14 dezembro, 2013

Poesia (uma por dia) - 56


A propósito disto aqui lido
Delphica

Desde a orla do mar
Onde tudo começou intacto no primeiro dia de mim
Desde a orla do mar
Onde vi na areia as pegadas triangulares das gaivotas
Enquanto o céu cego de luz bebia o ângulo do seu voo
Onde amei com êxtase a cor o peso e a forma necessária das conchas
Onde vi desabar ininterruptamente a arquitectura das ondas
E nadei de olhos abertos na transparência das águas
Para reconhecer a anémona a rocha o búzio a medusa
Para fundar no sal e na pedra o eixo recto
Da construção possível

Desde a sombra do bosque
Onde se ergueu o espanto e o não-nome da primeira noite
E onde aceitei em meu ser o eco e a dança da consciência múltipla

Desde a sombra do bosque desde a orla do mar

Caminhei para Delphos
Porque acreditei que o mundo era sagrado
E tinha um centro
Que duas águias definem no bronze de um voo imóvel e pesado

Porém quando cheguei o palácio jazia disperso e destruído
As águias tinham-se ocultado no lugar da sombra mis antiga
A língua torceu-se na boca da Sibila
A água que primeiro eu escutei já não se ouvia

Só Antinoos mostrou o seu corpo assombrado
Seu nocturno meio-dia

Sophia de Mello Breyner

5 comentários:

  1. Profundo , nos leva a beira do mar e notar tudo ao nos cerca ao nosso redor e dar significado a cada coisa!

    Oi meu nome e Lidia do Blog Cor de rosa choque , espero que se lembre , estive fora do ar , mas voltei e com novidade , se pude da uma passadinha neste novo blog e participe do sorteio de inauguração

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  2. Cheguei à orla do mar e, deslumbrada, afeiçoei-me.
    Abraço.

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  3. Desde a Orla do Mar tudo é possível, até um poema tão belo como este.

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  4. Muito lindo! Muito lindo!
    Obrigada por esta escolha!
    Beijo.

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