O artigo "CP gera poupança ambiental de €137 milhões", publicado na edição de 31 de Dezembro, começa assim:
"Assumindo que cada camião de médio curso carrega cerca de 25 toneladas de mercadorias, a carga transportada em 2008 pela CP no eixo Lisboa-Porto equivaleu ao movimento de 351.600 camiões. Assim sendo, só na linha do Norte, que é o corredor de maior tráfego em Portugal, a CP Carga considera que gerou uma poupança ambiental superior a 137,5 milhões de euros..."
O texto continua, desenvolvendo vasta informação sobre o esforço continuado na redução de emissões de CO2. Aproveita esses dados para nos fornecer outros dados, igualmente detalhados, sobre volumes de carga transportada. Finaliza o artigo pondo em confronto as vantagens competitivas... não, perdão, sobre as economias de CO2 em comparação com a utilização do modo rodoviário. Nessa mesma página, sob a imagem de uma locomotiva, coloca uma legenda que nada tem a ver com CO2: "O sector foi liberalizado e a CP Carga enfrenta a concorrência privada, designadamente da Takargo Rail (Grupo Mota Engil)". Ainda na mesma página, dá conta de um caso que, por acaso (?) dá exemplo de uma tendência do mercado. Refiro-me ao artigo "Ikea troca camiões por comboio".
Penso em tudo o que li e não posso deixar de me interrogar se toda esta página não volta a colocar o estratagema da minha sogra. Sigam o raciocinio que fiz no extenso artigo em que comentei uma outra notícia. esta no >Economia de 12 de Dezembro, com o titulo "Até o CO2 já é amigo do TGV".Eis o meu texto:
Introdução – A minha sogra, senhora que já fez 89 anos, sofre de várias maleitas e mazelas. Toma vários comprimidos, drageias e xaropes. Na ânsia de prolongar a sua boa longevidade não falha. Acontece que, sofrendo (também) do estômago, encontrou uma forma engenhosa de se proteger. O que faz? Vejam só. Prepara uma papinha, envolve o agressivo comprimido na dita e, cá vai disto. Passa-lhe pelo estreito e, deixando um rasto de agradável sabor a Maizena, lá chega aos seus fluidos estomacais, sem lhes desencadear a hedionda acidez…
Ao ler “Até o CO2 já é amigo do TGV” não consegui afastar a ideia da forma engendrada pela minha sogra para tomar a sua droga mais violenta, que descrevi na introdução a estas notas. Não sei onde o autor foi buscar a ideia, mas que ela se aproxima do que aquela velhinha faz, lá isso é verdade. Vejamos:
- A papinha – O autor do artigo descreve a iniciativa ambientalista do “Expresso do Clima”, de Bruxelas a Copenhaga, em tom doce. Inicia o texto com referências a uma canção de Tom Jobim (que, tal como a “Maizena”, quase todo o mundo gosta) e termina fazendo a promoção indirecta do transporte ferroviário e a necessidade de penalizar com a “Euro-vinheta” o transporte rodoviário. De permeio fica a reportagem da sua tranquila cavaqueira com responsáveis da CP e da RENFE a propósito de isto e mais aquilo, mas tendo como fio comum: os méritos da AV ambientais e o bom entendimento entre aquelas duas empresas públicas. É de facto uma papinha doce. Azedava-se a papa caso o texto referisse o impacto que a AV terá na redução de passageiros que hoje utilizam o transporte aéreo entre as cidades que irão ser servidas (cita, lá longe, que entre Roma e Milão terão sido 50000, em 50 dias). Mais azeda ficaria ainda, se discorresse sobre esse impacto e o projecto de construção do novo aeroporto ou sobre decisões sobre auto-estradas, traçados de AV, sem se partir de um Plano Estratégico de Transportes como instrumento orientador desses investimentos e das opções estratégicas que as suportam. Com estas omissões, só se fala de emissões. Papa boa, portanto.
A droga – Assegurada a adocicada papinha, o autor do texto meteu a pílula lá dentro. Tomada assim, como vimos, evita a azia. Mas qual é, afinal de contas o fármaco em questão? Transcrevo duas partes: “Dentro de poucas semanas a ligação Lisboa-Madrid estará liberalizada” e “Mantém-se tudo em aberto” (relativamente à eventual criação de uma empresa mista CP e RENFE). Qual a substancia activa deste fármaco? É o modelo de negócio para a exploração da AV, nem mais. Ainda mal definido, é substancia para criar forte azia no estômago do contribuente. Nesta altura do campeonato ainda se colocam dúvidas na parceria com a RENFE mas já se rejeita um exemplo inovador como é o TGV Est, que liga Paris a Estrasburgo (300 quilómetros).
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