O PROBLEMA DAS QUALIFICAÇÕES
Sem minimizar os problemas que a questão das qualificações colocam à necessária reindustrialização e ao indispensável desenvolvimento do aparelho produtivo do país, quero sublinhar que esse nunca foi um factor inibidor de tais desígnios. Prova-o António Tapadinhas pintando a Siderurgia no Seixal /Paio Pires, (muito perto dos meus lugares de infância). Se pintou esse quadro é porque, em determinada altura num Portugal atrasado e feudal, foi possível em 1961 avançar para uma industria exigente em qualificações num meio já com algumas caracteristicas industriais mas ainda predominantemente rural, como muito bem comenta o António, lá no seu blogue. Provo-o eu também, sendo exemplo pessoal e ao mesmo tempo testemunha de que a questão das qualificações não foi uma questão central.
Como exemplo: Chego à Siderurgia em 1973 como consultor para acompanhar a expansão da SN com a criação de uma nova fábrica a construir no norte, na Maia/Ermesinde (1). Responsabilidade técnica de elevada exigência, pois era responsável por montar todo o sistema organizativo das áreas de aprovisionamento e manutenção da nova fábrica. Que tinha eu feito para me habilitar a tal? Pouco ou mesmo nada: Tinha frequentado o ISEL; tinha sido vendedor nem eu já não me lembro do quê; tinha sido quase-jornalista; tinha sido enfermeiro militar... E, como não há milagres recebi com o projecto todo o "saber-fazer" da empresa que aceitou o risco de se limitar a contratar um gajo que sabia-estar, sabia-saber e sabia-querer...
Como testemunho: A qualificação de funções operacionais foi adquirida no contexto da realização dos projectos quer em 1961 na fábrica do Seixal quer em 1975 na fábrica de Ermesinde...
A grande questão, a questão central está localizada no desenvolvimento. Uma estratégia bem conduzida ao nível do investimento permite ultrapassar grande parte das dificuldades ao nível das qualificações, diz-me a experiência...
A boa integração da formação qualificante nos próprios projectos de investimento é, como referi, uma forma de ultrapassar grande parte das dificuldades, mas não todas. As outras, resultantes do facto de Sottomayor Cardia(2) ter desmantelado em 1975 toda a equipa do Ministério da Educação e ter unificado o ensino, deixando cair as escolas técnicas, deixaram marcas profundas no saber-saber (competências básicas), no saber-estar (ninguém que vestir o fato de macaco) e no saber-querer (todos querem ser doutores ou engenheiros, porque apenas se valoriza socialmente esses status). Há muito que fazer para reverter estas situações... No ensino as grandes mudanças, boas ou más, projectam-se no tempo e são duradores os seus impactos ou sequelas. Ainda vivemos delas...
Hoje, o quadro do António espelha bem um declínio mais profundo do que aquele que directamente está presente na imagem que pintou. Obrigado António por retratar tão bem a nossa realidade.
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(1) Ver História da Siderurgia em Portugal
(2) Ver comunicação de Mário Cerqueira Correia (ex-director) no 50º aniversário da Escola João Gonçalves Zarco e ver ainda "História da Educação em Portugal"
Olá finalista da Blogagem coletiva O melhor de mim!
ResponderEliminarDevido a um bug no formulário de votação infelizmente tive que modificar o modo como a mesma vinha sendo realizada. Peço imensas desculpas e quero informar que recomeçamos a votação do zero.
E para evitar que o transtorno ocorra novamente desta vez a votação será através dos comentários.
Peço desculpas mais uma vez e desejo boa sorte na retomada das votações.
PS: Miperdoa por não ter previsto que poderia dar erro?
Se puder, avise seus leitores. Obrigada…
Meu grande amigo.
ResponderEliminarO pensamento e a realidade dos nossos dias. Eles não prestam nem como homens nem como políticos.
Destruíram aquilo que não sabem fazer nem inventaram mais do que desorganizar tudo o que fomos melhorando ao longo dos anos.
