04 novembro, 2012

Geração sentada, conversando na esplanada - 17 (utopias)

(Ler conversa anterior) 
"Acho que as eleições, neste momento, complicam tudo e podem não resolver nada." - Mário Soares, hoje, no DN 
"Se começássemos a dizer claramente que a democracia é uma piada, um engano, uma fachada, uma falácia e uma mentira, talvez pudéssemos nos entender melhor." - José Saramago, em 2004, na Veja

Eles se olhavam, como se questionassem o mundo...

Quando me viu chegar o velho engenheiro aproximou-se da mesa perto da minha e antes mesmo de se sentar já me diria palavras, ele que nunca o fizera antes.
- Estou a ler o que está a escrever... sobre Tamara e, ontem sobre Volos... 
- Ah! não sabia que me tinha descoberto...
- É mais fácil descobrir-se um inocente que um criminoso
- E que tal?, que pensa dessas utopias?
- Na verdade? sabe? Não tenho pensado. Tenho sonhado. Sonhar é um pouco menos que pensar. Mas também é menos doloroso. Entre um sonho e um pensamento vai a distância que separa a forma de desejar o mundo e aquilo que o mundo nos parece ser...
- Nunca tinha visto isso assim... mas faz sentido
Ficámos ambos por um momento calados e o rafeiro abanava a cauda esperando o reatar da conversa. Retomo-a o velho engenheiro:
- Não é verdade aquilo das gentes perto de Alvega viverem já na antecâmara da utopia. Não é verdade que haja esse sentimento comunitário e que cada um compense o seu vizinho das faltas que ele tem, nem que procure nele aquilo de que carece...
- Não, não é verdade!
- Mentiu, portanto!
- Não, foi apenas um engano, desfeito logo de seguida pelo meu genro...
- Acha que uma utopia pode nascer a partir de um engano desses?, quem ler irá apontá-lo a dedo. Chamar-lhe-ão manipulador, falsificador...
- E o senhor? 
- Bom eu acho que as utopias podem nascer de todas as maneiras... de actos voluntários...
- Como em Tamara?
- Sim, como em Tamara. Podem nascer também como forma de resistir a um sistema de perda de soberania e como resposta ao empobrecimento, à falta de recursos para o sustento...
- Como em Volos? Mas não acha que regressar a uma economia de troca não será uma regressão... civilizacional?
- A civilização nunca regredirá se voltar um pouco atrás à humanidade da partilha... Há que saber dar um passo atrás para depois avançar dois...
- Isso é uma tese de Lenine, uma estratégia...
- Uma estratégia de bom-senso,  para quem descobre que vive num logro e que seguir em frente é uma loucura... é um desastre... esse sim, civilizacional...
- Acha então que devíamos ter o bom-senso de dar um passo atrás?
- Ou dois... se nos enganámos num caminho é preciso regressar ao ponto do engano e atalhar pelo caminho certo...
- E saberemos fazer isso?
- A necessidade aguça o engenho, é o que diz quem acabará por o saber...
- O povo? Este?
- Não temos outro!...

8 comentários:

  1. O diálogo é muito bonito e o todo o texto nos revela a Alma de um homem bom e sonhador!
    Por muito que nos doa é preciso descer à terra e termos a certeza que nos próximos anos, seremos obrigados a viver com tão pouco que nada nos sobrará para trocar.
    Sobretudo, aqueles que vivem nas cidades.
    Claro que o sentimento de partilha e troca dos bens essenciais, fará sempre parte do instinto solidário e de sobrevivência da humanidade.
    Aqui, não há utopias!

    Beijinhos.

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  2. cansada de Mários Soares, cansada de toda esta gentinha que nos rouba tudo e descaradamente, cansada de que o povo português aguente tudo sem reagir!!

    Um abraço amigo

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  3. Meu amigo que não nos falte o engenho e arte, pois tudo o resto já falta.

    Tenha um excelente semana.

    beijinhos

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  4. Quem vive na aldeia e tenha as suas leiras para cultivar, esse pode trocar e pode resistir ao que aí vem.

    Para o que vive na cidade, só a fome e a criminalidade encontrará... para roer e/ou trocar.

    «... regressar ao ponto do engano...», pois. Mas em que tempo se situou ele?

    Beijo

    Laura

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  5. a água nunca passa duas vezes debaixo das pontes - passos atrás não fazem caminho...

    abraço

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  6. Nao temos outro povo, não temos outras gentes, não temos outros governantes.

    Também acho que eleições antecipadas agora não iriam resolver nada.

    Abraço

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  7. Nunca enjeito voltar aqui para resposta a perguntas directas

    A Laura deixa a pergunta: «... regressar ao ponto do engano...», pois. Mas em que tempo se situou ele?

    João Ferreira do Amaral, no video do post anterior fala disso em tom muito preciso... a partir do 10º minuto.

    O tempo de adesão ao euro foi o momento errado. Procure-se então outro caminho... vai ser duro? Vai!
    Mas sem recorrer a essa saída isto, estando já duro, vai endurecer mais ainda!

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  8. ola Rogério passe no meu blog pf. cordialmente

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