Regresso à tarefa de tentar descobrir o sentido e o ser da “Maior Flor do Mundo”, revendo pela enésima vez o vídeo sobre o conto de Saramago. Desta vez dou por um facto, não certamente acessório, da atenção dada, primeiro pelo escritor e depois pelas criança, a um escaravelho na labuta, que lhe é própria, de empurrar uma bola de excremento, já bem maior que a sua minúscula dimensão. Não por acaso, pois é conhecida a elevada simpatia que o nobelizado nutre pelos gestos, quando estes são maiores que os seres que os praticam. Porquê um escaravelho no inicio do conto se o seu protagonismo, poderia mais prosaicamente ser substituído por um outro bicho mais simpático? Levar um escaravelho empurrando esterco para dentro de um conto destinado a crianças, só pode ter um significado maior. E tem. Para os antigos egípcios era a parte de um escaravelho sobre parte de homem, coisa digna de devoção. Revela-o a iconografia e os escritos nas pirâmides. Acreditavam eles, depois de muita aturada observação, que o besouro KHEPRI – seu outro nome – representava, na terra, a laboriosa tarefa de fazer girar o sol através do céu, muito provavelmente, em torno da terra. Essa representação não era meramente simbólica, acreditando-se que se os escaravelhos suspendessem tal prática, o sol deixaria de aparecer e, assim, dependia do nobre insecto a própria vida terrestre. O escaravelho, em Heliópolis, é visto como “o deus que veio sozinho à existência”, ou seja, Rá.
De menor crendice, mas de igual nobreza, se associa a sobrevivência da sua própria espécie a esse quase eterno rodar, pois que no estrume empurrado jazem os ovos de que se reproduzem e é em movimento quase perpétuo que os ovos se abrem em novas larvas. Acho que nada disto terá a ver com a tentativa de saber o que a Maior Flor do Mudo vem a ser. Acho que segui uma pista falsa. Mas acabei por descobrir uma outra estória dentro do conto e estou disposto – e habilitado - a contá-la a meu neto quando ele descobrir um besouro. Dir-lhe-ei que é um bichinho de ouro e de trabalho. Dir-lhe-ei que homens distantes acreditavam que, quando chegasse o fim dos seus dias, aquele que levasse a imagem do escaravelho para a tumba tinha a certeza de renascer para a vida. Ele vai perguntar-me se é verdade isso de haver outra vida. Não planeei a resposta, quando a tiver que dar serei espontâneo e, assim, mais digno do seu crédito…
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Obrigada pela partilha!
ResponderEliminarO bicho do trabalho que tem que carregar a m...dos outros para sobreviver???Será???
beijo
Caro Rogério
ResponderEliminarÉ um bicho que tem algo em comum!!! Vamos ter que aprender e conseguir sobreviver com a m.... que andam a fazer.
Abraço
Olá Rogério
ResponderEliminarGostei de saber sobre o significado mitológico desse inseto.
Grande abraço
Poupem os verdadeiros animais
ResponderEliminarse o escaravelho fosse lacrau
rodeado por todos os lados
tinha a dignidade de se suicidar
Com Dum-Dum, não escapava um...
ResponderEliminarahahahahah valeu a pena estes dois últimos comentários para dar uma gargalhada. É o que se chama rir para descomprimir, depois de um texto, com tanto e tão sério significado.
ResponderEliminarE seu neto acreditará em cada palavra tua, visto que seu gesto, é sempre sincero.
ResponderEliminarViva o escaravelho, inundem a nossa existência com promessas de esperança e exemplo de tarefa cumprida.
Fiquei pensando...
ResponderEliminarQuando chegar a conclusão (se chegar um dia) compartilho contigo de imediato.
Um grande bj querido amigo
Minha Fada,
ResponderEliminarMeu sangue mediterranico, um tanto mouro, me diz que no dia em que os escarevelhos deixarem de gestos maiores que o seu corpo o sol se esconderá para todo o sempre (ou quando os homens deixarem de apreciar um besouro).
Acho que o Carlos Barbosa nem leu. Foi o que me pareceu...
Pois... para dizer o que disse... é que não há outra alternativa. :)
ResponderEliminarÉ bom vir aqui aprender ou relembrar coisas. O seu neto vai pensar: "que sorte que eu tive com este avô que me saiu..."
ResponderEliminarBeijinhos
Como em 2012 só Portugal estará em recessão... temos que ir trabalhar para outro lado... fiquem cá os políticos a habitar no cimento e a passear no alcatrão.
ResponderEliminarNeste terreno aqui... já poucas flores vão conseguir nascer... só contas para pagar.
Bjos
Isa,
ResponderEliminarSe Saramago estive entre nós não só pelas palavras que nos deixou, mas de corpo inteiro, diria por certo palavras duras como as suas, mas não sem esperança...
... o seu comentário condiz com o inicio do conto (reveja o video). Talvez em 2012 só nos reste uma flor condenada, no meio das serranias com todas as máquimas paradas, abandonadas. Talvez tudo dependa dum gesto de criança... ou dos que aprenderem a lição, porque de uma lição se trata...
Neto?! E eu a pensar num filhote!:-))
ResponderEliminarTenho mesmo que reler este livro para estar preparada quando me "surgir" um neto perguntador!
Abraço
"Dir-lhe-ei que é um bichinho de ouro e de trabalho."
ResponderEliminarOra aqui está, ouro e trabalho, dois valores que devem andar sempre juntos.
E não ouro sem trabalho, ou trabalho sem ouro, que é o que impera por cá!
O seu neto vai-se lembrar sempre destes ensinamentos!
Beijinhos
Isto é uma fase... ando um bocadinho desanimada, até o safado do computador resolveu dar-me cabo do juízo... e da carteira... o safado não deve saber que estamos em época de contenção de despesas ;)
ResponderEliminarBjos
Excelente, este blog. Para ser sincero, desconhecia o significado mitológico do escaravelho.
ResponderEliminarExcelente, Rogério, adorei a história deste escaravelho.
ResponderEliminar:))
Uma engenhosa abordagem do conto de Saramago destinado às crianças. São assim os grandes escritores, capazes de fazer nascer contos dentro dos contos.
ResponderEliminarUma sugestão de ouro dentro do "seu conto" - trabalhar a terra. Mexe-la, a exemplo do escaravelho, para que produza.
Gosto da subtileza que espreita das entrelinhas.
Não planeou a resposta, mas planeou a pergunta...Significativo!
Um beijo
Lidia,
ResponderEliminarÉ irrecusável a sua achega
Vou introduzi-la, com certeza
(farei isso noutro post, espero que goste)