22 agosto, 2011

Quem me lê gosta de poemas fortes - (3)

Foi há 25 anos, que nos deixou...Surrealista? Surreal ? Surreal é ter-me dado "A Gaivota", "Amigo"  depois de me ter dado "Portugal". Escolho "A Gaivota", mas sem esquecer que quando fui à procura de respostas para a pergunta "Porque me sinto português", O´Neil respondeu-me com "Portugal". Mas a "gaivota"... é uma bela ilha num mar de contradições...


Gaivota (*)
-
Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.

Que perfeito coração
no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.
----------------------------------------------------------------Alexandre O´Neill

(*) O poema foi escrito para a vóz de Amália, outras interpretações muito dignas: Carlos do Carmo; Dulce Pontes; Ana Moura: The Gift (haverá outras...)

14 comentários:

  1. A poesia de Alexandre O´Neil não é surrealista, é sim, pura e simplesmente POESIA.

    Comparti-lho consigo, Rogério, nesta homenagem bem merecida.

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  2. Caro Rogério
    Confesso que demorei tempo a gostar de Amália Rodrigues. Tive que aprender a ultrapassar preconceitos que tinha em relação ao "fado". Hoje ouço-a com gosto. Sim o poema é forte!
    Abraço

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  3. Foste muito mais completo, Rogério!
    Tem graça pois estive para colocar Amália mas depois optei pela voz masculina! :-))
    Alexandre O´Neill tem poemas lindíssimos!

    Abraço

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  4. Há dias, numa conversa, falava-se da necessidade de catalogar a Arte e os autores segundo as escolas. Esta visão lembra-me os contadores (móveis) cheios de gavetinhas e dos quais se esquece que a gavetinha do cimo e que fica à direita de todas as outras só é a do cimo e está à direita porque há as outras. Resumindo: Arte é a arte influenciada e influenciável. Gostamos ou não porque a entendemos ou não.

    Relativamente a "Gaivota" lembra-me a minha viagem para Angola, a bordo do Angola. Em águas internacionais, foram uns dias em que se cantou Zeca e todos os que, na altura, eram as vozes dissonantes.

    "Se uma gaivota viesse..."

    Beijo

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  5. Minuciosa formiga
    não tem que se lhe diga:
    leva a sua palhinha
    asinha, asinha.

    Assim devera eu ser
    e não esta cigarra
    que se põe a cantar
    e me deita a perder.

    Assim devera eu ser:
    de patinhas no chão,
    formiguinha ao trabalho
    e ao tostão.

    Assim devera eu ser
    se não fora não querer.

    Excelente "utilizador" das palavras, este O'Neill.

    Quanto à Amália.... hum?!

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  6. Venho esclarecer um porco mais a minha afirmação no texto:
    "gaivota"... é uma bela ilha num mar de contradições...". Se coloquei os três poemas, poucos mais colocaria e não colocava, de certeza, a letra da canção "Formiguinha Bossa Nova", que a Carol aqui trouxe. É a grande contradição do poeta, que (em grande parte da sua obra) passa de poeta a "utilizador" hábil das palavras... Sectores da sociedade letrada e instruída gostam (acho até que escrevia para eles). Eu acho deplorável, pelas ideias que ele deixa a pairar no ar. Grande poeta? Sim, mas com ilhas de beleza, rodeadas de lixo bem apalavrado, um pouco por todo o lado. Estou a ser radical? Talvez, mas lembro que usei palavras dele para, um dia, me sentir português...

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  7. O Neill era um poço de contradições, sem dúvida,mas deixou-nos grandes poemas que merecem ser recordados neste dia.

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  8. E não é vida, contraditória? Contribuo com o roqueiro Raul. Metamorfose ambulante.

    abs,

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  9. Grande poema, grande poeta, o O'Neil.

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  10. Estamos de acordo muma coisa, O'Neill era contraditório. Ok, so what? em quê que isso o diminuiu enquanto GRANDE poeta? NADA!
    Noutra coisa estamos em desacordo, o Rogério não é nada radical, na minha opinião, a questão é outra....

    :)))

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  11. Cara Ariel,

    Juro pela minha saudinha, e não estou a fazer figas, que o que penso sobre O´Neil está tudo lá e nos comentários acima. Se a sua opinião sobre o que eu, de facto, penso é outra, só lamento ter-me em tão má conta...

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  12. Ora, ora, já lá tem a respostazinha do outro lado, não percebo porque razão o facto de considerar que o Rogério não é radical, que reitero, signifique que o tenha em má conta...

    :)))

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