08 maio, 2016

Poesia (uma por dia) - 85

AS PALAVRAS DO MEDO
E O MEDO DAS PALAVRAS

Oiço as palavras e começa um jogo:
Um jogo de traições e sombras;
e as pobres palavras,
repetidas até à exaustão,
começam a cansar-me
como se tivessem sido escolhidas
para definirem a indefinição
ou matarem de cansaço este cidadão indefeso.

E são atiradas de cima,
dos que se julgam liderar o que não lideram,
munidos de uma jactância superior
e as atiram ao rebanho (julgam eles)
de todos nós,
atentos, veneradores e obrigados,
como num “antigamente” repulsivo.

Martelam-nos o cérebro com o consenso
como se a palavra pudesse resolver,
por ela própria, diferenças insanáveis
na forma de encontrar o caminho comum
que nos afastasse deste “inverno do nosso descontentamento”
Mas, que de tão martelada,
nos impede de ouvir a expressão “bom senso”
que alguém mais inteligente e, sem medo das palavras,
nos fala da única forma de construir o futuro.
Outra palavra que, sem qualquer culpa própria,
é hoje usada para nos martirizar o entendimento,
e foi traída no seu mais puro sentido
pelos “vendilhões do templo” financeiro,
deve sentir-se agora muito desconfortável:
- a suave palavra conforto.

Os discursos políticos que colocam uns
na sua “zona de conforto” do poder discricionário
ou os que tentam roubar o “conforto” alternativo
aos ambiciosos desse mesmo poder
apenas nos conduzem a um desconforto colectivo
que irá desaguar, cedo ou tarde, na tal palavra
que um dia, sem medo, deveremos pronunciar
como causa maior da verdadeira luta política:
- o confronto !

Só fazendo a catarse das palavras do medo,
conseguiremos acabar com o medo das palavras.
Politicamente, o bom senso e o confronto
Salvarão mais vidas que o consenso e o conforto.
Mas isto, é apenas o que eu penso.

_________________________________
Este poema foi declamado, sábado passado, na abertura do ENCONTRO CDU, em Linda-a-Velha (Oeiras), no Auditório Municipal Lourdes Norberto,  onde o "Intervalo Grupo de Teatro" actua e o Fernando Tavares Marques é actor destacado. A peça em cena, "Doze Homens em Fúria", recomenda-se.
Na imagem acima, em primeiro plano, um jovem e promissor quadro autárquico da CDU - é vereador suplente na CM de Oeiras. Nuno Boavida, de seu nome.

7 comentários:

  1. Acabadinha de regressar do hospital, ainda sem conhecer os resultados dos exames complementares de diagnóstico, aplaudo este poema de Fernando Tavares Marques!

    Maria João

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    Respostas
    1. Então e este?

      A MÁQUINA DO FUTURO

      Os Donos disto Tudo
      (os verdadeiros, que nem sequer conheces)
      tinham inventado,
      construído e exportado
      em direcção ao sul,
      uma máquina sofisticada
      muito bem oleada,
      embalada a primor com laços e uma flor
      mas que desembrulhada
      e posta em movimento
      mais parecia um cilindro
      ou rolo-compressor.

      Mas os seus mandatários
      fizeram uma festa e um grande foguetório
      a dizer que era este o transporte ideal
      para um povo simplório.

      E o cilindro lá foi comprimindo
      A vida e os sonhos dos povos do sul.
      Onde o sol brilha mais e o mar é azul.
      Eis que de repente
      esta nossa gente de tão comprimida
      achou que era tempo de mudar de vida.

      Parou o cilindro, despediu capatazes
      e pôs-se a construir o melhor transporte
      que formos capazes.
      Pode não estar pronto, que o futuro demora,
      Mas é mais bonito por dentro e por fora.
      Para o amesquinhar,” amigos da onça”
      Dizem que o seu nome é a “geringonça”.
      Mas há tanta gente que precisa dela
      Que a sonha ver pronta p’ra seguir com ela.
      Não sendo perfeita, vai-se melhorando
      porque este projecto, sendo original,
      é feito por nós, é artesanal,
      pois é com trabalho que a coisa se faz
      e tem um cartaz: “MADE IN PORTUGAL!”
      A questão maior que faz afligir os senhores do Norte
      é o medo enorme de que a gente a exporte.
      Para eles, pode ser muito duro
      mas a “geringonça” tem mesmo futuro!

      fernando tavares marques

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  2. Gostei muito. Li-o ontem reli-o agora.
    Abraço e uma boa semana

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  3. Já li os dois, mas confesso que gostei mais do AS PALAVRAS DO MEDO
    E O MEDO DAS PALAVRAS
    que poema excelente e bem escrito!
    gostei muito!
    beijo
    :)

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