08 dezembro, 2021

A UMA PEQUENA CRIANÇA, CONTE SEMPRE! LER PODE SER CONTRAPRODUCENTE...

O conto de ontem mereceu um ou outro comentário que ia no sentido de nos interrogarmos sobre se a história, pela carga semântica, seria compreendida pelas crianças, dada a reconhecida limitação de vocabulário. Limitação que é normal, até mesmo em alunos do 2º ciclo. De acordo. Na idade tenra, conte a história por palavras suas, mas tente, tente sempre, dar a ler. O amor à leitura deve ser estimulado. Meu avô nunca me leu uma só história mas foi ele quem me deu o meu primeiro livro.

Ah, e enquanto conta, meça as reacções.  Segue um exemplo do então contado se tivesse lido, "não me ligaria  puto".---

A PARTIDA...
Contei a meu neto Diogo a viagem de 33 mineiros, tendo o cuidado de lhe explicar tim-tim-por-tim-tim o que era essa gente e onde ficava o Chile. Depois contei que todos saíram de casa para uma viagem, quase sempre dolorosa mas necessária e, porque a rotina a tudo habitua, terão saído contentes para a rua que os encaminhava à mina de San José. (Diogo acho que percebeu, pois seu pequenito nariz torceu). Continuei a contar a viagem para a mina que, sendo curta a descrição, me obrigou a pormenorizar as cenas de trabalho. Estavam todos eles nessa faina, quando de repente, acontece o acidente (até parecia que era ao Diogo que acontecia, tal era a expressão que ele fazia). Alerta geral. Estão bem? Estão mal? Às notícias de sobrevivência, a incerteza do salvamento... (Diogo de apreensivo passou a expressão de algum espanto a uma outra, de inquietação)...
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A CHEGADA... (e as tais razões de felicidade)
Expliquei então a enorme mobilização. Esforços daqui e dacolá. Juntaram-se tecnologias e rezas, cantares e engenharias, para dar a toda a gente um regresso e as maiores alegrias (de espanto era a expressão quando entendeu o que foi tal mobilização). Depois deu-se o regresso e a desejada chegada, por todos festejada. O que me fez feliz? Tudo... e a cara do meu petiz... (claro que há outras coisa para além da viagem. Mas estas, não se contam a crianças...). Acabada a história, ouvimos juntinhos o Hino dos Mineiros, dos nossos, tão esquecidos (clicando no vídeo aqui)... 
 
(Reeditado)

9 comentários:

  1. Concordo plenamente que será sempre muito mais aconselhável contar a história à criança, ao invés de a ler, Rogério. Ainda que tudo dependa da idade da criança.
    Gostei de ouvir novamente o Hino dos Mineiros, cantado pelos mineiros das Minas de Aljustrel.
    Agora, emoção que me levou às lágrimas, foi ouvi-los durante passagem da Joana Latino e o Nuno Pereira, em Agosto, quando foram surpreendidos pelo Grupo alentejano, que lhes surgiu do interior da mina todos de braço dado naquele cante balançado, que até dói de tão marcante.

    Obrigada pelos contos e pela sugestão: melhor contar até que a criança saiba ler para ir acompanhando também a leitura dos livros.

    Um abraço.

    PS- O meu Noah ainda é muito pequenino e, dividido na aprendizagem de dois idiomas tão distintos - Português e Holandês - entende tudo o que se diz, mas tem alguma dificuldade em se expressar. Há que dar tempo ao tempo.

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    1. Quer um conselho de avô velho? Com os meus netos faço assim. Pego numa coisa próxima e chamo-lhes a atenção. Atenção ganha, passo à segunda etapa: invento coisa que se liga à coisa e começo para ali a dissertar, com ar de que se trata de assunto sério, com ar concentrado e sério sem ser sisudo e com palavras ternas, resulta sempre! Depois é continuar... passar à leitura mas, de permeio, aligeirar o verbo... resulta sempre!

      Para cativar o seu Noah, leia-lhe "O caracol mole e o escaravelho seu conselheiro" mas primeiro procure um caracol e ponha-o no chão, depois conte-lhe o conto e acrescente-lhe um ponto.

      Boa?
      Cá vai abraço!

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  2. Deixa-me refazer-me da forte comoção que me invade sempre que oiço o Hino dos Mineiros de Aljustrel...