Os tempos difíceis ainda virão por aí
Parabéns pelo testemunho de uma vida activa e participativa e também eu acredito que são homens com essa fibra que nos farão ressurgir desta crise.
Quando entrava um funcionário dava-se-lhe formação. Subia na empresa pelas qualidades e quantidade de trabalho e também pelo bom relacionamento entre patrões e colegas. Gostava-se de trabalhar !
As qualificações, técnicas ou académicas, são importantes, quando obtidas num quadro de rigor. Hoje em dia, embora havendo excepções, os diplomas são obtidos com muita ligeireza.
ResponderEliminarPor outro lado, a experiência devia ser melhor aproveitada no nosso país. Assim, e sem ser necessária muita argúcia, os problemas do país resolver-se-iam com visão política, qualificações a sério, experiência e formação.
Rogério,
ResponderEliminarEste texto não tem o toque avinagrado a que estou habituada, mas acho que entendi e concordo. As alterações no ensino enviesaram toda a educação e os saberes. Tudo anda à volta do saber-saber. Saber-fazer, saber-estar e saber-querer passaram para um plano secundário. Mesmo o saber-saber não se concentra nos saberes básicos e dispersas por imensas matérias sem tratar bem nenhuma delas. Claro que isso deixa problemas quer para os que progridem nos estudos quer para os que ingressam no mercado de trabalho.
Outra coisa, era mesmo necessário ser tão duro para o ministro Sottomayor Cardia?
Beijo
PS: Acho o quadro do António o máximo e mais uma vez bem integrado no seu texto
Palavras sábias, as que acabei de ler! São as de alguém, que fala do que sabe, pela experiência e pelo estudo!
ResponderEliminarEsta obra está na casa de uma senhora, coleccionadora de arte. Está numa parede, que tem uma janela com vista para o Tejo. Fez questão que eu visse a obra no local em que a tem colocada. Disse-me que, agora, mesmo depois de fechar a janela, continua a ver o rio...
Quando dizes, muito perto dos teus lugares de infância, é mesmo muito perto!
Para quem não sabe, Seixal e o Barreiro já estiveram ligados. A distância entre os dois concelhos é de quinhentos metros, se for feita uma pequena ponte que atravesse o esteiro de Coina.
Resta-me agradececer a honra que me dás por continuares a incluir obras minhas no teu blogue.
Abraço,
António
Tinha pensado não responder ao comentários pois eles são os testemunhos dos meus seguidores. Contudo não posso deixar de respoder a quem me interroga directamente, como é o caso da Maiuka. Só lhe digo que ter-se-á algum dia de dar nome a quem nos atrapalha o futuro. Nos documentos que deixo para consulta poderá perceber o que poderiamos ter ganho (ou não ter perdido) se tivessemos levado a reforma de Veiga Simão até uns anos mais tarde...
ResponderEliminarPS: irei avinagrar os posts seguintes desta série. Boa?
Um texto cheio de conhecimento e experiência de vida.
ResponderEliminarNa minha humilde opinião, as empresas deviam valorizar e incentivar quem tem iniciativa e vontade de aplicar o seu conhecimento académico ou profissional.
As escolas deviam formar com as empresas parcerias por forma a adaptarem o ensino à realidade do país.
A pintura do seu amigo António está perfeita para este seu excelente e avinagrado post. Parabéns aos dois.
Beijinhos
José Augusto Seabra, em 1983, criou os Cursos Técnico Profissionais de 3 anos e os Cursos Profissionais de 1 ano mais outro ano de estágio em empresas e que não tiveram acolhimento após a saída deste ministro. Os ministros seguintes, João de Deus Pinheiro e depois Roberto Carneiro, "enterraram" esta tentativa. E assim vamos.
ResponderEliminar:)
ResponderEliminar[Sem tempo, sem tempo]
Ora vá lá espreitar
ResponderEliminar:)))))
Caro Rogério,
ResponderEliminarInteressante, esta sua forma de colocar o problema que abordei no post que publiquei exactamente no mesmo dia e com o mesmo título no A Nossa Candeia.
Abraço.