19 dezembro, 2010

Homilias dominicais (citando Saramago) - 20

Além de cantar enquanto trabalhava, minha mãe tinha o hábito de empregar com frequência ditos e provérbios, uma maneira muito alentejana de sentenciar. Ela tinha sempre uma expressão para as situações mais diversas. Quando um dia alguém contava um um acto aparentemente tresloucado de uma vizinha considerada como se dizia "boa gente", minha mãe comentou: "Não estava em si. Foi a dor por ela". Sempre o que minha mãe dizia me ficava registado como se fosse um grande saber. Vindo de minha mãe, só tinha que ser. Fiquei desde aí com a certeza que cada um de nós tem outros eus e temos um eu dorido que até pode cometer loucuras, pode ser um doido varrido...
Sempre me ficaram as palavras de minha mãe como certeza de haver mais alguém em nós para além de nós mesmos e recentemente evolui no entendimento de quem realmente somos. Cheguei a uma trindade, sem mistérios divinos: Eu, o Meu Contrário e a Minha Alma. Não, não são apenas personagens de um livro que ando a escrever. Aquela trindade não é uma formula literária nem é uma habilidade pedagógica para explicar a dialéctica do nosso ser. Também não sabia exactamente o que seria. Acabo de descobrir por José Saramago. Acho que é a ironia imperfeita de mim mesmo, procurando a perfeição...

HOMILIA DE HOJE

Ironia perfeita - "Fernando Pessoa é o irónico por excelência. E toda essa invenção dos heterónimos é uma obra-prima de ironia. Esse dotar de voz própria ao conjunto de “eus” que convivem em cada um de nós parece-me a ironia perfeita."
“Saramago: ‘La CE, un eufemismo”, El Independiente, Madrid, 29 de Agosto de 1987

O que caiu no esquecimento - "Nos meus livros, a História não aparece como reconstrução arqueológica, como se tivesse viajado ao passado, tirado uma fotografia e relatasse o que mostra essa imagem. O que eu faço nada tem a ver com isso. Eu sei ou creio saber o que se passou antes e revejo-o à luz do tempo em que vivo. Quando me perguntam se escrevo novelas históricas, respondo que não, pelo menos não no sentido oitocentista da palavra tal como o faziam Alexandre Dumas ou Walter Scott ou Flaubert em Salammbô. A minha intenção é a da procura do que caiu no esquecimento pela História."
Con el escritor portugués José Saramago: ‘La escritura es otra forma de realidad”, El País (Suplemento Cultural), Montevideo, 24 de Junho de 1994
Os textos de Saramago foram retirados daqui

8 comentários:

  1. Um excelente posT.Até porque acho também que não somos um ser monolítico nem que nos conheçamos totalmente.

    Um bom dia para si.

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  2. Passando para desejar feliz natal a vc e sua família e dizer que ando vindo pouco aqui, mas é por falta de tempo.Logo essa correria acaba e enfim minha vida volta ao normal, daí voltarei para ler tudinho...

    Beijos em seu coração.

    Salete Cattae

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  3. Meu amigo:
    As mães são sempre sábias.
    Eu sempre tive guardado dentro de mim um eu diferente, sonhador, utópico por vezes, ultimamente ele anda a renascer, talvez pela convivência salutar e amiga que tenho desenvolvido aqui.
    Bem, mas como vou estar mais ausente;-), o meu propósito hoje é desejar um Feliz Natal, cheio de Saúde, Amor e Paz para si e para os seus familiares.
    Beijinhos a todos

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  4. Rogério
    Quantos ensinamentos os nossos Pais nos deixaram. Quanto eles nos são úteis.
    Abraço

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  5. Olá Rogério
    Acho que somos mais de 3 , somos um para cada situação. As mães,sempre sabem das coisas.
    Feliz Natal
    Grande abraço

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  6. É a sabedoria das mães a falar mais alto.
    Um Feliz e Bom Natal.

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  7. Amigo Rogério!

    Muito bem exposto e conjugado na perfeição com o que se propõem fazer...ou melhor dito, o que tem feito... lembrar o que aparentemente foi esquecido.

    Quanto ao eu, o meu contrário e a minha alma, essa trindade, não sei muito bem se ela explica tudo!
    Em nome dessa dita "loucura" que todos temos, cometem-se hediondos e não é feita a justiça correcta.
    Se alguém perde a razão e mata alguém, esse ser contrário merece ser castigado, ou não????????

    Aproveito para deixar votos de Feliz Natal.
    Estarei ausente até ao fim do Ano!
    Este Natal …

    Um tempo,

    Um espaço,

    O abraço.

    É o Natal de sempre

    Igual a outros Natais de outros tempos,

    Igual a si mesmo na manifestação,

    Na celebração,

    No acontecimento.

    Todo o enfoque que lhe damos,

    Tudo que o envolve amarra e ata

    São proveito e proventos

    De manifestações acordadas,

    Temperadas e outorgadas

    Pelos tempos instalados,

    Presentes no desassossego

    Das nossas vontades,

    Ausentes na luz da madrugada

    E na lonjura do brilho da safira.

    O Natal será sempre

    Um Tempo,

    Um Espaço,

    Uma época,

    De sementeira de amor,

    De enxugar a dor

    No grito gritado,

    No dardo lançado,

    Na meta traçada,

    Na mão amarrada

    Ao cais da esperança.

    O Natal deste tempo

    Será sempre e quando

    O Homem estiver disponível

    Na leira do seu coração.

    Natal de 2010

    Maria José Areal

    Beijinhos

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