03 abril, 2014

O odioso, os odiados e os factores de mudança

Falando do que se escreve, vê e fala, percebemos que as mensagens são polarizadas em nomes e caras. Tudo é fulanizado. Os dias contarão para a história, correndo-se o risco de o nosso presente vir a ser escrito como o foi no passado, em que os avanços civilizacionais eram devidos a heróis e os retrocessos eram imputados a ditadores, traidores ou a pouco dotados: os odiados. Nos retrocessos sentidos, apontam-se os odiados, ridicularizam-se os discursos, reproduzem-se as caricaturas e pouco se fala, escreve, analisa e aprofunda o odioso . No dia em que um nome, uma cara, saia da ribalta ninguém garante que se esteja perante o fim do quer que seja e quem chega protege-se dos tiques e falas do destituído. Odiou-se Salazar, mal discutindo o salazarismo. Odeia-se Passos, mal discutindo o neoliberalismo. Aprontam-se cabeças cheias de sentenças, como se dependesse a mudança de algum bem-pensante, como se a alternância fosse mudança:
«As causas de todas as mudanças sociais e de todas as revoluções políticas, não as devemos procurar na cabeça dos homens, em seu entendimento progressivo da verdade e da justiça eternas, mas na vida material da sociedade, no encaminhamento da produção e das trocas.»
Karl Marx, no prefácio de "Crítica da Economia Política"

7 comentários:

  1. A fulanização como escreve, e bem, é uma das formas que a narrativa neoliberal desenvolveu para ocultar o cerne das contradições da história social do ser humano: a luta de classes.
    Se todo um debate se concentra no fulano, cicrano e beltrano, então é leviano e desprovido de análise concreta. Não levanta as reais questões.
    Um grande abraço

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  2. Eu também já acreditei nessas palavras de Marx mas...
    A fulanização é incontornável. Por muito que custe admitir, as pessoas não votam em modelos de sociedade, mas sim em pessoas. E isso, sabe tão bem como eu, tem uma explicação muito simples...

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  3. Carlos, o que diz não desacredita Marx, O que ele diz é que, sendo como diz o Carlos, não há mudança! A menos que o meu amigo passe a acreditar que um qq D. Sebastião venha mudar ou fazer a revolução...

    ah, e não há explicações simples para situações tão complexas quanto estas!

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  4. Tremenda, esta crescente "fulanização"! Subscrevo o comentário do C-Zero!


    Abraço!

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  5. É um erro comum que resulta na ilusão de se pensar que as políticas são consequência de um indivíduo, e não de uma estrutura e dinâmica social concreta.
    Assim será, enquanto a dinâmica social que promove tais políticas e (seus) indivíduos não mudar.

    beijinho e bom fim de semana

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  6. Concordo,se a fulanização tem o mérito de no imediato expôr concretamente protagonistas de politicas e ancorá-los a elas, tem no entanto a desvantagem de secundarizar as doutrinas que lhes assistem,impedindo de certa forma um entendimento maior.

    Abraço
    Horizonte XXI

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  7. não haverá uma relação dialética entre as "condições materiais" que determinam as políticas e os homens que as realizam?

    enfim, perguntas de um "herético"...

    abraço, meu caro Rogério

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