Fui buscar este caçador à margem sul, onde existe um mar arável. Silencioso, não lhe descobri qualquer palavra até chegar a casa. Depois, dia após dia, foi-me desenrolando prosas de encantar. Contou-me como eram os ternos olhos dos câes, como conheceu o cego das esquinas, como se cruzou com a senhora da limpeza e, antes de revelar os seus segredos de caçador de relâmpagos, como se rendera à senhora ministra. Meti-o no bolso para o continuar a ouvir em qualquer lugar e foi hoje que isso aconteceu:
"Enquanto aquele anjo permanecer nas areias, bem pode o vento soprar
- O cão ou o velho?
Lentos, trôpegos, com os pés a tracejarem os caminhos de sempre, todos os dias aquelas almas percorriam memórias.
O cão – mais velho que o dono – era o guia, a sua bengala de cego.
Pela orla da praia, desde a gruta onde viviam até à colossal duna, abrupta sobre as águas, as aves marinhas mergulhavam a pique esbracejavam só para os salpicar. Lá iam, serenos, livres, sem palavras – imensos.
No ar, o sussurro dos silêncios embalava-lhes os passos num concerto de maresias.
Chegados ao topo da montanha era sempre assim – o velho afagava as orelhas do cão e o cão lambia-lhe as mãos.
Sentados – respiravam infinitos – o perfume das algas – adormeciam no tempo.
Ao longe, muito ao longe, alguém de um barco bramou:
- Fuja, a duna vai desmoronar-se.
Imperturbável, respondeu baixinho para não acordar o cão:
- A duna sou eu. "
--
Contado por Eufrázio Filipe in "O Caçador de Relâmpagos"/pág. 54
Andou muito Bem ocupado... eu estou à espera de mudar de óculos para ler um livro que me deu o meu miúdo no Natal... não é este, mas quem sabe... poderá ser o próximo :)
ResponderEliminarBjos
Bonita história que hoje nos trás.
ResponderEliminarEncantam-me os olhos dos cães.
Se os homens fossem amigos uns dos outros, como os cães são amigos dos seus donos, este mundo era um jardim
Isa,
ResponderEliminarO autor -
esse, do tal Caçador
- comentou-me um dia
que a educação dos filhos
aos pais, seria
o melhor que poderia acontecer
para os pais poderem crescer
(boa prenda a do seu filho)
Luis Coelho
ResponderEliminarPortugal é um jardim à beira mar plantado...
É, é, não fique assim pasmado
(não é, é para todos...)
Grato
ResponderEliminarAbraço amigo
Caro Rogério
ResponderEliminarCruzei-me com o Eufrázio certamente muita vez. Nunca fomos intimos. Mas partilhámos a mesma sala de reuniões e até grandes "salões". Se não fosse a blogosfera, provavelmente numa mais trocaríamos "impressões". Conheço-o como autor das vezes em que foi notícia. Estou envergonhado, pois acho que não tenho um unico livro dele, não sei mesmo se alguma vez tive.
Obrigado pela forma como sintetizou o "Caçador de relampagos" vou à procura dele.
Espero que o Eufrázio não volte a este post, pois a vergonha sería maior.
Abraço
Amigo Rogério,
ResponderEliminarQue linda maneira de incentivar os amigos a lerem outro amigo.
Por mim informo que estou cativada.
Abraços e um Bom Ano Novo
Excelente sugestão.
ResponderEliminarAbraço
Olá Rogério.
ResponderEliminarBonito de se ver essa sua faceta admirável, de dar a conhecer Obras e Autores das Artes e das Letras. Sempre, com a mesma simplicidade de quem nada faz demais e, no entanto, está a prestar um grande contributo ao incentivo à leitura e ao conhecimento acerca de escritores e artistas pouco divulgados.
A isso eu chamo solidariedade e grandeza de espírito.
Parabéns.
Beijo Janita
Fui espreitar.
ResponderEliminarVou tentar encontrar o livro. Este extracto convenceu-me.
L.B.
Não conhecia este espaço, com um titulo sugestivo... conversa avinagrada... gostei do que li por aqui.
ResponderEliminarDeixo os meus votos de um bom ano para si.
Abraço
Chris
Eu,
ResponderEliminargosto de quem brinca bem com as palavras
Meu Contrário
alerta para o facto de o que determina a divulgação não é nada de generoso mas, pelo contrário, por profundo egoísmo ( está convencido que com gente mais culta e humana terei um mundo melhor para mim...)
Minha Alma
não comenta, anda por aí a ler, em voz alta, as diabruras do Dique (quando lerem o livro compreenderão a euforia...)
Se eu retirar a "solidariedade e a grandeza de espírito", promete que o seu Eu retira o "brinca"??
ResponderEliminarTá bem Janita
ResponderEliminarFaço-lhe a vontade porque a acho bonita
(mas fique sabendo que brincar foi a coisa mais séria que soube fazer na vida...)
Obrigada! Pensando melhor vou só retirar a "grandeza de espírito".
ResponderEliminarBrincar, no sentido de não levar a vida muito a sério, é óptimo e favorece a longevidade. Adoro isso!
No contexto em que entendi( e o Rogério o disse) o seu "brinca" é que não.
Moral da história: "Tudo está bem...quando acaba bem..."
Beijinhos
Janita
Amigo Rogério:
ResponderEliminarCada vez que aqui venho, descubro outros mares, neste caso aráveis ;-)
Já vi o livro à venda, gostei da título e da ilustração da capa, mas nada sabia sobre ele, até agora.
A minha próxima compra decerto.
ps:
Com que então gostou de "louras" no tempo em que eu sonhava com louros do cinema ;-)))
beijinhos
Sou suspeita (escrevi por lá umas palavritas)
ResponderEliminarum prazer enorme ver aqui publicitada tal obra. Enorme o talento do autor. E a mensagem.
Bem-haja
Mel
Mel,
ResponderEliminarEu as li
E também as ouvi da tua boca quando fui buscar o meu Caçador...
Várias vezes estive para deixar
um comentário lá no teu lugar
Palavras assim valorizam uma obra mesmo se ditas com voz trémula de emoção. Nas palavras escritas isso também se nota. São palavras bonitas, palavras doces, palavras de Mel...
Saudades deste lugar e de vc... Espero ter tido um Final de Ano feliz e que o seja muito mais neste novo ano que se inicia. Você é um presente para seu amigo... bela forma de homenagear alguém. Isso é sensibilidade!!!
ResponderEliminarli e gostei. espreitei o cantinho e fiquei fã... voltarei lá, por certo. quanto ao livro... para mim, os livros são um spa para a alma... e este parece-me o certo para os próximos dias...
ResponderEliminarobrigada pela partilha, abraçinho :)