107 – “será a selectividade da memória a forma do corpo assegurar a sobrevivência da alma?” – Diz-se que a memória é selectiva e que guarda apenas emoções desde que elas não abalem a mente da gente. A mente, a minha, não é mais do que o Meu Contrário e ele não se sente hoje minimamente abalado. Segredo? Não se lembra de nada, nem dos primeiros beijos de chegada, nem o sentir dos corpos, nem o risos nem os sorrisos, nem os dizeres. Não se lembra. A Minha Alma, essa, também não. E julgo que o faz para se auto-proteger e, desse modo, proteger-me a mim próprio. Os esquecimentos da alma ocorrem quase sempre por instinto de sobrevivência, por necessidade fisiológica e, nalguns casos, pela própria incapacidade das almas guardarem sentimentos em confuso turbilhão. Assim, este episódio, que durou mais de um mês mas é centrado em vinte e quatro horas passadas, não o escrevo à custa das memórias mas dos factos, e dos indícios indiscutíveis, que provam que eles aconteceram. O primeiro facto é a própria data, 20 de Agosto de 1970, quarto aniversário do meu casamento festejado nas férias, interregno da minha comissão militar (não da guerra, que continuava e havia de lá estar ao regressar). Segundo facto, as fotos mostram-me uma alegria (antes e logo de seguida a esse dia), que não podia ser inventada, nem por mim, nem por minhas filhas, nem por ela, minha mulher. Há sorrisos, gestos e expressões que não mascaram o sentir dos corações. Terceiro facto, o dia foi passado a dois como testemunham as cartas, posteriormente trocadas, comentando o dia. Inventando um pouco sobre essas férias, diria que elas aconteceram sob a pressão do medo do regresso a Angola e da longa separação que se ia seguir... Longe da vista, longe da afeição?
Foto, com a Teresa e nossas filhas, João e Sandra - Agosto de 1970
NOTA: Este texto faz parte do livro que estou a escrever
Boas recordações que foram gravadas na memória e com uma foto. Gostei de ler.
ResponderEliminarTudo o que nos diz, o que nos conta, traz o desenho de um estar de bem consigo próprio e com a vida, o que não quer dizer conformado, note-se...
ResponderEliminarA memória importa. Ela conta-nos!
FELIZ ANIVERSÁRIO!
Um beijo extensivo à família.
L.B.
Parabéns, Rogério.
ResponderEliminarQue continuem a repetir-se os momentos alegres em família.
Beijinhos.
Caro Rogério
ResponderEliminarMuitos Parabéns.
Recordar é viver!!! Estas são as boas recodações, que se continuem a recordar por muitos anos.
Abraço
Não há a mínima dúvida acerca da felicidade que todos estavam a sentir naquele momento. E não foi sequer para a pose!
ResponderEliminarEmoções congeladas de momentos ímpares. Artefatos que auxiliam a refrescar a memória ainda que com cores diversas das então havidas.
ResponderEliminarMomentos de sangue quente e vida.
Parabéns a todos.
Muitos bjs
Dos afectos: A ternura da memória.
ResponderEliminarParabéns!
Abraço
Caro Rogério
ResponderEliminarAs memórias são aquilo que a vida nos fez ser.
Imagino a emoção que representa para si a sua mulher e os filhos já existentes, rever esse momento.
Desculpe estragar a festa, mas nesse dia, nesse tempo, havia a duvida se se repetiria.
Parabéns por este dia especial. A si e aos protagonistas desta estória "comovente".
Abraço
Detrás de cada mulher excepcional, encontra-se um homem avinagrado!!!
ResponderEliminarO homem da minha vida não é mesmo nada avinagrado, mas eu também não sou uma mulher excepcional.
Muitos parabéns ao Rogério, por ter encontrado a Teresa, e desejo a ambos um feliz aniversário e muitas felicidades para o futuro.
PS: Peu a peu, a escrita do Rogério está a tornar-se cada vez mais refinada, e este seu excerto tem qualidades literárias.
Um beijo e muita felicidade!
ResponderEliminarBeijo
Voltei para contemplar mais uma vez e demoradamente a fotografia de uma família portuguesa feliz, embora ainda vivendo num Portugal facista, pobre e em guerra.
ResponderEliminarNeste capítulo 107 não tragamos vinagre, mas sim, amor no seu melhor.
PARABÉNS!!!
A todos o nosso obrigado
ResponderEliminarDuas notas aos comentários.
A primeira ao Rodrigo, meu amigo (Folha Seca): "a pressão do medo do regresso a Angola",(palavras que coloquei em texto) era verdadeira. Embora não racionalizasse o receio de não voltar, sentia-o.
A segunda par a Ematejoca: A felicidade (aparente) de quem monta e do montado tem muito que se lhe diga... Eu e minha Teresa fizemos tudo para que as crianças não sentissem o que se estava a passar...
A foto é verdadeiramente linda, Rogério. Uma família deliciosa.
ResponderEliminar:))
A foto é um mimo! Espero que essa felicidade se mantenha, sinceramente.
ResponderEliminarQuanto ao dia de casamento repito o que disse no comentário recente a outro post num outro blogue: passa rápido demais, acaba logo e as memórias se confundem.
Mal "acomparado" é semelhante a um funeral, com emoções muito fortes e uma confusão grande.
Bom domingo
São,
ResponderEliminarDo "funeral" de 1966 me lembro bem. O que a memória, por dolorosa, se quis esquecer foi a data, 4 anos depois... nas férias da Guerra Colonial.