado a aliciar
potenciais clientes. Basta aceder aos sites dessas organizações para
verificar o «interesse» com que acompanham a possibilidade de
despenalização da eutanásia em Portugal.
A
realidade dos países que legalizaram a eutanásia não é exemplo que deva
ser seguido em Portugal. Não se trata de processo de intenções nem de
aplicação da teoria da «rampa deslizante». É a simples observação de uma
realidade que não queremos no nosso país.
7 Os
projectos apresentados são idênticos nos procedimentos, com pequenas
variantes. Provocar antecipadamente a morte a pedido do doente,
administrando uma injecção ou facultando um comprimido de um veneno
letal, não corresponde ao significado real da expressão «antecipação da
morte» ou da expressão «morte medicamente assistida». Essas formas de
dizer revelam a ocultação ao grande público do que se trata de facto:
provocar a morte antecipada directamente, a pedido do doente. A morte
provocada deliberadamente está fora da medicina.
8 O
PCP reafirma a sua oposição a legislação que institucionalize a
provocação da morte antecipada, seja qual for a forma que assuma, bem
como a propostas de referendo sobre a matéria.
Num
quadro em que, com frequência, o valor da vida humana surge
relativizado em função de critérios de utilidade social, de interesses
económicos, de responsabilidades e encargos familiares ou de gastos
públicos, a legalização da provocação da morte antecipada acrescentaria
novos problemas.
Desde
logo, contribuiria para a consolidação das opções políticas e sociais
que conduzem à desvalorização da vida humana e introduziria um relevante
problema social resultante da pressão do encaminhamento para a morte
antecipada de todos aqueles a quem a sociedade recusa a resposta e o
apoio à sua situação de especial fragilidade ou necessidade.
Não
se pode iludir assim os riscos, em particular numa sociedade
determinada pelo capitalismo, de uma deriva economicista como forma de
aliviar os encargos com a saúde ou a segurança social.
O
PCP continuará a lutar para a concretização no plano político e
legislativo de medidas que respondam às necessidades plenas dos utentes
do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente no reforço de investimento
sério nos cuidados paliativos, incluindo domiciliários; na garantia do
direito de cada um à recusa de submeter-se a determinados tratamentos;
na garantia de a prática médica não prolongar artificialmente a vida; no
desenvolvimento, aperfeiçoamento e direito de acesso de todos à
utilização dos recursos que a ciência pode disponibilizar, de forma a
garantir a cada um, até ao limite da vida, a dignidade devida a cada ser
humano.
É
esta a concepção de vida profundamente humanista que o PCP defende e o
seu projecto político de progresso social corporiza. Uma concepção que
não desiste da vida, que luta por condições de vida dignas para todos e
exige políticas que as assegurem desde logo pelas condições materiais
necessárias na vida, no trabalho e na sociedade.»
Jornal «Avante!» de 13.Fev.2020
A minha opinião está formada há muito tempo e baseia-se, em grande parte, nos mesmos argumentos que os que ontem foram publicados no Avante!, e que hoje aqui nos trazes.
ResponderEliminarAbraço.
TODAS as Teresas torcem o nariz, quando ouvem as palavras do Jerónimo ⁉️
ResponderEliminarMaria João,
ResponderEliminarO "Avante!" não é o único jornal que leio
mas é dos poucos que merecem atenção
Teresa,querida amiga
Manipuladora e excessiva
Um franzir de testa, significa apreensão
Um torcer o nariz, significa rejeição
A minha Teresa, depois de ler
ficou a entender
e mais ainda quando lhe mostrei
o papel a preencher
Quanto ao teu "TODAS"
eu chamo a isso
totalitarismo
A vida não se referenda
ResponderEliminarDesculpa o meu comentário, Rogério‼
ResponderEliminarRealmente, o tema é demasiado sério para brincadeiras.
Sou a favor de um referendo. O povo é que deve ser ouvido e, não os partidos.
Desculpado o comentário, o que fez tranquilizar a "minha" Teresa foi uma passagem, esta:
ResponderEliminar«No plano legislativo já existe hoje em Portugal um instrumento (Registo Nacional de Testamento Vital) que permite, dentro de limites determinados, a um indivíduo de maior idade e capaz, manifestar antecipadamente de forma autónoma a sua vontade, livre e esclarecida, no que concerne aos cuidados de saúde que deseja receber, ou não deseja receber, no caso de vir a encontrar-se incapaz de expressar autonomamente a sua vontade pessoal.
Esta manifestação antecipada de vontade, renovável de cinco em cinco anos, permite à pessoa alterar ou renovar essa sua vontade. São assim respeitados os direitos, quer do requerente, quer do médico, e de outros profissionais de saúde, bem como admitido o erro de prognóstico, possível apesar dos avanços das ciências biomédicas. Pelo contrário, a rápida consumação da morte pelo procedimento da eutanásia torna qualquer rectificação impossível.
O reconhecimento da autonomia e da vontade da pessoa do doente tem lugar no consentimento informado, no direito de suspender terapêuticas ou de não as iniciar e na concretização das directivas antecipadas de vontade.»
Todos merecemos respeito.
ResponderEliminarSe a vida é um presente.
Eu não compreendo estas mentes.
Tão mesquinhas.
Sorrisos de vida.
Megy Maia