    Pronto. Não sei se concordo contigo Rogério. Creio que me sinto muito feliz por ter tido um pai que me lia todas as noites, desde o momento em que comecei a conseguir expressar-me por frases, logo a seguir aos meus doze meses. Aquele era um momento quase sagrado de tão desejado que era e, como o pai só me vinha ler à noite, em breve comecei a tentar prolongar a experiência maravilhosa que era viajar através de um livro e rapidamente aprendi a ler sozinha. Claro que já teria os meus quatro ou cinco anos quando comecei a ler desembaraçadamente mas, durante a infância li as obras completas de Jack London, Jules Verne, Agatha Christie, Emílio Salgari e tudo quanto eram teses de licenciatura em Medicina, que abundavam lá por casa, oferecidas pelos antigos alunos do meu bisavô. Também li tudo quanto haviam escrito até ao momento, o meu avô, o Nemésio, a Natália, o Torga, o Saúl Dias, o Zé Régio... enfim, li tudo o que consegui ler, incluindo o Don Quijote de la Mancha, no original da língua de Cervantes, muitas vezes debaixo do edredão, com uma lanterninha acesa, para que a minha mãe não viesse interromper-me. O pai e o avô, esses faziam vista grossa, deixavam-me ler o que eu quisesse quando eu quisesse.

    Compreendo bem a importância de se contar uma história, mas nunca deixarei de me sentir uma felizarda por ter tido um pai que todas as noites lia para mim.

    Abraço grande!

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    1. Há pais que lêem como se tivessem contando. Foste uma sortuda. Eu só via o meu pai de quando em quando, pois trabalhava à noite e dormia de dia... minha mãe mal sabia ler e escrever...

      Meu avô é o responsável pela minha dedicação às letras... Acho que já contei por aí que ele começava contando uma história para depois ligar a outra... os anos passaram e muito tempo depois, estava eu a ver uma peça, e tudo aquilo me era familiar... e quando Chicó e João Grilo, os personagens, começaram a disparatar lembrei-me dele. A peça? "O Auto da Compadecida", de Suassuna.

      Um espanto!

      Abraço



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  3. Gostei de ler e ouvir.
    Contar/ouvir contar é bom, mas não posso deixar de concordar com a Maria João quanto à leitura. Ouvir ler, dando à voz uma certa entoação que facilite a adesão da criança ao texto tem, pode ter, de facto, um acréscimo de magia. Acontece-me por vezes "ler" de outro modo uma ou outra frase para a adequar à idade do ouvinte, mas a "voz" de ler é diferente da "voz" de contar. Uma e outra indispensáveis ao crescimento e desenvolvimento cognitivo dos mais novos.

    Beijinhos
    Lídia

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    1. A Lídia, dizendo diferente, acaba de dizer mais ou menos o mesmo... e sublinho "Acontece-me por vezes "ler" de outro modo uma ou outra frase para a adequar à idade do ouvinte"
      É isso mesmo! O resto da minha tese já a explicitei à Janita.

      E subscrevo: ler e contar são ambas indispensáveis. Pena é que há cada vez menos quem o faça!

      Beijinhos agradecidos

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  4. Rogério, meu pai além da profissão dele era também escritor, semanalmente escrevia para vários jornais e também seus livros. Então, eu tinha uma passeio todos os sábados com ele, deveria ter meus 8, 9 anos. Íamos sempre para livrarias, ele comprava os livros dele e eu procurava os meus livrinhos infantis, que gostava. Assim ele me iniciou na leitura, destaco seu exemplo e sua dedicação a mim, éramos muito companheiros, e de minha mãe herdei o gosto nessa época pelos seus trabalhos manuais. Devemos iniciar os filhos na leitura, ainda pequenos, assim que aprenderem a ler. Tomam gosto! Fiz isso com os meus filhos, deu certo.
    Escutei o Hino dos Mineiros, muito lindo, e triste.
    Abraços daqui, de longe! Um bom fim de semana.

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    1. Tenho três filhas, a mai-velha lê um tanto, a minha-do-meio lê tanto e a minha-mai-nova ouve-me um pouco... pois anda esforçada em meter meu neto lendo.

      Que bom, para ti
      teres tido um pai assim

      Abraçando nos tornamos perto
      certo?

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  5. Quando eu era pequeno, era o meu pai que me contava histórias, umas conhecidas ("O Macaco do Rabo Cortado", "A Formiga que Prendeu o Pé na Neve", etc.) e outras inventadas por ele à medida que a trama se ia desenrolando, soltando a sua imaginação. O meu pai morreu quando eu tinha 8 anos. «Então, e o avô?», perguntar-se-á. Esse era salazarista e só se preocupava em colecionar "tachos"; estava-se nas tintas para a família. Como eu gostaria de ter um avô como o Rogério.

    O hino dos mineiros até provoca arrepios e foi por mim publicado na sua versão espanhola (que julgo ser a original) no meu blog há cerca de 5 anos. Recebeu tão poucas visitas, mas tão poucas, que foi como se eu não tivesse publicado nada. O vídeo que partilhei foi este: https://www.youtube.com/watch?v=kP5aj4C82Zs.

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