Variações do branco
Ergues o olhar: surpreendes por instantes essa horaem que o mundo envelhece: ténues as variações do brancoparecem dissolvê-lo numa longínqua música, anterior à chuvaOu será então a imagem submersa de um filme a preto e brancoHá próximo um branco vibrante: o da cal ainda recentemas que a humidade salina já a espaços mordeu,recortando as feridas cinza na varanda a que vens.Não há ninguém aqui. Quem te chame, digo.Há o branco baço na parede que em frente em vão separarua e praia. Tendo já transposto essa fronteira incertaou erguendo-se para lá dela há o branco pobre da areia:As dunas plenárias sustentam os corpos deitados de mar e céu.Aí é agora o grande branco: o clarão velado e difusoque guarda e distribui a memória embaciada do azule do verde, do oiro e da prata — uma lembrança vã.Tu escreves no visível do mundo essa névoa branca e desoladaque o motor da paisagem produz. As folhas do ar são comose fossem as levíssimas pétalas, as vagas sílabas de uma neve –e essa névoa engolfa, atrasa e apaga na travessia os simulacrosdas coisas supostas e imaginadas que o mundo te enviaenquanto esperas por alguém que não virá
09 novembro, 2023
MANUEL GUSMÃO (In memoriam - 1945-2023)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Uma notícia triste.
ResponderEliminar