20 abril, 2020

Senhor Covid-19 se pensa que paramos, tire daí o sentido! (5)

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Hoje,  "A Desenhando Sonhos" fez publicar o 5º conto, inserido no projecto "CONTEMOS CONTOS UNS AOS OUTROS", progredindo no objectivo de dar aos seus associados, reformados, pensionistas e idosos condições para acederem a obras de autores que nos dão testemunho de uma realidade do País que fomos, porque somos a memória que temos...
Dada a proximidade das celebrações do 25 de Abril é um conto que retrata como era a escola em tempos de ditadura.
- o conto é da autoria da Alice Vieira
- a voz é da actriz Teresa Neves, convidada pelo nosso amigo André Levy.
Fica aqui um bocadinho, pois o seu destino é ser ouvido:
«... E lá vinha outro mês, e lá voltava eu a escrever para o Ministério, a mandar ofícios, a fazer pedidos a toda a gente – e do Ministé­rio apenas o silêncio.

Foram anos terríveis. Eu já não sabia como inventar maneiras de ensinar os miúdos. Já viu como é que se ensina Geografia de Portugal sem um mapa? Ensinar-lhes as serras, os rios, as linhas de caminho-de-ferro – sem lhes mos­trar no mapa onde ficavam?

Coitadinhos, eles sabiam tudo de cor, mas não faziam a mínima ideia onde é que tudo aquilo era! E o meu ordenado, claro, tão pequeno que nem dava para pagar o material do meu bolso. Ainda paguei muitos paus de giz, e um apagador para o qua­dro, e alguns cadernos para aqueles que não tinham mesmo possibilidades nenhumas, mas não podia ir muito além disso. Tinha dois filhos para criar, e fiquei viúva muito cedo, como o Paulo lhe deve ter dito. A vida era muito difí­cil também para mim.

Mas nunca desisti. Todos os meses lá ia a carta para o Ministério. Isto durante anos! Só em selos devo ter gasto uma pequena for­tuna!

Até que um dia...»

5 comentários:

  1. Um belíssimo conto da Alice Vieira. Gostei muito!

    Abraço

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  2. E eu sei muito bem como eram essas aulas. Ui ui se sei...
    .
    Saudações amigas

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  3. Ainda apanhei uns resquícios desses tempos. O 25 de Abril demorou bastante a chegar às aldeias do interior nortenho. Também "inventei" recursos e materiais para dar as aulas. Eu e outros colegas jovens, isolados nas aldeias em escolas com um (ou dois professores, na melhor das hipóteses), juntavamo-nos aos sábados para preparar as aulas em conjunto. Criámos até uma "fotocopiadora" que (foi amplamente utilizada) feita com gelatinha e uma tabuleiro de cozinha. Usávamos papel químico e escrevíamos à mão as propostas de trabalho. (Eu tinha a mania de fazer também desenhos para as tornar mais atrativas). Depois era virar a matriz a químico no tabuleiro, deixar que a gelatina absorvesse a tinta, e passar, uma a uma, as folhas de papel, (sempre contadas) que dávamos às crianças. Nunca me esquecerei do trabalhão que tínhamos para limpar a gelatina, de modo a que voltasse a servir. Usávamos água quente que ia "comendo", pouco a pouco, a "massa". Era preciso poupá-la. É que uma "fotocopiadora" destas ainda ficava cara. Se a água estivesse quente demais era certo que a gelatina "encolhia" drasticamente mas, se pelo contrário, estivesse pouco quente era preciso esfregar, até doer o pulso. Que tempos, aqueles!

    Gostei muito do conto.

    Lídia

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  4. Não conhecia este conto. Mas esta escola sim. Talvez não fosse aquela onde andei até à terceira classe, mas que era muito semelhante, lá isso era. Pois a minha era num casebre que anteriormente tinha sido uma vacaria. Tinha carteiras, um quadro e uma secretária para a professora. Uma janela, e duas portas. Uma dava para a rua. A outra para um quartinho com uns potes em barro, onde fazíamos as necessidades. À tardinha vinha a PIPA uma camioneta da Câmara, com um depósito que recolhia a porcaria, e lavava os potes no largo num chafariz porque a escola também não tinha água.
    Abraço

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  5. Não tinha lido este belo conto da Alice Vieira.
    Outros tempos que nao deixaram saudades.
    Um dia chegou o 25 de Abril.
    beijinhos
    :)

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