“Estética do Domínio”
Tornaram bonitas as barrigas inchadas dos meninos pretos,
as moscas vagueando pelas bocas dos famintos,
tornaram heróis quem lhes manda arroz à beira do prazo de validade,
quem usa na lapela um broche de caridade.
Arrepiam-te os olhos esbugalhados da criança em sangue,
mas entorpece-te a habituação, toma-te uma certa vontade que se esgota
no anúncio do patrocinador do world press photo.
Imunizam pela estética a revolta, volvendo-a piedade,
os ossos da miséria montam cadáveres pelos campos estéreis,
arrasados pelo napalm e fósforo da liberdade.
Contemplação de um belo nascido do lodo que esconde
o que mais feio há na verdade.
Que belo não é o choro, é o que o acaba.
Não é a fome, mas o que alimenta.
Belo não é o osso despido, mas a pele que o cobre,
belo não é carpir lamentações, é fazer revoluções.
Miguel Tiago
03 janeiro, 2015
Há poemas-bandeira, poemas-denúncia, poemas-grito. O "Estética do Domínio" é tudo isso e aponta um caminho. É um hino!
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Tive que ler duas vezes, confesso.
ResponderEliminarMuito bom este trabalho. Seria de esperar outra coisa?
Como é que este puto, que trabalha mais que um homem, mais do que dois deputados do PS, mais do que três da maioria, ainda consegue ter o espírito liberto que exige a poesia?!
ResponderEliminarGostei do risco onde entrou este poema.
Um abraço para a conversa avinagrada para não entornar o vinho azedo
Já o admirava como deputado, passei a admirá-lo agora como poeta !
ResponderEliminarUm poema que abala as consciências.
beijinho amigo Rogério,obrigada por esta partilha!
Fê
A poesia não tem limites
ResponderEliminarPoema duro por de mais! A vida é dura, diga-se.... mas vale pela beleza e pela força do último verso.
ResponderEliminarNão lhe conhecia a veia poética, não senhor!